Imaginamo-los franzinos, de olhos indecisos entre os degraus de pedra altos e as histórias a azul e branco espalhadas pelas paredes da escadaria. Lanço após lanço, e são oito, os rapazinhos talvez parassem para engolir um pouco do ar que entrava pela janela de cada patamar mas saber-lhes-ia a pouco o descanso porque não havia maneira de os olhos fugirem das cenas bíblicas.
A ideia dos azulejos era servirem para os meninos órfãos que passavam os dias e as noites neste colégio irem estudando o Velho e o Novo Testamento sem darem por isso. Estávamos no século XVII e era bom que aprendessem depressa a colorir a palavra do Senhor porque quando os jesuítas os achassem capazes iriam integrar as missões religiosas em África e no Brasil. Lá longe, além de reproduzirem a Bíblia com mais ou menos sageza, tocariam um instrumento musical, talvez para convencer os nativos de que os anjos existiam mesmo.
Ficava bem aqui uma música celestial é o que pensamos ao subir ao último andar do Edifício Amparo, no nº 64 da Rua da Mouraria, atrás da Capela de Nossa Senhora da Saúde e do Centro Comercial da Mouraria. Fazemo-lo devagar para melhor ver os 41 painéis de azulejos e meter ar como faziam os meninos órfãos. Eles iriam adorar o campo de futsal que há perto do céu, e talvez rissem ao ouvir uma velhinha à beira de lhe dar o trangolamango explicar a ausência de uma amiga do centro de dia dizendo “Parece que está com uma acolite”.