Enquanto a melhor trufa branca é italiana, de preferência, da região do Piemonte, o ex-líbris da trufa preta vem da região francesa de Dordogne e Drôme, sempre de sudoeste e sudeste, pois a norte não existem trufas (Tuber Melanosporum). Foi precisamente de Dordogne, terra também de bons vinhos, azeitonas e foie gras, que veio o chefe Pascal Meynard, 50 anos, há oito anos a comandar a cozinha do Varanda, no Ritz Four Seasons Lisboa. Com preços menos exorbitantes do que a branca de Alba, a trufa preta anda entre os mil e 1200 euros por quilo. Para a temporada que já começou no Varanda, a decorrer até 15 de março, Meynard pensa gastar meio quilo por semana. São pequenos fungos, com cerca de 80 gramas cada, que o chefe conserva envoltos em papel vegetal junto de arroz ou perto de manteiga, transferindo-lhe o aroma.
Enquanto a branca tem um perfume mais enxofrado, a preta revela-se mais adocicada e suave. E se a branca é mais frágil, a preta tem uma textura mais robusta. E quanto mais marmoreada for melhor, sinal da sua qualidade. Outra diferença é poder ser cozinhada ao lume, incorporada em molhos, em camada entre a pele e a carne de frango, por exemplo, ou simplesmente com um ovo mexido. Mas há mais combinações perfeitas: crustáceos (lagostins e lavagantes) e queijo Brie. Algumas destas junções, provámos na degustação do menu Tuber Melanosporum, que inclui trufa desde a manteiga até à sobremesa. Qualquer um dos pratos pode ser pedido sozinho, tanto ao almoço como ao jantar.
Num tronco de madeira de oliveira, da zona de Lisboa, vem para a mesa o crocante de parmesão, alho francês, rabanete e trufa. Nas flûtes, feitas à mão na Marinha Grande, a nova escanção, Gabriela Marques, verte champanhe Perrier-Jouët Grand Brut, da região de Épernay, que também acompanha a primeira entrada: foie gras, noz pecan e crocante de batata. Em seguida, o cheiro a fumo que vem da pequena taça de vidro suscita a curiosidade. É um consommé reduzido em água de trufa preta e rabo de boi, com tupinambor, aipo e acompanha com tostas com cogumelos chanterelles e trufa (€39).
No copo, muda-se para o primeiro branco do almoço, um Lagoalva de Cima com Arinto fermentado em cuba de inox e Chardonay em barricas de carvalho francês, explica Gabriela Marques. Tem alguma frescura, mas também textura para combinar com a intensidade do ovo biológico que aí vem. É só gema, trufa preta, cogumelos “trompetas da morte”, crocante de cereais e óleo de noz (€36). Uma pequena delícia de cortar a respiração. Não há dúvida de que o ovo e a trufa nasceram um para o outro.
Produzido em altitude, entre as serras do Caramulo e da Estrela, o segundo branco da tarde é um Quinta das Marias, Encruzado, do Dão. A sua acidez serve para limpar a sensação de gordura deixada pelo ovo e a sua intensidade é mais apropriada para o sabor forte do lavagante que está a subir as escadas. Em simultâneo, destapam-se as campânulas metalizadas. De baixo, um prato de sopa com o crustáceo rosado, espargos, salsifis e condimento de trufa, emulsão de lima e pimenta d’Espelette (€49), ao qual é acrescentado um caldo de marisco. Para comer até à última colherada.
Tempo de tinto, sinónimo de prato de carne. O Casa Cadaval, 100% Pinot Noir, tem a presença discreta da cereja e da amora preta e o perfil elegante, como a faca Laguiole de cabo preto cobiçada desde o início da refeição. O bife é de novilho irlandês maturado, feito à la ficelle (técnica de cozer a carne a 28º graus) e molho de trufa (€49). E como é que a trufa entra na sobremesa? Fabian Nguyen, pasteleiro de origem francesa, vindo Vanuatu, preparou uma trufa glaceada, biscoito de cacau e alfarroba e creme d’Orelys (chocolate branco maturado Valhrona) (€18). Desta vez, é uma questão de forma.
Varanda > Ritz Four Seasons Hotel > R. Rodrigo da Fonseca, 88, Lisboa > T. 21 381 1400 > até 15 mar, seg-sex 12h30-15h, 19h30-22h30 > €110/pax sem bebidas