Seja porque se preocupam com os crescentes níveis de desigualdade, seja porque acham que será necessário reequilibrar as contas públicas no pós-pandemia, políticos e economistas estão a olhar com mais atenção para impostos sobre a riqueza. Alguns países já os estão a aplicar e o debate tem-se intensificado em muitos outros. No Reino Unido, três economistas criaram um projeto para estudar como é que essa mudança fiscal poderia ser desenhada. A EXAME entrevistou um deles, Arun Advani, professor na Universidade de Warwick e investigador na London School of Economics.
A conversa tem algumas semanas, mas o tema tornou-se ainda mais atual em Portugal nos últimos dias. O debate sobre como financiar a despesa do Estado ganhou um impulso extra quando, em entrevista ao i, a economista Susana Peralta sugeriu que deveria ser considerada a possibilidade de criar um imposto sobre a “burguesia do teletrabalho” para ajudar a financiar gastos públicos. A expressão deu alguma polémica, a professora da Nova SBE queria referir-se a pessoas que não viram os seus rendimentos afetados pela crise. Susana Peralta explicou melhor o que queria dizer neste artigo de opinião.
A ideia não é nova, até no contexto português e da crise que estamos a viver. Em setembro do ano passado, a presidente do Conselho das Finanças Públicas, mencionou ao Expresso a possibilidade de “criação de um tributo excecional de combate aos efeitos mais nefastos da pandemia sobre as contas públicas”. Nazaré da Costa Cabral referia, em específico, um imposto “sobre determinado tipo de ativos financeiros, de natureza temporária e excecional e direcionado aos contribuintes que pudessem ajudar nesse esforço de solidariedade nacional”. À EXAME, o CFP explica que a presidente se referia à possibilidade de uma iniciativa europeia e não a nível nacional, mas o ponto mantém-se: a busca de outras fontes de financiamento.
Nas primárias democratas nos Estados Unidos, dois dos principais candidatos – Elizabeth Warren e Bernie Sanders – tinham propostas de impostos sobre a riqueza nos seus programas. Como senadora, Warren acaba de recuperar há dias a ideia, propondo para 2023 um imposto sobre milionários com fortunas superiores a 50 milhões de dólares, com uma receita estimada de 3 biliões.
Já mais ligado à pandemia, um grupo de influentes economistas conotados com a esquerda propôs logo em abril a criação de um imposto sobre a riqueza para financiar a resposta europeia à crise, a aplicar sobre os 1% mais ricos (a receita anual estimada era 1% do PIB comunitário). A UE nunca avançou, mas a Argentina sim. Em dezembro, criou um imposto que será aplicado a quem tem uma riqueza superior a cerca de 1,9 milhões de euros e que deverá abranger 12 mil contribuintes (a taxa varia entre 3,5% e 5,25%). O Governo espera arrecadar o equivalente a 2,8 mil milhões de euros de receita.
O Deutsche Bank já fez uma proposta mais ligada ao teletrabalho, de 5% sobre cada dia em que uma pessoa trabalhe a partir de casa. Bom, na realidade, nesse mesmo relatório, o banco propõe uma série de novos impostos ou agravamento dos existentes. A intenção geral é redistribuir dos baby-boomers para os millennials e geração z.
O debate ganhou fôlego nos últimos anos, à medida que se tem tornado consensual que os sistemas fiscais atuais não acompanharam as transformações na economia, na estrutura de rendimentos e na desigualdade que ocorreram um pouco por todo o mundo desenvolvido. O alargamento do fosso entre ricos e pobres, as vantagens dos rendimentos de capital face aos rendimentos de trabalho – ainda mais quando os bancos centrais não param de injetar liquidez nos mercados – e uma série de outras pressões estruturais sobre as receitas fiscais (envelhecimento, digitalização da economia, informalização do mercado de trabalho) são um desafio para os governos, ainda mais num contexto de depressão económica profunda, em que os mais pobres têm sido muito mais penalizados. O problema está identificado há bastante tempo e a OCDE está a tentar encontrar uma solução agregadora para reformar o sistema fiscal. Não está a ser fácil.
Para já, a solução nos países mais ricos tem sido maior endividamento público e deixar engordar os défices. Não é uma má altura para isso, com juros em mínimos históricos. É também o recomendado por todas as instituições internacionais, incluindo a Comissão Europeia, que recentemente suspendeu as regras orçamentais por mais um ano. Por convicção ou medo de forças populistas, os governos podem acabar por decidir esperar que o crescimento económico vá aliviando a dívida pública. Mas é possível que alguns queiram ou precisem de arrecadar mais receita, seja pelos motivos de “justiça fiscal” atrás referidos, seja porque regressou uma preocupação com o equilíbrio das contas públicas.
Quem paga? E quanto?
Foi este ambiente que motivou três economistas britânicos a criar a Wealth Tax Commission. Se realmente houver necessidade de olhar para o sistema fiscal e considerar a criação de um novo imposto sobre a riqueza, como é que ele poderia ser desenhado para: arrecadar receita, redistribuir e afetar o mínimo possível a economia?
Os resultados do seu estudo foram apresentados em dezembro. O relatório é extenso e responde a bastantes dúvidas que se possam ter sobre uma medida deste género (eles criaram até uma FAQ). O imposto deveria ter cinco objetivos: deve arrecadar receita significativa, ser eficiente, justo, difícil de evitar e deve ser capaz de atingir estes objetivos melhor do que outras alternativas.
O objetivo dos autores não é dar um desenho final do imposto, mas sim criar um esquema que possa ser usado por responsáveis políticos para definirem como gostariam de o aplicar. Ainda assim, sugerem que faz mais sentido um imposto extraordinário, por comparação com um anual. Depois, depende de quanta receita se quer arrecadar e/ou quantas pessoas queremos abranger (foi também desenhado um simulador para cada um poder experimentar as suas soluções).
O imposto pode começar a ser aplicado a pessoas com uma fortuna superior a 250 mil libras (excluída de dívidas) ou apenas a partir de 10 milhões. Se ficarmos a meio caminho, colocando o limiar nas 500 mil libras de riqueza líquida, em que cada libra acima desse valor seria tributada a 1%, o imposto permitiria arrecadar 260 mil milhões de libras (300 mil milhões de euros, mais do que o PIB português). Um desenho alternativo – que daria mais ou menos a mesma receita – seria começar no milhão de libras com uma taxa de 4%, que aumentaria até aos 15% para fortunas superiores a 10 milhões. Mais simulações aqui.
Por comparação, para obtermos o mesmo nível de receita, seria necessário: subir o IVA britânico seis pontos percentuais (de 20% para 26%); aumentar o IRC cinco pontos e o IVA quatro pontos; ou agravar todas as taxas de IRS em mais de seis pontos.
Se o limiar for colocado nas 500 mil libras, 17% dos adultos britânicos pagariam parte deste imposto. Se for aplicado a partir de 1 milhão de libras, seriam apenas 6%.
Impostos são sempre impopulares, mesmo quando poucos os pagam (um bom exemplo é a tributação de heranças, frequentemente rejeitada pela maioria das pessoas). No caso do imposto sobre a riqueza, há algum apoio popular.
Uma sondagem de julho do ano passado mostrava que era a forma preferida pelos britânicos para arrecadar receita. Nos EUA, a ideia também é popular, mesmo entre republicanos. Parte deste sentimento justifica-se pela intensificação do debate em torno da desigualdade, com a estagnação de rendimento para grandes fatias da população dos países mais ricos do mundo, ao mesmo tempo que, no topo da pirâmide, a riqueza explode e o sistema fiscal torna-se cada vez menos progressivo em países como os EUA.
Para já, o governo britânico não parece muito recetivo à ideia de um imposto sobre a riqueza, preferindo aumentar o IRC sobre as maiores empresas do país para 25% em 2023. Nos EUA, Biden e Yellen também prometeram aumentar os impostos sobre as empresas, colocando-os no nível pré-Trump.
É justo referir que muitos dos impostos sobre a riqueza que existiam foram sendo abandonados, seja devido a elevados custos administrativos ou à facilidade de fuga ao fisco. A Wealth Tax Commission nota que todos eles eram impostos anuais e, por isso, mais desafiantes, e que três países da OCDE ainda os têm: Noruega, Espanha e Suíça, com o último a ser um exemplo especialmente bem-sucedido.
Além disso, importa sublinhar que estas ideias, contas e simulações não se podem transpor automaticamente para outras economias, como Portugal. Cada país tem o seu sistema fiscal e estrutura de rendimentos. Seria necessário um estudo aprofundado para perceber se faria sentido em Portugal e em que condições.
Mas o tema não vai desaparecer do debate e é possível que continuemos a ter novidades nos próximos meses. A EXAME quis ouvir um dos autores do relatório, Arun Advani, sobre as oportunidades, desafios e dúvidas sobre como funcionaria um imposto sobre a riqueza. Será que até a Rainha Isabel II teria de pagar?
“As pessoas começam a perceber que há argumentos para tributar riqueza. E os conservadores começam a perceber que, se não fizerem reformas sensatas, um governo mais à esquerda há-de fazer coisas mais radicais”
De onde veio a ideia de estudar um imposto sobre a riqueza?
Os três já tínhamos trabalhado juntos sobre tributação e, em específico, sobre tributação no topo da distribuição de riqueza. No início da crise, houve algumas colunas de opinião de jornalistas com algum nome a dizer que deveríamos considerar um imposto sobre a riqueza. O Andy [Summers, outro dos membros da Comissão] e eu falámos sobre isto e achámos que ambos trabalhávamos os temas da tributação e não fazíamos ideia de como um imposto sobre a riqueza poderia ser implementado. O grande desastre seria, daqui a seis meses ou um ano, a crise da Covid-19 ter terminado, mas estarmos perante uma crise económica, e o Governo olhar para esta ideia e achar imediatamente que é absolutamente terrível ou decidir avançar apesar de ser uma ideia terrível. Queríamos que houvesse um estudo para perceber se seria uma boa ideia e como o poderíamos fazer. O último trabalho sobre impostos sobre a riqueza no Reino Unido foi feito nos anos 70. Foi um grande trabalho, mas está desatualizado. A estrutura do sistema fiscal mudou muito, assim como o movimento das pessoas. Achámos que alguém tinha de o atualizar.
Porque é útil olhar para um imposto sobre a riqueza?
Há vários argumentos. É bom distinguir entre um imposto sobre a riqueza anual ou um imposto one-off [não recorrente].
Vocês parecem favorecer esse segundo modelo.
Sim, favorecemos. Quando refletimos sobre impostos, é importante pensar no contexto e na estrutura fiscal do país. É possível ter um imposto anual sobre a riqueza, mas não achamos que essa seja uma grande ideia no sistema fiscal britânico. Talvez noutros países faça mais sentido. Temos outras formas de tributação da riqueza: impostos sobre rendimentos de capital, dividendos, heranças. No nosso sistema, não me parece que seja sensato criar e gastar capital político com um novo imposto anual, quando se pode ajustar o que existe. Da esquerda à direita, há consenso sobre a existência de problemas na tributação de capital.
E que vantagens identificam na criação de um imposto sobre a riqueza? Há algum debate sobre as limitações dos sistemas fiscais atuais para abranger toda a riqueza criada, principalmente nesta era de quantitative easing dos bancos centrais.
Quem já tem riqueza, vê-a aumentar, devido a fatores como o QE [quantitative easing]. Grande parte dos países não está a fazer um bom trabalho com a tributação de capital. Um imposto sobre a riqueza seria uma opção. Se o objetivo for redistribuir, o imposto sobre a riqueza faz isso. Em muitos casos, poderíamos atingir os mesmos objetivos com um imposto sobre rendimentos de capital. Teria grande parte das vantagens. No entanto, no topo da distribuição, para os Elon Musks ou Jeff Bezos, a riqueza está a crescer muito rápido. O imposto sobre rendimentos de capital aplica-se apenas quando vende o ativo, não ajuda a encontrar receita agora. E não há razão para o Jeff Bezos se ver livre da Amazon. Vai ficar com ela a vida toda. Seja porque existem “buracos” na tributação ou porque queremos o dinheiro agora, é uma forma de os tributar pelo caminho. Todas as soluções que temos procurado para tributar o capital são muito complicadas e, no topo [da distribuição de rendimentos], aquelas pessoas podem fazer muitas coisas para pagarem menos. Não achamos que um imposto anual sobre a riqueza que comece nas 500 mil libras seja uma boa solução. Abrangeria 17% da população. Talvez faça sentido colocar o limiar num nível mais alto, a partir de alguns milhões de libras.
E se estivermos a falar de um imposto extraordinário, a aplicar apenas num ano?
Nesse caso, o custo administrativo é mais baixo. Portanto, podemos baixar o limiar. Também não tem os mesmos problemas de ineficiência que o anual tem. Estamos sempre a trocar eficiência por redistribuição, mas num imposto extraordinário nem sequer tem esse trade-off.
Embora o argumento moral não pareça ser central na vossa lógica, mencionam no relatório a questão da “justiça social”. Num debate sobre desigualdade, um imposto sobre a riqueza faz sentido?
Se se preocupa com desigualdade, um imposto sobre riqueza deve estar no centro do que defende. Se não se preocupa com desigualdade, um imposto sobre riqueza provavelmente continua a ser uma boa ideia. É uma boa ideia quer esteja na esquerda, quer esteja na direita e queira aumentar impostos de forma eficiente e seguindo o princípio de que quem tem ombros mais largos deve suportar mais peso. A maioria das pessoas no espectro político acha que faz sentido que o património de cada pessoa determine aquilo que tem de pagar de impostos. Se também acha isso, deve ser favorável a um imposto sobre riqueza. O Reino Unido está mais à direita do que muitos governos na Europa Ocidental, o nosso governo é conservador. Mas acho que há argumentos conservadores para o fazer [criar um imposto sobre a riqueza]. As heranças estão a tornar-se mais relevantes no Reino Unido para explicar o dinheiro que se tem. Se é conservador, deve preocupar-se com igualdade de oportunidades. Não existe muita igualdade de oportunidade, quando as heranças são tão relevantes.
A Covid-19 torna o imposto sobre a riqueza mais relevante? E isso deve-se apenas a podermos precisar de mais receita para o pós-crise?
Há três motivos. Sim, podemos precisar de receita para o pós-crise. Agora não estamos a pensar nisso, mas com dívida tão elevada e tantos planos [de despesa]… Se decidir aumentar impostos, é melhor fazê-lo com um imposto sobre a riqueza do que com as alternativas que existem. É mais justo (as pessoas têm mais capacidade para pagar) e é mais eficiente. Angariaria dinheiro e não criaria as distorções de um imposto sobre o rendimento.
E existe apoio popular para essa opção?
No Reino Unido, temos pessoas muito ricas, mas não tantas como nos EUA, onde elas são mais conhecidas e, por isso, acaba por haver muito mais sondagens. Aqui, temos sondagens para impostos mais abrangentes, que olham mais para o top 1% e não para o 0,01%. No vazio, metade das pessoas são favoráveis a um imposto sobre a riqueza e metade são contra. Num contexto em que lhes dizemos que os impostos terão de subir, 3/4 escolhem criar um imposto sobre a riqueza.
Pelas reações iniciais não parece haver muito entusiasmo entre os políticos conservadores.
Há argumentos de princípio, como saber se um imposto one-off seria mesmo one-off. Margaret Thatcher criou um imposto one-off sobre bancos nos anos 80 e isso não assustou todos os bancos. A Irlanda também criou um sobre as pensões. E depois há a questão política. O Partido Conservador não é o partido dos ricos, mas os mais ricos tendem a votar nos conservadores. Além disso, a nossa versão do imposto sobre a riqueza tributa casas. No Reino Unido, toda a gente aspira a comprar casa e costuma dizer-se que “o lar de um inglês é o seu castelo”.
Não seria possível ter exceções para a primeira casa?
Sim, pode. Mas não acho que faça sentido. Custaria muito dinheiro ter essa isenção e, se a intenção é ter menos pessoas a pagar o imposto, bastaria aumentar o limiar de aplicação. Não faz sentido dizer “eu tenho casa e fico isento, mas o meu irmão, que não quis comprar uma casa para investir no seu negócio, tem de pagar”. Começaria a questionar se não deveria ter comprado uma casa em vez de ter criado a empresa. Quando começamos a retirar coisas, criam-se essas desigualdades e mal-estar.
Quantas pessoas pagariam esse imposto, se ele começasse nos 2 milhões de libras?
1% da população.
Não parecem muito focados no número em específico.
Temos as nossas preferências. Poderíamos dizer que não faz sentido começar nas 100 mil libras. Mas quando começa em 500 mil e daí para a frente…
O Reino Unido já teve impostos semelhantes, aplicados num só ano?
Sim, tivemos dois one-offs. Um foi criado por Margaret Thatcher e aplicado sobre os bancos. Outro foi sobre empresas de serviços públicos que tinham sido privatizadas. O Partido Trabalhista achou que as privatizações foram mal feitas, portanto quando chegou ao poder, em 1997, uma das coisas que fez foi criar um one-off sobre essas empresas.
Somos hoje muito mais cautelosos em relação à política fiscal? E está isso a mudar?
Há uma frase famosa no Reino Unido, de um dos estrategas dos trabalhistas: “We are intensely relaxed about people getting filthy rich as long as they pay their taxes.” Era essa a atitude da esquerda britânica: não nos importamos que as pessoas enriqueçam, desde que paguem impostos. Era um momento mais otimista. Desde a crise financeira [de 2008], ficou claro que grande parte da população não viu o seu rendimento crescer e que perderam acesso a certas coisas. Na década passada, o governo conservador disse que toda a gente estava junta na mesma situação e que todos tinham sido igualmente atingidos. Mas as análises que entretanto foram feitas mostram que, quando juntamos os rendimentos de capital, a desigualdade tem aumentado bastante. Os ricos não deixaram de enriquecer, mas agora fazem-no de outra forma. Como é que devemos tributar isso? Não faz sentido que os ganhos de capital tenham uma tributação mais baixa do que os rendimentos do trabalho. São mais ricos e ainda têm taxas mais baixas.
No último livro do Gabriel Zucman, ele mostra que os 400 americanos mais ricos já pagaram uma taxa média de impostos mais baixa do que os 50% mais pobres.
No nosso relatório também fazemos esse exercício. Há gente com 10 milhões de libras de riqueza a pagar 10%. Se precisarmos de mais dinheiro, de onde virá? Se a resposta cair em cima da classe média, porque não conseguimos encontrar uma forma de tributar os mais ricos, isso não é satisfatório. As pessoas não ficam muito contentes, o que é compreensível.
Vamos agora às dificuldades e impactos negativos. As pessoas não seriam capazes de fugir deste imposto, por exemplo, ao colocar os seus ativos noutro país? Seria possível desenhar um imposto à prova de bala?
Para o one-off, sim, acho que é possível. O lado bom de um imposto extraordinário é que, a partir do momento em que ele é anunciado, diz-se que será baseado na riqueza que possui nessa manhã. Além disso, a transferência para outros países já não é tão fácil, há muita troca de informação entre Estados. Se estivermos a falar de um imposto anual, é mais problemático, não há soluções ideais. Se for aplicado num só ano, é mais difícil de fugir. Mesmo em relação à imigração, também é possível atuar. Os EUA, por exemplo, exigem que pague impostos a não ser que renuncie à cidadania. Outros países têm sistemas semelhantes.
Parte da minha riqueza pode ser um quadro, joias, um barco. Como é possível apurar esses bens?
Colocámos o limite nas 3 mil libras. Tudo o que estiver abaixo disso não interessa. As minhas estantes, aqui atrás, não contam. Mas se eu tiver um quadro valioso, isso já conta. Um carro, conta. Esses ativos seriam incluídos. Quer incluir esses itens, mas evitar o custo administrativo de contar todas as pequenas coisas. O limiar de aplicação não tem de ser nas três mil libras.
Embora assumam que este imposto seja menos prejudicial à economia do que outras opções, ele terá algum efeito negativo, ou não?
O Governo ou um macroeconomista definirão o dinheiro que precisamos de arrecadar. Depois, a questão é como o fazer. Precisa de X mil milhões de receita fiscal. Que solução prejudicaria menos a economia? Não é dinheiro grátis, terá impacto. Mas se quiser fazê-lo, o que estamos a dizer é que esta é uma das melhores formas.
Enquanto sociedade, faz sentido que existam multimilionários [billionaires]?
Os três comissários [que fizeram este relatório] têm backgrounds e visões políticas muito diferentes. A sociedade tem de chegar a essas conclusões. É para isso que serve a política. Nós queremos ajudar, tendo em conta essas preferências sociais, a desenhar os impostos.
A Rainha teria de pagar este imposto?
É uma questão interessante. O sistema fiscal para a família real é consentido. A rainha decide que impostos paga. O acordo é que a família real paga alguns impostos, tendo chegado a um acordo com o governo. O governo pode exigir o pagamento ou fazer um acordo sobre se paga e quanto paga.
Mas pode ser imposto?
Podemos sempre impor, mas ficaria muito surpreendido se o fizessem. O que existe hoje é um acordo. Eles pagam imposto sobre o rendimento, rendimentos de capital e imposto sobre a herança.
Teremos um imposto sobre a riqueza nos próximos anos?
Dependendo do dia, acho algo diferente. O que me deixa otimista é que estamos a ter conversas sérias sobre como tributar a riqueza em geral. As pessoas começam a perceber que há argumentos para tributar riqueza. E os conservadores começam a perceber que, se não fizerem reformas sensatas, um governo mais à esquerda há-de fazer coisas mais radicais. Acho que há argumentos mais fortes para a esquerda e para a direita e estou otimista de que haverá alguma reforma.