No próprio dia em que, com pompa e circunstância, Luís Montenegro se preparava para marcar a agenda política, apresentando o programa económico da AD, rebentava, na Madeira, mais um escândalo judicial, desta vez comprometendo o presidente do Governo Regional, conselheiro de Estado e membro do Conselho Nacional do PSD, Miguel Albuquerque, bem como aquele que é considerado o seu futuro sucessor político, Pedro Calado, presidente da Câmara do Funchal. No “arrastão” do Ministério Público e da Polícia Judiciaria, com mais de 100 buscas envolvendo 300 investigadores, na Madeira, nos Açores e no Continente, foram feitos vários detidos, entre políticos e empresários. Corrupção ativa e passiva, tráfico de influências, participação económica em negócio, abuso de poder e prevaricação são alguns dos crimes investigados.
Sara Belo Luís começa por dizer que “o caso é grave e é preciso investigar”. “Ainda sabemos muito pouco, convém esperar e transmitir alguma serenidade. Preocupa-me a forma como tudo isto foi feito: com aviões fretados à Força Aérea, televisões avisadas para estar na Madeira a tempo da fazerem a cobertura”, afirma ainda. E remata: “Começa a existir uma espetacularização da Justiça, no meu entender, preocupante.” O ambiente é tóxico e contribui, segundo a subdiretora da VISÃO, para “uma perceção de que existe uma corrupção generalizada em Portugal que não tem correspondência com a realidade nem está refletidas nos índices de corrupção”. O corolário mantém-se: “A quem é que isto beneficia? A quem incendeia tudo e todos. E nomeadamente ao Chega, que nem sequer precisa de apresentar propostas, basta-lhe repetir à exaustação que vai ‘limpar Portugal’.”
O jornalista Nuno Aguiar também sublinha a perigosa dimensão de “espetáculo” destes casos, mas alerta para a necessidade de coerência dos protagonistas políticos. “O PSD não pode ter um critério ético que só aplica aos outros”, afirma, referindo-se às declarações de Miguel Albuquerque que, em novembro, dizia que a demissão de António Costa era “inevitável”.
“Não é a primeira vez que Miguel Albuquerque se desdiz num curto espaço de tempo: primeiro, foi quando afirmou que não seria presidente do Governo Regional, se não obtivesse uma maioria absoluta. Na noite eleitoral, deu o dito por não dito e fez um acordo com o PAN. Agora, afirma que não se demite e que tem todas as condições para governar, depois de ter dito, há pouco mais de dois meses, que António Costa, por estar a ser investigado no âmbito da Operação Influencer, não tinha outra saída que não demitir-se. Ainda por cima, Montenegro diz que são casos muito diferentes… Pois são: António Costa nem sequer é, ainda arguido, coisa de que Albuquerque não pode gabar-se. Virou-se o feitiço cnra o feiticeiro?”, acrescenta Filipe Luís, subdiretor da VISÃO.
Este caso acabou por ofuscar aqueles que têm estado a ser dias de algum ímpeto para a Aliança Democrática (AD), tendo como último capítulo a apresentação de algumas das suas principais medidas económicas. “Está a ser feito um relançamento da AD após o desastre inicial. Primeiro com antigos líderes capazes de entusiasmar uma sala, numa segunda fase com a explicação de propostas. O mais importante é que a AD tem agora uma narrativa e uma visão para o País que contrasta com a de Pedro Nuno Santos. Uma com mais Estado e política industrial dirigida, a outra com menos Estado e menos impostos”, explica Nuno Aguiar. “O imposto negativo é uma boa ideia que o PS abandonou em 2015 na negociação com os parceiros à esquerda. É uma forma de aliviar a verdadeira classe média via IRS. Mas no cenário macro há também uns pozinhos mágicos de economista, achando que os cortes de impostos se pagam sozinhos e pretendendo sol na eira e chuva no nabal: descida de impostos e, ao mesmo tempo, mais despesa.”
Para Filipe Luís, “o facto de a AD sustentar as suas propostas económicas no aval de economistas reconhecidos procura credibilizar o programa económico”. “É um esforço honesto de um partido de Poder, que ambiciona governar, e que marca o contraste com a banha da cobra de outros, com menos responsabilidades, como é o caso do Chega.” Por outro lado, “os números ambiciosos – eu diria otimistas – avançados pelo PSD contrastam claramente com todas as previsões conhecidas e veiculadas por entidades independentes. Ainda nos lembramos das criticas do PSD a previsões do governo socialista, em exercícios orçamentais recentes, consideradas ‘irrealistas’… Serão estas mais realistas?”
Sara Belo Luís concorda que foram dias mais positivos para o PSD, mas cujos resultados tardam a aparecer nos estudos de opinião. “A Convenção foi um momento importante para a AD, tendo o PSD conseguido de facto apresentar algumas propostas.” No entanto, acrescentou, tendo em conta os resultados da sondagem divulgada esta semana, “a verdade é que o PSD não consegue descolar”. Fala-se na possibilidade de o Chega poder vir a ser o segundo partido mais votado. Pode acontecer? “É improvável, mas pode acontecer.”
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