A emigração de talento jovem qualificado português, especialmente da área tecnológica, é um fenómeno preocupante que se intensificou na última década. O inquérito da Associação Académica de Coimbra, dado a conhecer em março, revela que 40% dos estudantes inquiridos pretende emigrar nos próximos cinco anos, sendo este um reflexo claro de uma tendência que ameaça o futuro do país: a incapacidade de reter talento jovem, qualificado e inovador. Esta situação, à primeira vista, pode parecer paradoxal, se considerarmos que Portugal tem sido reconhecido internacionalmente como um hub tecnológico, com Lisboa a ser destacada como a Capital Europeia da Inovação em 2023. No entanto, o talento que contribui para esse reconhecimento está a deixar o país, criando um contraste preocupante entre a imagem do país e a realidade do seu mercado de trabalho.
O Observatório da Emigração estima que 30% dos jovens nascidos em Portugal vivem atualmente fora do país. Este dado, quando analisado em conjunto com a elevada taxa de emigração, coloca Portugal numa posição alarmante: é o país com a maior taxa de emigração da Europa e com uma das maiores do mundo, com 1,5 milhões de portugueses a emigrar nas últimas duas décadas. Adicionalmente, segundo a Pordata, somos o 4.º país mais envelhecido do mundo. Estes números devem-nos preocupar a todos e evidenciam que Portugal está a perder uma parte significativa do seu capital humano, particularmente aquele que tem as características e competências para impulsionar a economia e a inovação nacional.
Este fenómeno de emigração é transversal a diversos setores, mas o setor tecnológico é particularmente afetado. Apesar de ser um dos setores em crescimento e com maior potencial, é também um dos que mais sofre com a saída de talentos. A contradição é evidente: como pode Portugal aspirar a ser um centro de inovação tecnológica, se o seu principal recurso – o talento qualificado – está a emigrar? O problema reside no desajuste entre o potencial do país e as condições que proporciona aos jovens.
Portugal tem sido reconhecido como um destino atrativo para o investimento empresarial, não só devido à qualidade da sua educação e à formação de excelência dos seus profissionais, mas também pela qualidade de vida que o país oferece. No entanto, apesar destas vantagens, os jovens portugueses não veem o seu país como um destino de longo prazo para as suas carreiras, mas sim como uma ponte para outros mercados que oferecem melhores condições.
Este cenário exige uma mudança profunda no mercado laboral português. Para reter o talento jovem, é necessário criar um ambiente de trabalho que seja competitivo a nível global. Isso implica continuar a oferecer regimes de trabalho flexíveis que respondam às necessidades da nova geração, salários mais atrativos, e condições que permitam um equilíbrio saudável entre a vida profissional e pessoal. Além disso, é fundamental multiplicar os esforços investidos na criação de oportunidades claras de progressão na carreira e de formação contínua, garantindo que os jovens vejam em Portugal um lugar onde podem crescer e prosperar sem ter de abandonar o país.
É também necessário continuar a investir na proximidade entre a Academia e a Economia, criando iniciativas que fortaleçam a ligação das empresas às Instituições de Ensino. Investigação conjunta, programas de estágios, jobshadowing, conferências com antigos alunos, ou iniciativas de maior escala, como a do Recorde do Guinness da “Maior Aula de Programação do Mundo”, que decorrerá no Instituto Superior Técnico, em outubro, são exemplos concretos de como essa ligação pode continuar a ser promovida. Estas “pontes” são essenciais para preparar os jovens para os desafios do mercado de trabalho, aumentar a sua proximidade com o tecido empresarial e para reforçar o seu compromisso com o desenvolvimento do país.
Este é um momento crítico para o nosso país. É imperativo não pararmos de trabalhar para criar condições que, para além de nos permitirem desenvolver as pessoas que estão cá, consigam diminuir a quantidade de pessoas que acredita ter de ir embora. É necessário um compromisso sério por parte de uma alargada quantidade de stakeholders para modernizar o mercado de trabalho e torná-lo verdadeiramente atrativo para os jovens – o talento está cá, mas estão-nos a faltar as condições que ele merece. Precisamos de fazer mais, caso contrário, ficaremos com menos. Continuarão a ser outros países quem melhor capitaliza o que de melhor temos em Portugal – as nossas pessoas.