A economia global parece caminhar para uma mudança de ciclo. O período pós-pandemia foi marcado por uma recuperação da actividade, suportada por estímulos orçamentais, pelas poupanças acumuladas nos confinamentos e pelo aumento da despesa em serviços (incluindo turismo). A pressão da procura sobre a oferta, a escassez de mão de obra traduzida em aumentos salariais e o choque energético decorrente da guerra na Ucrânia contribuíram para um aumento da inflação, que forçou os bancos centrais nas economias desenvolvidas a subirem rapidamente os juros de referência. Agora, este quadro está a dar lugar a uma desaceleração da actividade económica e/ou a um crescimento abaixo da tendência, ao recuo da inflação e à descida dos juros.
As preocupações com o crescimento, ou a falta dele, parecem particularmente visíveis na Zona Euro. Esta economia deverá crescer, este ano, abaixo de 1% e, em 2025 pouco mais do que isso, reflectindo os efeitos desfasados de uma política monetária restritiva (forte subida dos juros entre meados de 2022 e 2023), os impactos da guerra na Ucrânia (aumento dos custos da energia) e a desaceleração da procura externa (em particular oriunda da China), factores que afectam, sobretudo, a Alemanha. Ao mesmo tempo, o outlook para a Zona Euro encontra-se condicionado pela incerteza política e orçamental em França. O défice público francês poderá superar 6% do PIB este ano e a dívida pública subiu já para 112% do PIB no 2º trimestre deste ano, numa altura em que o país se encontra sujeito a um Procedimento por Défice Excessivo por parte da CE. Este procedimento exige medidas de atenuação dos desequilíbrios das contas públicas, mas não é certo sequer que seja possível aprovar um Orçamento, dada a fragmentação do Parlamento saída das últimas eleições. O spread da dívida pública francesa face ao Bund alemão superou já os de Espanha e de Portugal. O contexto geral mais adverso para a Zona Euro levou o mercado a acentuar as expectativas de descida de juros de referência pelo BCE, estando já antecipados a 100% dois cortes de 25 bps até final do ano.
A China é outra região onde são muito visíveis as preocupações com o crescimento. Esta economia parece estar a viver a “ressaca” de um período de forte expansão, assente no endividamento e num excessivo investimento em imobiliário. Neste momento, os preços da habitação recuam mais de 5% em termos homólogos, mas o endividamento persiste. Este contexto deprime o investimento e o consumo, gerando pressões deflacionistas na economia, que apenas reforçam as dificuldades com o endividamento e dificultam a recuperação da procura interna. Há quem fale já na “japonificação” da economia da China. Para já, as autoridades responderam com descidas dos juros, injecções de liquidez e estímulos orçamentais. Last but not least, também a economia dos EUA parece revelar sinais de abrandamento e de desinflação. A persistência de preços em níveis mais elevados e de juros em níveis restritivos tem penalizado a confiança e a procura, mesmo se o consumo ainda mostre alguma resiliência. Não há ainda sinais de que as empresas estejam a despedir trabalhadores, mas os indicadores disponíveis sugerem que estarão a contratar menos, o que tem contribuído para uma subida da taxa de desemprego, dado o aumento da população activa. Este arrefecimento do mercado de trabalho, acompanhado por um alívio das pressões salariais e inflacionistas, levou o Fed a iniciar recentemente um novo ciclo de descida dos juros de referência e a acentuar as expectativas de futuros cortes. Em suma, tudo indica que, nas principais economias, estaremos a entrar num período marcado por uma desaceleração da actividade e/ou a um crescimento abaixo da tendência, um recuo da inflação e uma descida dos juros.