1. O Que Está Para Vir
Helena Vasconcelos

O subtítulo deste livro diz-nos mais sobre o que se segue: “Uma vida com Julião Sarmento.” E, em baixo, na capa: “Memórias”. E assim se percebe o belo paradoxo de chamar O Que Está Para Vir a um livro de memórias. Talvez porque os dias que a autora Helena Vasconcelos passou como companheira do artista plástico Julião Sarmento (entre 1974 e o fim da década de 80) estavam cheios de promessas de futuro(s). “Foi um criador incansável que nunca se intimidou perante o desconhecido”, lê-se. A autora, mais conhecida como crítica literária, leva-nos, com a ajuda dos diários que escrevia, numa viagem ao Portugal do pós-25 de Abril e aos anos 80, com a vantagem de nos fazer sentir próximos, quase amigos, da dupla Julião e Helena nesses tempos. P.D.A. Quetzal, 240 págs., €17,70
2. Saber Perder
Margarida Ferra

Nestas páginas, a autora parece guiar-se por uma frase de Marguerite Duras: “Escrever é tentar saber o que escreveríamos se escrevêssemos − só o sabemos depois − antes.” Chegando ao fim deste texto fragmentado, bem entretecido, com pontas que por vezes parecem soltas, mas encontram sempre o seu lugar (como no tricot ou no crochet, várias vezes mencionados pela autora), conseguiremos dizer: este livro é sobre memória e escrita. De algum modo, este livro é sobre ele próprio. Margarida Ferra (que já tinha publicado poesia e aqui, no sexto volume da coleção de não ficção literária da Companhia das Letras, se estreia em prosa) questiona o seu próprio gesto de escrita, a disponibilidade (ou falta dela), enquanto transforma em literatura pedaços do seu quotidiano, objetos, reflexões e, sobretudo, memórias (familiares ou, por exemplo, dos inauditos dias da pandemia). É um livro delicado e singular. “Escrever sobre a minha vida para ter algum controlo sobre ela”, lê-se. Pedro Dias de Almeida Companhia das Letras, 128 págs., €14,95
3. As Crianças Adormecidas
Anthony Passeron

De um lado, a corrida para a identificação do vírus da sida nos anos 80, quando esta doença era desconhecida. Do outro, a tragédia que se abateu sobre uma família. Com a força da autoficção, o francês Anthony Passeron (n. 1980) recupera, neste seu primeiro livro, os tempos sombrios em que a Ciência e o mundo avançavam às cegas no meio de uma pandemia. Mas este não é um relato distante e factual, é a história da família deste professor de Literatura e História, nomeadamente do seu tio que, viciado em heroína, foi traído por seringas usadas. Um livro intenso, sem floreados, sobre um calvário físico e emocional capaz de destruir qualquer família. L.R.D. Livros do Brasil, 192 págs., €17,75
4. Como o Ar
Ada D’Adamo

A meio de um longo e rico percurso nas artes performativas, Ada D’Adamo descobriu que um cancro já começara a fazer o caminho letal no seu corpo. Com pouco tempo de vida, sentiu que tinha muito para contar, sobretudo à filha, que nasceu com uma doença neurológica grave. Como o Ar é o resultado dessa urgência, escrito em forma de carta, na qual se desenterram memórias, segredos e sentimentos. É também o relato de muitas lutas diárias que só o amor de mãe foi capaz de superar e renovar a cada momento. Inspirado na autoficção de Annie Ernaux, Como o Ar é um livro avassalador e comovente, que o Prémio Strega, o mais importante de Itália, consagrou já depois da morte da sua autora. L.R.D. Porto Editora, 192 págs., €17,75