1. Passa-Montanhas
Linda Martini

A sua história vem dos primeiros anos deste século. De algum modo, os Linda Martini são já resistentes, diríamos “clássicos”, se essa palavra não parecesse tão inapropriada perante este rock ainda jovial, torrencial, enérgico. Continuam a jogar com as regras que criaram para si próprios numa espécie de “amor combate” que se vai construindo álbum a álbum, à antiga. Talvez por isso, falam assim do novo trabalho: “Há uma ideia persistente ao longo das novas canções: conversar melhor. Talvez seja essa a procura quando quatro pessoas se fecham voluntariamente numa sala e esperam sair de lá com qualquer coisa que não existia antes de entrarem.” Este Passa-Montanhas, com dez novas canções, é o primeiro registo em estúdio com o guitarrista Rui Carvalho (aka Filho da Mãe) que, em 2022, substituiu Pedro Geraldes.
2. Viva la Muerte
Mão Morta

Não é de ânimo leve que se escolhe para título de um disco o sinistro slogan dos falangistas na Guerra Civil Espanhola, “viva la muerte”. Mas nada aqui é de “ânimo leve”; estamos a milhas do hedonismo rock de Budapeste, talvez a canção mais célebre dos Mão Morta nos 40 anos de carreira que agora se assinalam. Adolfo Luxúria Canibal e o resto da banda bracarense fazem questão de que a mensagem que querem passar seja bem clara, sem ambiguidades, naquele que é o seu disco mais assumidamente político de sempre (e já havia Há Já Muito Tempo que Nesta Latrina o Arse Tornou Irrespirável, de 1998, de inspiração situacionista, e Pelo Meu Relógio São Horas de Matar, de 2014). Num álbum que é também espetáculo, a apresentar ao longo deste ano, complementado com conferências (Do Fascismo à Extrema-Direita e Vice-Versa), nada ficar por dizer, emulando um fascismo e um autoritarismo que ameaçam os nossos dias. Rock de combate.
3. Cidade de Cinema
Mazgani

Não muda tudo, mas muda muito. Acompanhamos Mazgani desde 2007 (ano de Songs of the New Heart) em canções em inglês, que remetem para uma melancolia e uma energia a fazerem pensar em Cohen, Cash ou Tom Waits. Desta vez, todo o novo disco é em português. Primeiro estranha-se…, depois convence, em canções delicadas e inspiradas (a melancolia mantém-se). Agora, o iraniano radicado desde muito jovem em Portugal parece criar uma ponte, como nunca antes, com a música popular portuguesa de autor – deste século e até de outros tempos. Em A Bondade, um dos dez novos temas, é fácil ouvir ecos de Variações no refrão: “Eu não quero a verdade/ dá-me antes a bondade…” Úria, Jorge Cruz, e até Salvador Sobral, também nos ocorrem, mas Mazgani já conseguiu encontrar o seu espaço há muito.
4. Circus Mundi Decadens
Kubik

Algo se mantém da estreia do projeto Kubik (aka Victor Afonso) em disco, em 2001, com Oblique Music: a dificuldade em colocá-lo, bem-arrumado, na gaveta de um género musical (neste caso, uma gaveta virtual, já que o disco ainda não teve edição física). Kubik é sempre um caleidoscópio musical, um carrossel louco, uma viagem que nos surpreende a cada guinada, de faixa para faixa e dentro de cada um dos temas, com títulos em latim (reminiscência da banda rock que o músico fundou nos anos 80, Nihil Aut Mors, que cantava, sobretudo, em latim?). O “circo decadente do mundo” do título anuncia-se logo, entre o naïf e o sinistro, nos primeiros segundos. Estilhaços de rock, folk e instrumentos de várias geografias, eletrónica de dança ou experimental esperam-nos logo a seguir, numa experiência viciante e alucinatória.