São bem conhecidos os efeitos positivos da realização regular de exercício físico, com cada vez mais estudos a reafirmarem estes benefícios, que vão muito além da parte estética. Contudo, seja qual for o seu objetivo e o tipo de treino que fizer, é essencial realizar treinos com boa técnica para não arriscar lesões.
Especialistas em desporto e fitness revelaram ao jornal norte-americano New York Times alguns mitos relacionados com o exercício físico, tendo em conta a sua experiência e aquilo que ouvem, demasiadas vezes, dos seus clientes.
Um deles tem a ver com a ideia de que se deve alongar antes de treinar. De acordo com Josh Goldman, diretor do Centro de Medicina Desportiva da UCLA Health, da Universidade da Califórnia, Los Angeles, EUA, alongar antes de treinar vai enfraquecer “temporariamente todos os grupos musculares que se estão a tentar treinar”.
Por isso, para quem gosta da sensação de alongar antes do exerício, o especialista aconselha a não se realizarem alongamentos longos: estudos recentes descobriram que o alongamento antes do exercício físico é ineficaz na prevenção de lesões e pode até funcionar contra nós e isto acontece porque alongar um músculo durante mais de 90 segundos diminui temporariamente a força desse músculo, refere o especialista.
Goldman explica ainda que, antes da realização do treino propriamente dito, é mais aconselhado o aquecimento, ao realizar “uma série de exercícios ativos que fazem o sangue fluir e provocam uma tensão suave nos músculos”. O alongamento deve ser feito num outro momento, diz ainda Goldman.
Uma outra ideia muito comum no que diz respeito ao treino físico é a de que é necessário levantar grandes pesos para construir músculo.
Um investigação de 2022, publicada no European Journal of Applied Physiology, e que incluiu investigadores das universidades japonesas de Niigata e Nishi Kyushu e da brasileira Londrina, dividiu os participantes do estudo em três grupos, com a tarefa de fazerem “curl de bíceps” duas vezes por semana. A somar a estes três, um quarto, o grupo de controlo, não fazia qualquer exercício. A experiência permitiu perceber que quem baixava pesos obteve o mesmo resultado do que quem os levantava, mas com metade do número de repetições.
Goldman diz ainda que vários outros estudos mostram que levantar pesos relativamente leves, realizando 30 repetições, por exemplo, é tão eficaz na construção muscular e de força como levantar pesos mais pesados entre cinco e 12 repetições.
No mesmo sentido, Jacob Sellon, médico de medicina desportiva da Clínica Mayo, em Rochester, Minnesota, EUA, diz que não se deve evitar utilizar pesos mais pesados com medo de se ganhar muito volume, já que “isto não acontece apenas com um treino típico de força”.
Um outro mito mencionado no jornal norte-americano é a ideia de que correr faz mal aos joelhos. Numa entrevista à VISÃO, em 2019, Nuno Filipe Pinho, Coordenador Pedagógico da Exercise School, referiu que “este movimento envolve stress mecânico nas articulações e, por isso, é relevante perceber se o desportista está apto para tolerar esse stress, assim como qual é a “dose” de corrida necessária para conseguir atingir os seus objetivos definidos”.
“É injusto atribuir à corrida uma conotação negativa, sendo mais imperativo definir se a pessoa está preparada para correr e desenvolver um processo progressivo de prática que permita uma adaptação mecânica e de habilidade”, referiu ainda Nuno Pinho.
Jordan Metzl, médico de medicina desportiva no Hospital for Special Surgery de Nova Iorque, explica que correr pode causar dores ou lesões nos joelhos se o treino for muito “agressivo”, ou seja, rápido demais, por exemplo. Já Goldmand afirma que “o nosso corpo é dinâmico” e que “as nossas articulações podem regenerar, especialmente quando somos regularmente ativos”.
Caminhar faz muito bem à saúde, disso não há dúvidas. Porém, os especialistas não defendem que caminhar por si só seja suficiente para manter a forma à medida que envelhecemos, já que a partir dos 30 anos a massa muscular diminui progressivamente e, por isso, é importante realizar treinos de força. Anne Brady, professora de exercise science na Universidade da Carolina do Norte-Greensboro, aconselha a complementar as caminhadas com treinos de força de 20 minutos algumas vezes por semana.
E fazer alterações no tipo de treino, muitas vezes dando alguns passos atrás, não significa que estamos a retroceder de alguma forma, mas sim a proteger o nosso corpo, avisam os especialistas, já que ele exige coisas diferentes, dependendo dos dias.
Também existe o mito de que os corredores e ciclistas não precisam de fazer treinos de força nos membros inferiores. Na verdade, este tipo de exercício “fortalece a parte inferior do corpo, mas não o suficiente para estimular um crescimento muscular significativo”, refere a treinadora de Nova Iorque Amanda Katz.
Por isso mesmo, a especialista aconselha a realização de treinos de força que incluem “agachamentos, lunges, pontes de glúteos e pointers pode melhorar a densidade óssea e diminuir o risco de lesões , além de torná-lo um corredor ou ciclista mais forte.
A ideia de que precisamos de dar pelo menos 8 mil passos por dia para nos mantermos saudáveis também tem sido desconstruída pela ciência: por exemplo, um estudo publicado em agosto de 2023 por investigadores da Universidade Johns Hopkins, EUA, juntamente com várias instituições europeias, permitiu perceber que andar, pelo menos, cerca de 4 mil passos por dia reduz o risco de morte por qualquer causa, enquanto andar cerca de 2.300 passos por dia reduz o risco de morte devido a uma doença cardiovascular.
Isto não significa que andar mais do que o recomendado não faz diferença, pelo contrário, quanto mais movimento melhor. Adicionar 500 a 1000 passos diários pode ter um efeito significativo, refere o mesmo estudo: andar mais 500 passos por dia é associado uma redução de 7% nas mortes por causas cardiovasculares e andar 1000 passos extra pode reduzir 15% a probabilidade de morte de qualquer doença.
Entre dados analisados estavam os de pessoas que chegavam a ultrapassar os 20 mil passos e nem assim os investigadores conseguiram detetar um limite máximo acima do qual já não haja benefícios para a saúde.
Tomar um banho gelado após exercitar (e não só) é visto por muitos como uma maneira de nos mantermos mais saudáveis, ajudando na recuperação, por exemplo, por proteger contra lesões, ao auxiliar na redução da inflamação. Goldman alerta, contudo, para o facto de que “nem toda a inflamação é uma má inflamação” e que se tomarmos um banho gelado sempre que treinarmos, podemos estar a interromper o processo de recuperação.
Isto acontece porque, quando treinamos, criamos uma “inflamação útil ao stressar estrategicamente os músculos e, à medida que o corpo cura, ganha força”. Por isso mesmo, devemos ter atenção à toma de antiinflamatórios, por exemplo, já que só devem ser tomados após os treinos se se estiver a tratar uma lesão. “Caso contrário, corre o risco de contrariar o seu treino”, afirma o profissional, referindo que a sauna é uma melhor opção quando se pretende recuperar de um treino (fale com um profissional da sua confiança para saber tudo o que pode ou não fazer).