A defesa de José Sócrates voltou, nos últimos dias, a insistir que o juiz competente para reavaliar o processo da Operação Marquês – após o Tribunal da Relação de Lisboa ter anulado a decisão que arquivou os crimes de corrupção e apenas enviou para julgamento crimes de falsificação de documentos e branqueamento de capitais – é Ivo Rosa. Além desta posição, o advogado Pedro Delile, num requerimento entregue em tribunal, garantiu que o magistrado, após uma longa baixa médica, já se encontra ao serviço. Porém, o Tribunal da Relação de Lisboa não tem conhecimento dessa situação, como a presidente deste órgão informou a VISÃO.
Num recente despacho, a juíza Sofia Pires – depois de ter declarado que a competência para reavaliar o caso era do juiz Ivo Rosa, atualmente juiz desembargador na Relação de Lisboa – voltou atrás e decidiu assumir as rédeas do processo, considerando “os prazos prescricionais em curso, bem como os princípios da celeridade e da confiança dos cidadãos no funcionamento do sistema e da realização da justiça”. Por isso, fez saber que iria agendar a realização de um novo debate instrutório (alegações finais) e proferir uma nova decisão instrutória.
A decisão da juíza baseou-se também, à data, numa informação remetida pela presidente do TRL, Maria Guilhermina Freitas, dando conta de que Ivo Rosa se encontrava de baixa médica desde 4 de janeiro, estando prevista a realização de uma junta médica para 26 de junho.
Nos últimos dias, segundo informações recolhidas pela VISÃO, a defesa de José Sócrates apresentou um requerimento no processo, dando por garantido que Ivo Rosa já se encontra a trabalhar na Relação de Lisboa, não estando, por isso, impedido de voltar a apreciar o processo da Operação Marquês. Mais: o advogado Pedro Delille adiantou que a junta médica tinha dado alta a Ivo Rosa.
Questionado, através do Conselho Superior da Magistratura, se a defesa de José Sócrates tinha pedido informações sobre o regresso ao trabalho de Ivo Rosa, a presidente do Tribunal da Relação de Lisboa afirmou não ter conhecimento de que Ivo Rosa já se tinha apresentado ao serviço.
Ou seja, como é que a defesa de José Sócrates soube que Ivo Rosa teve alta numa junta médica e está já a trabalhar? “Disseram-me”, respondeu à VISÃO o advogado Pedro Delille, insistindo que aquele magistrado é o juiz natural. “Há um despacho anterior da atual juíza a declarar-se incompetente para o debate instrutório, que já transitou em julgado”, acrescentou.
A defesa do antigo primeiro-ministro recordou que, a 14 de maio, a juíza Sofia Pires foi taxativa ao afirmar que competia a Ivo Rosa, apesar de já não estar no Tribunal Central de Instrução Criminal, refazer a decisão instrutória, “sob pena de desrespeito da decisão do tribunal superior”, considerando que aquele magistrado era o “juiz natural” para apreciar o caso.
A decisão de anular a pronúncia (ida a julgamento) de José Sócrates e do empresário Carlos Santos Silva por crimes de falsificação de documentos e branqueamento de capitais foi tomada em março pelo Tribunal da Relação de Lisboa. O acórdão determinou a remessa dos “autos ao tribunal de primeira instância a fim de ser proferida nova decisão instrutória”. Segundo as juízas desembargadoras Maria José Cortes, relatora, e Maria do Rosário Martins, juíza adjunta, “a nulidade em causa afeta e invalida a decisão instrutória de pronúncia em causa”.
José Sócrates foi acusado em 2017 pelo MP no processo Operação Marquês de 31 crimes, designadamente corrupção passiva, branqueamento de capitais, falsificação de documentos e fraude fiscal, mas na decisão instrutória, em 9 de abril de 2021, o juiz Ivo Rosa decidiu ilibar o antigo governante de 25 dos 31 crimes, pronunciando-o para julgamento apenas por três crimes de branqueamento de capitais e três de falsificação de documentos, juntamente com Carlos Santos Silva.