No fim de semana deu uma longa entrevista à TSF mas, no dia seguinte, parecia que o tema de conversa tinha sido apenas um: a legalização da venda de drogas leves. O primeiro-ministro apressou-se a esclarecer que o assunto não constava do programa de Governo e que a ministra teria falado “a título pessoal”.
Estava à espera de tantas críticas, na sequência das suas declarações?
Em primeiro lugar gostaria de esclarecer que, enquanto ministra da Justiça, estou vinculada ao Programa do Governo. Porém, tal não me impede de ter liberdade de expressão sobre um conjunto de outras matérias. Sou uma pessoa livre e tenciono continuar a sê-lo. O direito à liberdade de expressão é-me muito caro e não só não aceito a diminuição da minha liberdade, como não pactuo com a hipocrisia. Que tal sabermos a opinião de quem se limita a criticar a forma e evita falar da questão em si mesma? O que pensam?
O que está na base da sua convicção nesta matéria? Falou do combate ao crime organizado mas existem também outros argumentos?
A minha convicção pessoal sobre esta matéria resulta das múltiplas leituras, conhecimento e experiências no terreno, ao longo dos anos, e no que para mim é uma evidência: combate ao crime, por exemplo tráfico, branqueamento de capitais, criminalidade organizada, para além dos múltiplos dramas familiares e do uso terapêutico. Acresce que a venda ilegal destas substâncias, muitas vezes adulteradas com outros produtos, provoca problemas ainda mais graves de saúde. Mas, claro, estou a falar da venda regulada.
Quando refere a possibilidade de venda nas farmácias, defende que a comercialização deveria ser possível apenas para fins medicinais ou também recreativos?
Não estou a falar propriamente da venda para fins recreativos mas sobretudo da prevenção e combate a comportamentos aditivos.
No Colorado, onde a legalização da venda entrou em vigor há um ano, a criminalidade diminuiu, o desemprego baixou e o governo recebeu 40 milhões de dólares de impostos. Defende uma legislação deste género (entregando o comércio a privados) ou mais próxima da do Uruguai, onde há um controlo maior do Estado sobre a produção e comércio?
Eu diria que os resultados do Colorado são muito impressivos, sem esquecer um controlo eficaz, não a pensar na receita de impostos para o Estado, mas, acima de tudo, na saúde e bem-estar dos cidadãos.
A avançar como uma legislação deste género, entende que deveria ser concertada a nível Europeu, evitando o estigma de Portugal ser uma “a nova Amesterdão da Europa” ou esses receios não se colocam e o País poderia até ser um exemplo, como sucedeu no caso da despenalização dos consumos?
Não está em cima da mesa qualquer proposta de legislação, nem consta do Programa do Governo, a esse propósito. Todavia, creio que justamente e após um amplo debate que está por fazer, como de facto sucedeu com a despenalização de consumos em 2000/2001, Portugal poderia ser um exemplo nesta matéria. A melhor forma de combater um problema não é fingir que ele não existe. É encará-lo frontalmente, em todas as suas dimensões, e encontrar soluções para o resolver.