É perante um PS “viciado em remendos”, que “varre as queixas para debaixo do tapete e empurra para depois a mudança necessária”, que Mariana Mortágua se assume como alguém que apresenta soluções. “Perguntem-nos como se faz e nós dizemos”, afirmou, perante uma plateia cheia, no comício do Bloco de Esquerda em Braga, nesta quarta à noite. “O risco [do PS] é confundir soluções com política de faz de conta. Faz de conta que resolve, faz de conta que se pode puxar a manta para cima sem destapar os pés, ou para baixo sem destapar a cabeça. A política que corre atrás do prejuízo vive da resposta de emergência e perde-se atrás da próxima resposta de emergência”, continuou a coordenadora do Bloco. Um risco, afinal, “para democracia”, pelo “cansaço e desespero de quem está farto de esperar e fica sempre de fora da manta”.
Uma “política do remendo” protagonizada pela maioria absoluta do PS, que a coordenadora do BE concretizou em medidas que o governo de António Costa tomou na habitação, na educação e, sobretudo, na saúde. “O nosso SNS não fecha as portas a ninguém”, reforçou. Assim fez a ponte com o discurso do cabeça de lista do Bloco por Braga, Bruno Maia, médico neurologista e intensivista, dirigente sindical, que em 2022 foi candidato a Bastonário da Ordem dos Médicos. “O Bloco é a força que vai impedir o assalto da direita ao SNS”, garantiu Maia.
Antes, tinha sido Francisco Louça, no seu primeiro discurso num comício para estas legislativas, a apontar para os “fantasmas a sair dos armários”, a falar de temas como a imigração e o aborto. “Coitado do Chega, bem esbraceja a pedir que lhe paguem direitos de autor”, ironizou. Mas há uma mulher que lhes faz frente, acrescentou, “mais atacada pela direita”, pelo que disse acerca “dos donos de Portugal, obrigando-os a responder pelos seus malabarismos”. Louçã acredita na “força dos eleitores que recusam repetir o pesadelo da maioria absoluta” – e apela à sua responsabilidade –, e no voto que “quer vida boa para toda a gente”. Em Braga, onde o BE perdeu o deputado que teve nas legislativas de 2015, os votos no partido “vão decidir para onde vai pender esta balança”. “É aqui que a decência vai vencer.”
Como é habitual, o comício em Braga começou com intervenções artísticas, a leitura de textos de Audre Lorde e de poemas de Ana Luísa Amaral, por Lila Tiago (do projeto Fado Bicha), e a música de Rui David. Porque, como explicou Mariana Mortágua, “o nosso compromisso é com a arte, e isso é política; o nosso compromisso é com a política, e isso é arte”.
Arruada pela maioria de Esquerda
De tarde, na arruada em Santa Catarina, no Porto, o BE já tinha contado com uma frente de relevo, formada por Francisco Louçã, Marisa Matias, Catarina Martins, Pedro Filipe Soares, os deputados eleitos pelo círculo eleitoral do Porto (José Soeiro e Isabel Pires), e algumas figuras da cultura portuense, como os atores António Capelo e Mário Moutinho. Quando Mariana Mortágua foi ao encontro da comitiva, na Capela das Almas, cumprimentou sem pressas quem a esperava, trocou umas palavras e posou para as selfies. De seguida, seriam cerca de uma centena de apoiantes e curiosos a percorrer a maior artéria comercial da cidade, com gaita de foles e bombos a animar as hostes. “Deixa passar, eu sou do Bloco e o mundo eu vou mudar”, entoavam. Até um artista de rua se juntou à festa, com um “Viva a Liberdade!”, gritado ao microfone.
Maria Mortágua mostrou-se confiante. “Senti que esta campanha cresce, a cada dia que passa. Há tanta gente que se entusiasma, tantos homens e mulheres que se juntam, porque acreditam que é possível mudar o País e ter um projeto de esperança. Isso enche-me de alegria”, confessou.
Na campanha para as legislativas de 2022, a antiga coordenadora do BE, Catarina Martins, reconheceu ter tido um trabalho mais difícil, tendo o partido ficado reduzido a cinco deputados no Parlamento. “Julgo que as pessoas não compreenderam muitas coisas, hoje sabem que o PS quis um rumo de destruição do SNS, uma inação sobre a habitação, sobre a escola… depois de uma maioria absoluta, tudo isso ficou mais claro”, apontou, em declarações aos jornalistas. Sabem ainda, acrescentou, que “o BE esteve sempre ao lado delas, e reconhecem a extraordinária dedicação, preparação e competência da Mariana.”
No dia 10 de março, a atual líder do BE acredita que “o País não quer olhar para trás, nem para os tempos do governo da direita, nem da maioria absoluta, quer sonhar com uma possibilidade diferente, com a esperança num projeto diferente”. Mortágua tem a certeza de que se abrirá “um novo episódio da vida portuguesa: uma maioria com a esquerda, que faça a diferença e encontre soluções onde a maioria absoluta deixou de agradar ao País – na saúde, na habitação, na educação. Quero assumir esse compromisso com todas as pessoas que estão indecisas”. Obreira, está visto, de uma nova geringonça.