À medida que se aproxima o início do Mundial de Futebol, no próximo domingo, 20, mais e novos factos vão sendo revelados sobre a preparação desta competição, a maior e mais importante a nível futebolístico. Com as equipas de jornalistas de todo a mundo já no terreno, mais notícias serão publicadas sobre os direitos humanos e dos trabalhadores da construção dos estádios de futebol desrespeitados pelas autoridades daquele país do Médio Oriente.
Estes números, que ficarão na História do desporto, não abonam em nada a favor da competição. E, por mais que Gianni Infantino, presidente da FIFA, peça para que o foco seja apenas o futebol, é impossível.
0
Número de cláusulas ou condições de direitos humanos referentes à proteção dos trabalhadores solicitadas pela FIFA às autoridades do Qatar, ao conceder os direitos de ser o país anfitrião da prova mundial.
200 mil milhões de dólares
Quantia gasta pelo Qatar na preparação do Mundial de Futebol, mais 189 mil milhões de dólares do que os 11 mil milhões gastos pela Rússia em 2018.
3
Número oficial de mortes de trabalhadores durante os preparativos para o Mundial2022, segundo os responsáveis do Qatar e Gianni Infantino. Nicholas McGeehan, da organização de direitos humanos Fair Square, apelida esse número de “tentativa deliberada de enganar”, pois concentra-se em projetos que representam apenas 1% da construção no Qatar. O Comité Supremo diz que outros 36 trabalhadores dos canteiros de estádios também morreram, mas por motivos “não laborais” – ou seja, morreram após um dia de trabalho de “causas naturais”.
Número indefinido
É desconhecido o número certo de trabalhadores migrantes que morreram por negligência em projetos ligados ao Mundial, que na verdade nunca será conhecido.
Segundo a Organização Não Governamental Human Rights Watch (HRW), “as autoridades do Qatar falharam na investigação das causas das mortes de milhares de trabalhadores migrantes, muitas das quais são atribuídas a ‘causas naturais’”. A HRW também descobriu que, nesses casos, as famílias raramente recebem indemnização por morte porque, de acordo com a lei do trabalho daquele país, as mortes não são consideradas relacionadas com a profissão, ficando sem direito a indemnização.
6 500
Trabalhadores migrantes da Índia, Paquistão, Nepal, Bangladesh e Sri Lanka que morreram no Qatar desde que, há dez anos, ganhou o direito de ser o país anfitrião do Mundial de futebol. Uma média de 12 trabalhadores migrantes morreram a cada semana.
Dados desses cinco países revelaram que houve 5 927 mortes de trabalhadores migrantes no período 2011-2020. Em separado, informações da embaixada do Paquistão no Qatar relataram mais 824 mortes de trabalhadores paquistaneses, entre 2010 e 2020.
200
Mortes de trabalhadores nepaleses devido ao calor no Qatar, de acordo com um estudo feito em 2019 e publicado na revista Cardiology. Foi encontrada uma correlação, concluindo que “até 200 das 571 mortes cardiovasculares [de trabalhadores nepaleses] durante 2009-2017 poderiam ter sido evitadas” com medidas eficazes de proteção contra as altas temperaturas.
“Sabemos que os trabalhadores estão a fazer avaliações médicas antes de deixar os seus países de origem e na chegada”, diz Isobel Archer, do Business & Human Rights Resource Centre. “Os homens são considerados aptos e saudáveis, mas sabemos que houve muitas, muitas mortes entre jovens previamente aptos e saudáveis numa escala que seria surpreendente em qualquer outro contexto.”
100 mil
Número mínimo de trabalhadores migrantes que a Amnistia Internacional considera terem sido explorados e sofrido abusos por causa das leis do trabalho e o acesso insuficiente à justiça no Qatar, nos últimos 12 anos.
14-18
Horas de trabalho diário para muitos dos trabalhadores migrantes no Qatar, principalmente nos setores doméstico e de segurança, de acordo com a Amnistia Internacional. Um relatório recente da Equidem, empresa de consultoria especialista em direitos humanos e direitos do trabalho para empresas, governos e setores sem fins lucrativos, encontrou vários relatos, como o de um trabalhador queniano que descreveu trabalhar 14 horas por dia no Lusail Stadium sem lhe serem pagas horas extras durante mais de dois anos.
264 Euros
Salário mínimo legal por mês no Qatar (1 000 rial), com fornecimento de alimentação e alojamento. Nos últimos anos, as autoridades procederam a uma série de alterações à lei do trabalho, incluindo a introdução de um salário mínimo e a abolição do kafala (“sistema de patrocínio”).
1 300-3 000
Variação em dólares pagos como taxa de recrutamento por alguns trabalhadores migrantes da Índia, Bangladesh, Nepal, entre outros países. Embora isso agora seja ilegal, muitos trabalhadores ainda estão a lutar para pagar as suas taxas de recrutamento, as dívidas associadas e mesmo assim conseguir enviar dinheiro para as famílias.
119
Classificação do Qatar, entre 180 países, no índice de liberdade de imprensa da organização Repórteres Sem Fronteiras.
7
Anos de prisão que homens e mulheres, que mantêm relações sexuais fora do casamento, podem enfrentar, de acordo com o artigo 281 do código penal. Segundo a HRW, esse pena afeta de forma desproporcional as mulheres que forem processadas se denunciarem terem sido vítimas de violação.
11
Casos de maus-tratos na detenção de lésbicas, gays, bissexuais e pessoas transgéneros entre 2019 e 2022, de acordo com um relatório da HRW, de outubro deste ano. As forças do Departamento de Segurança Preventiva do Qatar prenderam, de forma arbitrária, pessoas LGBT, submetendo-as a maus-tratos na prisão, incluindo seis casos de espancamentos graves e repetidos e cinco casos de assédio sexual sob custódia policial, entre 2019 e 2022. Como requisito para a sua libertação, as autoridades determinaram que as mulheres transgénero detidas participassem em sessões de terapia de conversão, em instalações do governo, até então desconhecidas.
5
Possível número de anos de prisão, sob o artigo 296 do código penal do Qatar, por “conduzir, instigar ou seduzir um homem de qualquer forma a cometer sodomia ou dissipação” e “induzir ou seduzir um homem de qualquer forma a cometer atos ilegais ou imorais”.
400 milhões de dólares
Valor que a Amnistia Internacional e outras organizações humanitárias acreditam que a FIFA deveria disponibilizar para ajudar a compensar os trabalhadores migrantes que morreram ou sofreram ferimentos no Qatar. Isso equivale ao prémio em dinheiro da competição mundial de futebol. Contudo, o ministro do Trabalho do Qatar rejeitou tais propostas, alegando que as críticas ao governo são consideradas “racistas”. Ali bin Samikh al-Marri disse à Agence France-Presse que “não há critérios para estabelecer esses fundos” e perguntou: “Onde estão as vítimas? Têm os nomes das vítimas? Como obtiveram esses números?”.