Um grupo de cientistas da África do Sul identificou uma nova variante do SARS-CoV-2 que tem uma série de mutações consideradas preocupantes. O estudo, ainda não revisto pelos pares mas publicado em alguns institutos sul-africanos, explica que esta variante evoluiu da C.1., uma das linhagens que dominou a primeira vaga da Covid-19 naquele país em meados de 2020.
Esta mutação (que teve, em julho, uma prevalência de 2% na África do Sul) está associada a uma maior transmissibilidade do vírus, assim como a uma maior capacidade deste escapar aos anticorpos, concluem os investigadores que, em meados do ano passado, tinham identificado a variante Beta naquele país africano.
Identificada como C.1.2, esta variante foi identificada em maio nas regiões de Mpumalanga e Gautend, onde se situam as cidades de Joanesburgo e Pretória. A 13 de agosto, já tinha sido encontrada em seis das nove províncias da África do Sul, bem como na Mauritânia, República Democrática do Congo, Nova Zelândia, Suíça e Portugal.
Sobre a sua presença no nosso País, o INSA (Instituto Nacional de Saúde Doutor Ricardo Jorge), esclarece: “A variante de SARS-CoV-2 C.1.2 foi detetada pela primeira vez em Portugal, mais propriamente na Madeira, no início do mês de julho, tendo-se registado apenas 1 caso de infeção. Desde essa altura, não se verificou confirmação laboratorial de qualquer caso da variante C.1.2 nas mais de 3 mil amostras entretanto analisadas, pelo que não se conhecem cadeias de transmissão associadas a esta variante, nem é de esperar que venha a existir uma evolução de crescimento da sua frequência.”
O INSA também coloca dúvidas sobre a conclusão de que esta variante será ainda mais transmissível. “Não existe qualquer evidência que permita aferir que estamos perante uma variante potencialmente mais infeciosa e/ou resistente às vacinas do que as variantes de interesse identificadas até agora. Pelo contrário, dificilmente isso se verificará, tendo em conta que esta variante surgiu há já vários meses e, até ao momento, apenas foram identificados em todo o mundo cerca de 100 casos. Não existem também quaisquer estudos que evidenciem que a variante C.1.2 ofereça maior resistência às vacinas, nem que origine problemas de falhas vacinais ou casos de doença mais grave.”
A (in)justiça das vacinas
“Neste momento existe uma carga viral muito grande no planeta. Por isso é que há tantas mutações”, afirma o epidemiologista Manuel Carmo Gomes, defendendo que é preciso olhar para a questão da vacinação a nível mundial.
As diferenças entre os países mais desenvolvidos e os menos são gritantes. Enquanto em Portugal, por exemplo, vamos a caminho dos 75% da população com as duas doses, apenas 1,6% da população de países com baixos rendimentos receberam uma dose da vacina, segundo o Our World in Data.
Se Portugal está em quinto lugar, a nível mundial, em percentagem de população totalmente vacinada, o fim da lista é ocupado sobretudo por países africanos (em Angola, por exemplo, apenas 2,15% dos habitantes têm as duas doses da vacina e, em Moçambique, essa percentagem baixa para os 2,04 por cento).
Neste cenário, são compreensíveis os apelos da Organização Mundial da Saúde para que os países mais ricos não comecem já a dar a terceira dose da vacina, quando boa parte do mundo não tem sequer acesso à primeira dose. “As evidências sobre os benefícios das doses de reforço são inconclusivas. Também enfrentamos um problema moral quando há uma grande parte da população mundial não vacinada. Estamos todos no mesmo barco e tratar apenas uma parte da população não ajudará a sair da pandemia“, defendeu o diretor-geral da OMS, Tedros Adhanom Ghebreyesus.
E se a solidariedade e a empatia não são argumentos suficientes, basta atentar no que dizem os cientistas: enquanto o vírus andar à solta, não há como controlar as variantes que nos afetam a todos.