Luís Augusto Palmeirim conta, na sua Galeria das Figuras Portuguesas, de 1879, que “as hortas eram, já no tempo de Nicolau Tolentino (poeta satírico, 1740-1811) o bem-parado dos gastrónomos de bom contento”. Albino Forjaz de Sampaio regista em Volúpia (A Nona Arte: A Gastronomia), de 1940, que era “divertimento essencialmente lisboeta e domingueiro o êxodo familiar para as hortas e retiros”. E Eduardo Fernandes (Esculápio) esclarece, em Petisquinhos de Lisboa, de 1941, que a população da capital ia às hortas simplesmente “para comer à tripa-forra e saborear bons petiscos, entre os quais avultava o rico peixe frito, carapaus, peixe-espada, linguados e outros, acompanhados de bom vinho do Termo ou do Cartaxo” (Palmeirim anotara “decilitros de Bucelas”).
A tradição morreu e as hortas e os retiros também. Se alguma coisa resta que possa evocar a ida às hortas é o restaurante Chão do Prado, em Bucelas, pela afluência e pelas suas características rurais: casa de campo numa quinta sobranceira à vila com grandes vidraças na sala, mesas de madeira, assentos de bunho e, do lado de fora, a vinha em filas paralelas pela encosta abaixo. Acorrem muitos lisboetas, e não só, certamente para “saborear bons petiscos”. Isto, sim, é como nas antigas hortas.
A ementa é curta e fixa, sinal de escassa variedade, e a culinária muito simples. Em compensação, há bons sabores, a começar pelo pão, azeite e azeitonas do couvert (€1,80 cada). Nas entradas, surgem bons petiscos, como as chamuças de coelho, com massa estaladiça e recheio gostoso; os croquetes de touro, igualmente agradáveis, com muito bom tempero e melhor fritura; e ainda os ovos com farinheira, os cogumelos salteados e o queijo de Niza assado, todos recomendáveis.
Depois, há meia dúzia de pratos principais, incluindo uma salada rica, que justifica o nome com a diversidade dos ingredientes (variedade de alfaces, frutos secos e frescos, queijo de cabra e mel); a fatiota de frango e a fatiota de coelho, ambas com a carne desossada e bem grelhada, servida com um molho – tão simples como apetitoso – de azeite, vinagre balsâmico, alho e coentros (à parte, só para quem quiser), e acompanhada com batatas fritas com a pele e salada; o rosbife, que é um naco de vazia dos Açores temperado apenas com sal e pimenta, sujeito a fritura forte que sela a carne, trazendo batatas fritas e esparregado na guarnição; o bacalhau à Chão do Prado, único prato herdado da anterior gerência, mas renovado (há seis anos, João Carmona, professor de Matemática e gastrónomo, trocou o ensino pelo Chão do Prado, onde faz o que sabe), sendo o bacalhau confitado e lascado, antes de ir ao forno gratinar sobre nabiças salteadas e coberto com broa; caril de camarão, talvez o prato menos pedido, mas o mais apreciado por quem o faz, muito original na mistura de especiarias, na textura e no sabor.
Boa doçaria de confeção caseira, como queijo de cabra com doce de Arinto (uva), musse de chocolate e caramelo (50% cada) e torta de laranja. Garrafeira quase limitada aos vinhos da quinta que, além do Arinto, que é exclusivo nos brancos, oferece uma colheita tardia e um espumante muito gastronómico, com boa relação entre qualidade e preço. Serviço eficiente.
Chão do Prado > R. Almirante Gago Coutinho, 155, Bucelas, Loures > T. 93 645 7259 > qua-sáb 12h30-14h30, 19h30-21h30, dom 12h30-14h30 > €20 (preço médio)