Já estamos sentados, quando o couvert chega à mesa, depois de nos pousarem um pedaço de pão rústico e outro de broa num pratinho ao nosso lado esquerdo, como manda a etiqueta. E logo percebemos que aqui há quem dê importância ao primeiro impacto e aos pormenores. E nem foi só pelo aspeto da esmagada de azeitona preta, do queijo creme com frutos vermelhos ou da manteiga com alho e ervas. Antes, já repararamos que o vinho se guarda num cofre amarelo antigo, que ali ficou mesmo depois de o Café Portugal entrar em obras. Ou que os nossos pés estavam em cima de mosaico hidráulico do século passado.
Enquanto retiramos pedacinhos do couvert, e confirmamos que ele não vive só do aspeto, espreitamos o menu que este restaurante inserido no hotel My Story, em pleno Rossio, em Lisboa, tem para oferecer durante a Restaurant Week (23 de fevereiro a 1 de março só para clientes Millennium, e até 12 de março para toda a gente). Não se trata só de curiosidade, é uma questão de preparar o estômago para o que aí vem e de escolher entre peixe e carne.
Privilégio de jornalista, nas entradas não precisamos de optar, embora nem precisasse de pensar um minuto – há vieiras braseadas sobre creme aioli, com cebola crocante e papellotes de chèvre com mel sobre cama de rúcula. Felizmente, as vieiras chegaram primeiro e pudemos saboreá-las sem intromissões, pois por nós deixaríamos o folhado para outras núpcias.
É a primeira vez que este restaurante, aberto há um ano, participa na semana em que se pode comer um menu fixo, por 20 euros, em sítios onde normalmente não se consegue ter uma refeição por esse valor. Este ano, voltam a estar disponíveis cerca de 100 restaurantes distribuídos por 10 distritos (a maioria em Lisboa, mas também com boa representação no Porto e no Funchal). A grande novidade é a entrada das Pousadas de Portugal na Restaurant Week.
No ano passado, o número de participantes no festival quase duplicou e aproximou-se de uns simpáticos 30 mil clientes. Ganham as associações de solidariedade escolhidas, já que por cada pessoa a alinhar num menu destes, um euro vai para os seus cofres. Este ano, esse valor irá – outra vez – para a Acreditar (ajuda as famílias de crianças com cancro) e também para a Casa Mimar (acolhimento de crianças em perigo).
Venha o magret de pato que o preferimos a um caril de caranguejo com manga e batata palha artesanal. Falta dizer que foi empratado em cima de um puré de limão e com um molho de frutos vermelhos. Mais um espargo ao vapor. Estava bastante saboroso e a foto partilhada num grupo de Whatsapp fez suspirar de inveja os outros membros que não tiveram a mesma sorte à mesa.
Entretanto, Sérgio Sequeira, o responsável do The Fork – plataforma de reservas de restaurantes – em Portugal, garante-nos que negoceiam para que sejam disponibilizados, no mínimo, metade dos lugares de cada restaurante para estes menus. “E fazemos questão que a experiência valha muito mais do que os 20 euros determinados à partida.” Por exemplo, no Café Portugal, com 42 lugares, haverá 33 cadeiras disponíveis para quem quiser vir cá provar este menu durante a Restaurant Week. Se o mesmo pedido fosse feito à carta, as vieiras custariam 10 euros e o papellote €9, a que se deveria somar o magret, a €14 e o caril a €15. Só aqui, já se ultrapassou a barreira do 20 euros, mas ainda ficam de fora das contas as sobremesas (trilogia conventual, €8, ou pannacota com pera bêbeda, €9).
Na altura do doce final, também fomos absolvidos de escolher, por isso saímos do Rossio com os níveis de açúcar lá no alto, mas com um travo delicioso a pão-de-ló de Ovar caseiro na boca. E a pensar que quanto mais pessoas puderem ter esta sensação, mais a vida lhes correrá de feição. E para isto, cá está esta “democratização do acesso à alta cozinha”. Atenção que, este ano, só se pode marcar mesa em The Fork, ou na sua aplicação.
Restaurant Week > 23 fev-12 mar