Que comer menos ou com menor frequência pode aumentar o tempo de vida de um animal já se sabia há décadas. Nos últimos anos têm sido realizados vários estudos e investigações científicas que tentam compreender o motivo para as dietas restritivas prolongarem a longevidade dos animais e prever se, no futuro, será possível replicar esta associação em seres humanos. Agora, uma nova investigação conduzida por uma equipa de cientistas do laboratório JAX – The Jackson Laboratory – pode ter descoberto o fator por detrás desta ligação.
Para o estudo, publicado na edição de outubro da revista Nature, o grupo de investigadores monitorizou a saúde de quase mil ratinhos fêmea, colocados em cinco regimes alimentares diferentes: um em que os animais foram livres de ingerir a quantidade de comida que quisessem a qualquer altura; dois em que os roedores receberam, todos os dias, apenas 60% ou 80% do seu valor calórico base; e outros dois de jejum intermitente, em que não foi dada qualquer comida aos ratos durante um ou dois dias consecutivos por semana, mas, em contrapartida, os animais puderam comer livremente nos dias restantes. As fêmeas foram também submetidas a análises sanguíneas de forma periódica e a avaliações regulares de saúde.
Analisados os resultados, a ingestão de menos calorias teve um grande impacto no tempo de vida dos ratinhos. Ou seja, as dietas com menores valores calóricos prolongaram a vida destes animais, independentemente de outros fatores como a sua gordura corporal ou níveis de glucose – geralmente utilizados enquanto marcadores de saúde metabólica e do envelhecimento. Para além disso, os investigadores descobriram que os ratinhos que viveram mais tempo com dietas restritivas foram os que perderam menos peso, apesar de comerem menos. Já os animais que perderam mais peso tiveram vidas mais curtas e mostraram tendências para ter baixa energia e sistemas imunitários e reprodutivos mais fracos.
“Os animais mais robustos foram os que mantiveram o seu peso, mesmo perante o stresse e a restrição calórica, e são os que vivem mais tempo. Isto também sugere que um nível mais moderado de restrição calórica pode ser a forma de equilibrar a saúde e o tempo de vida a longo prazo”, explicou Gary Churchill, líder do estudo.
Uma revelação inesperada
Outra descoberta que marcou a investigação foi a forma como certos genes – que ainda não foram identificados – podem contribuir para uma maior longevidade, tornando o corpo mais resistente a adversidades. “O nosso estudo aponta realmente para a importância da resiliência”, referiu o cientista.
Segundo as conclusões, os ratinhos colocados num regime alimentar sem restrições viveram, em média, cerca de 25 meses. Já os que seguiram uma dieta de jejum intermitente viveram, em média, 28 meses. Por fim, os ratinhos que comeram 80% das suas calorias de base viveram cerca de 30 meses e os que comeram 60% do seu valor calórico de referência viveram 34 meses. No entanto, dentro de cada grupo, a duração da vida destes animais mostrou-se muito variável. Por exemplo, os ratinhos que ingeriram menos calorias tiveram uma duração de vida de alguns meses até quatro anos e meio.
Este facto levou os investigadores a verificarem que os fatores genéticos tiveram um impacto maior no tempo de vida dos ratinhos do que as dietas. Ou seja, as caraterísticas genéticas de cada animal desempenharam um papel importante na forma como a dieta que lhes foi atribuída afetou a sua saúde e o tempo que este viveu. Ademais, os cientistas identificaram a resiliência – geneticamente codificada – como um fator crítico para o tempo de vida. Os ratos que mantiveram naturalmente o seu peso, percentagem de gordura e células imunitárias saudáveis durante períodos de stresse ou de baixa ingestão de alimentos, foram os que sobreviveram mais tempo.
“Embora a restrição calórica seja geralmente boa para o tempo de vida, os nossos dados mostram que perder peso com a restrição calórica é, na verdade, mau para o tempo de vida”, explicou Churchill. “Por isso, quando olhamos para os ensaios de medicamentos para a longevidade em humanos e vemos que as pessoas estão a perder peso e têm melhores perfis metabólicos, acontece que isso pode não ser um bom indicador do seu tempo de vida futuro”, concluiu.
As conclusões desta investigação colocam em causa os estudos que existem sobre a longevidade humana, assim como criam novas questões acerca da noção de que certas dietas prolongam o tempo de vida de animais.
Segundo os especialistas, este estudo é uma das investigações científicas mais significativas de sempre sobre o tema, uma vez que foi concebido de forma a garantir que cada ratinho era geneticamente distinto, o que permitiu representar melhor a diversidade genética da população humana.