Os grandes primatas podem ser (ainda) mais parecidos com o homo sapiens do que se pensava. Um novo estudo veio demonstrar que há enormes semelhanças entre o comportamento dos jovens chimpanzés e das crianças humanas, nomeadamente na forma como provocam os adultos para obter uma reação. Os investigadores sublinham que os resultados sustentam a paridade evolutiva, sugerindo que a provocação e precursores cognitivos de humor possam ter existido no nosso último ancestral comum há cerca de 13 milhões de anos.
A investigação, publicada na revista científica Proceedings of the Royal Society B, parte de um vídeo de observação de 75 horas a um grupo de dezassete chimpanzés em no Zoo de Leipzig, Alemanha, e a grupos de nove bonobos, quatro orangotangos e quatro gorilas, no Zoo de San Diego, EUA, realizado com o objetivo de analisar o comportamento dos símios e criar um conjunto inicial de dados.
Os investigadores documentaram 142 casos de provocação, que agruparam em 18 tipos de comportamentos. Entre os mais frequentes, estavam espicaçar, bater e fugir, puxar e dificultar o movimento, sendo que a maioria parecia ter como objetivo obter uma resposta e atrair a atenção do alvo, sobretudo os jovens, entre os três e os cinco anos de idade, mais propícios a provocar os outros do que os adultos. Existe também uma semelhança de comportamentos de provocação entre as diferentes espécies.
A provocação lúdica surge muito cedo na infância humana. Os bebés brincam uns com os outros antes mesmo de dizerem as primeiras palavras, começando aos oito meses de idade. Acredita-se que já estão presentes traços de construções sociais e conceituais sobre o que é a brincadeira, o “meter-se” ou a piada nas provocações lúdicas dos bebés.
A provocação é altamente ambígua, constituída por elementos de brincadeira e de agressão, sendo necessária uma antecipação da reação do destinatário, na tentativa de entender qual será a sua interpretação da ação. Para que se constitua como um ato lúdico e não agressivo, o destinatário deve ser capaz de identificar corretamente a intenção benigna ou lúdica do provocador, especialmente quando as ações usadas para provocar também são usadas em contextos agressivos.
Desta forma, os bebés também exploram os limites sociais. Normalmente provocam os pais em momentos de aborrecimento, e ficam atentos a olhar para eles, à espera de uma resposta emocional que seja positiva. Se a resposta for negativa, raramente repetem a ação.
O comportamento de provocação por parte dos primatas é igualmente intencional, revela o estudo, dirigida a um alvo específico, sempre persistente, variando entre elementos lúdicos e agressivos, podendo assumir diferentes formas de comportamento. A provocação normalmente começa unilateralmente e contém elementos-surpresa, tal como observamos nos bebés humanos. Os provocadores esperam por uma reação facial dos seus alvos, de forma a adaptar o seu comportamento e a evitar interpretações erradas e que levem a uma agressividade desmedida.
Os jovens primatas tendem a provocar mais do que os adultos, e diferentes espécies apresentam variações na forma como incorporam elementos de brincadeira ao provocar. Apesar de algumas diferenças relacionadas com a idade, os eventos de provocação geralmente ocorrem em contextos descontraídos, fortalecendo possíveis laços sociais.
No entanto, mesmo quando as provocações lúdicas ocorrem em momentos descontraídos, apresentaram baixas taxas de sinais de brincadeira, sendo assimétricos e ocorrendo predominantemente entre indivíduos com diferenças significativas em tamanho corporal ou status social. Mesmo diante de feedback negativo, os provocadores primatas persistem, o que difere do comportamento de bebés humanos. Assim, dizem os investigadores, estas características sugerem que a provocação lúdica é um comportamento distinto, que pode acontecer em contexto de aborrecimento, e que não é uma simples tentativa mal sucedida de iniciar uma brincadeira.
Ou seja, é o que numa criança humana poderíamos chamar de provocação gratuita.