Estamos na véspera do congresso do PS, naquela que será a primeira semana do resto da vida daquele partido – e um arranque semi-oficial da pré-campanha para as legislativas de 10 de março. Pedro Nuno Santos é o 8.º secretário-geral da história dos socialistas e as opiniões dividem-se: o PS vai guinar à esquerda ou manter-se moderado? PNS é um radical ou apenas um social-democrata à moda antiga? Pode o seu carisma suplantar as cicatrizes – para usar uma expressão sua – deixadas por um desempenho polémico, como ministro? E como conduzirá o novo líder uma campanha sui generis que terá de conviver com um Governo de gestão ainda liderado por um camarada seu? E que papel desempenhará António Costa, ele que terá o discurso inaugural do congresso?
“Pedro Nuno Santos vai apresentar-se aos eleitores com base em duas ideias fortes: rejuvenescimento e capacidade de decisão. Não vai cortar com a “obra” dos governos socialistas, mas apresentar-se como um continuador, que prossegue o trabalho, mas de forma renovada (rejuvenescida). E a expressão, que ele tem utilizado, de que o País “não pode arrastar os pés” pretende dar-lhe uma imagem dinâmica”, aponta Filipe Luís, editor-executivo da VISÃO. “O problema é que, até agora, Pedro Nuno Santos não apresentou uma única ideia programática. Este congresso será decisivo para que o possa fazer.”
O jornalista Nuno Aguiar antecipa que o congresso deste fim-de-semana servirá como um ponto alto de uma campanha até agora pouco detalhada, com promessas de não se desviar muito do rumo dos últimos oito anos, com o ombro um pouco mais encostado à esquerda e tentando afastar-se da imagem de imobilismo de António Costa. “Fomos aprendendo que os líderes do PS são pragmáticos e Pedro Nuno Santos está a revelar-se isso mesmo, não se importando de esconder – não sabemos se provisoriamente se para sempre – esse seu lado mais radical”, refere.
Para Nuno Miguel Ropio, jornalista da secção de política da VISÃO, Pedro Nuno Santos “parece dar sinais de ser uma rutura com um determinado rumo que o PS vinha a tomar”. “Desde 2019, e principalmente com aquela crise dos professores e da ‘maioria negativa parlamentar’, em que ameaçou demitir-se, António Costa distanciou-se de um campo de atuação político que o Pedro Nuno vem preencher”, considerou, admitindo que se “Luís Montenegro achou que, tendo em conta o recente passado de Pedro Nuno Santos como governante, iria com ter uma tarefa mais fácil, aí estão as sondagens, mais recentes, a provarem que se enganou”. “Montenegro não descola e a suposta rebeldia de Pedro Nuno Santos não assusta os portugueses”, apontou, neste OLHO VIVO.
Contudo, no momento de governar, as coisas podem complicar-se. “Havendo maioria de esquerda, assumimos que será fácil formar uma nova geringonça, mas há vários fatores que o dificultam. Na anterior havia muito mais terreno para desbravar”, avisa Nuno Aguiar. “No final, Pedro Nuno pode ter de decidir entre abdicar de governar e dar a vez ao PSD ou aceitar fazer alterações profundas à legislação laboral, onde provavelmente preferiria não mexer.”
Filipe Luís concorda: “Todos já percebemos que ele, mesmo que não ganhe as eleições – mas havendo, na AR, uma maioria de esquerda – não hesitará em tentar fazer uma nova geringonça. Mas esta nova geringonça não são favas contadas. Os partidos à esquerda vão apresentar um caderno de encargos muito mais exigente do que em 2015 (o que passa pela legislação laboral, que esteve na base da implosão da primeira geringonça). E o Bloco deve querer ir para o Governo. Também é verdade que Pedro Nuno está mais recetivo a exigências da esquerda do que Costa, em 2015. Ou seja, uma tal solução representaria um governo muito mais à esquerda do que o atual.”
Nesse momento pós-eleitoral, o Presidente da República terá um papel decisivo. Porém, ele chega a 2024 numa posição menos sólida do que gostaria. “A mensagem de Ano Novo de Marcelo veio numa altura em o próprio precisaria que lhe desejassem um melhor 2024, tendo em conta que termina o ano de 2023 algo fragilizado”, considerou Nuno Miguel Ropio, salientado que, ”além disso, parece que os dons adivinhatórios de Marcelo há muito que se foram; a capacidade de ler a realidade politica, projetando o futuro, foi-se dissipando ao longo deste segundo mandato. E por isso, a mensagem de Ano Novo parece simples, mas também revela a incógnita do que ele acha que pode vir aí”, disse. “Aliás, a incógnita é tanto maior pelo facto de para Marcelo, Pedro Nuno e também Montenegro estarem muito longe de poderem vir a criar uma relação de proximidade como aquela que teve com Costa”, concluiu.
Para Filipe Luís, Marcelo foi “prudente e evitou enviar recados, a não ser aos eleitores”. “Compreende-se essa postura, em ano eleitoral, em que não pode ser acusado de estar a beneficiar ou a prejudicar este ou aquele partido, ou o Governo”, acrescente. “Mas não deixou de dizer que estas eleições acontecem por uma decisão pessoal do primeiro-ministro em demitir-se. Carlos César reagiu logo: há eleições porque o PR dissolveu o Parlamento, sem ter essa necessidade, porque havia outra alternativa. Este pingue pongue entre o PS e Marcelo, sobre quem é o culpado pela crise, vai arrastar-se para a campanha.”
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