Percebe-se que todos queiram ser os portadores das boas notícias, em especial no meio de uma pandemia. O problema é quando as boas notícias anunciadas não se confirmam e acabam, inevitavelmente, por se transformar em más notícias – e a penalizar o seu mensageiro, mas também o grau de confiança nas instituições que ele representa e até a própria sociedade. Por isso, qualquer político ou interveniente no espaço público deveria ter sempre o máximo de cuidado e de ponderação no momento de arriscar uma previsão, especialmente quando sobrepõe o seu desejo e a necessidade de protagonismo à avaliação rigorosa e científica dos factos.
Não está em causa, com isto, o dever de criar esperança na população, o de contribuir para apontar a luz ao fundo do túnel, ainda para mais quando é difícil encontrar uma solução rápida para um problema novo e ainda desconhecido. Só que há uma grande diferença entre prometer baixar os impostos (e não o fazer) e anunciar o fim da pandemia – e ele não se concretizar. No primeiro caso, apenas o político é responsabilizado, no segundo é toda a confiança na vacina e na Ciência que pode ser minada.
Era bom que pensássemos todos nisto no momento em que os casos de Covid-19 voltam a aumentar na Europa e a descoberta da variante Ómicron lança uma série de dúvidas – que ainda vão precisar de semanas para serem esclarecidas! – sobre o comportamento futuro do vírus e as suas consequências para a população mundial.
É nestes momentos, de dúvida e de inquietação, que se percebe como foi estéril e desnecessária a discussão sobre quando os portugueses iriam atingir a imunidade de grupo. Pode ser que já nem nos lembremos disso, mas vale a pena ir recordar as sucessivas declarações de responsáveis políticos e sanitários sobre o “número mágico de 85% de vacinados” e de como a nossa vida iria mudar completamente a partir daí. Até datas concretas foram anunciadas, como se o vírus também estivesse “preso” ao nosso calendário. Afinal, como já todos os percebemos, ainda não será desta que vamos ter um Natal e um Ano Novo normal – ao contrário das “previsões” do último verão.
O que não podemos permitir, no meio disto tudo, é que se confunda o falhanço das previsões com um falhanço das vacinas. Até porque todos os indicadores, em qualquer parte do mundo e perante qualquer variante, demonstram que a vacina continua a ser a melhor arma para nos proteger do vírus. Precisamos, isso sim, de vacinar cada vez mais pessoas e em todo o planeta. E saber explicar que as primeiras doses que recebemos até nos podem ter dado imunidade contra o vírus de Wuhan, mas que podem não ser tão eficazes contra a variante Delta, a Ómicron ou outra que venha a surgir. Mais do que com anúncios inconsequentes estéreis de esperança ou de “boas notícias”, a pandemia tem de ser combatida com verdade – a melhor forma, também, de eliminar a desinformação.