Temos de olhar para o mundo como um só organismo. Para a humanidade como um só povo. Conseguirmos ver-nos a olhar de fora para todo um planeta unido, sem países, da mesma forma que quando pensamos noutro planeta, pensamos noutra civilização inteira e una e não num “puzzle” infestado de guerras e conflitos, como o nosso está.
“Há 71 anos numa manhã clara, sem nuvens, a morte caiu dos céus e o mundo mudou. Um clarão de luz, e uma parede de fogo destruiu uma cidade inteira e demonstrou que o homem já tinha os meios para se autodestruir.” Foi este o principio do iluminado e duro discurso dito por Barack Obama durante a sua histórica visita a Hiroxima. Durante este discurso, Obama propôs um legado diferente para a cidade: Depois de existir durante estes 71 anos como símbolo dos extremos monstruosos a que o homem consegue chegar, pode hoje representar a luz de um novo começo, o principio de um novo despertar. Obama tem claramente o dom de nos inspirar. Como John Lennon e o seu Imagine, como o sonho de Martin Luther King, como o despojamento de Gandhi e de S. Francisco de Assis, Obama consegue fazer mais do que ler um simples papel escrito por ele ou por um qualquer assessor. Não interessa se é tudo verdade ou se é tudo possível. Interessa dizer que há luz na escuridão. Interessa que o homem precisa de saber que essa luz existe, precisa dessa utopia, da noção de infinitude.
E se alguém nos relembra que conseguimos ser muito mais e muito maiores, se alguém nos relembra a responsabilidade que temos de ter consciência de que somos todos um só, esse alguém vai contribuir nem que seja um milímetro para o passo monstruoso em direção à absurda fantasia da Paz Mundial.
É incrível ver um líder tão poderoso falar da humanidade de maneira tão simples, a juntar os pontos. A tirar uma radiografia à fraqueza humana, desde os primórdios da sua existência, desde o primeiro homem, desde a primeira pedra atirada. O instinto primitivo confrontado com a moralidade atual. Aquilo que nos é inerente, frente a frente com racionalidade e tudo o que temos vindo a aprender desde há milhares de anos, sobre o diálogo, tréguas, cooperação e erros. À nossa frente a realidade absurda de guerras travadas entre nações inteligentes, capazes de teorias avançadas sobre a harmonia, a justiça e a verdade. A ideia de que a nossa interdependência devia ser razão para a “cooperação pacífica” e nunca a desculpa para uma “competição violenta”. A ideia de estarmos unidos, de sermos uma só raça. Brancos, pretos, amarelos ou azuis, crentes ou descrentes, pobres, ricos, altos, baixos, gordos, magros, todos iguais. Esta ideia de que uma nação se deve definir por aquilo que constrói, e não pela capacidade de destruir. A ideia de que qualquer destruição é uma autodestruição, porque somos uma raça só, porque somos todos iguais e porque quem morreu em Hiroxima fomos nós também.
Temos que saber olhar de fora. Fechar os olhos e sair pela estratosfera até não haver gravidade, afastarmo-nos até o planeta ficar todo azul, continuar pelo espaço sideral até ficar pequenino. Ver ao longe outro planeta e pensarmos se será habitado por outra qualquer raça. Aterrar num novo mundo e conhecer uma civilização inteligente, una, tecnológica mas também moralmente avançada. Perceber que a ideia é real. Perceber que podemos ser realmente mais do que temos sido. Voltar a abrir os olhos e ouvir: “É o futuro que podemos escolher. Um futuro em que Hiroxima e Nagasaki são conhecidos não como o berço da guerra atómica, mas como o principio do nosso despertar moral”. Que ideia forte esta. Seja verdade ou mentira, esteja o Japão desarmado de arsenal atómico ou os Estados Unidos a renovar o seu, é uma ideia forte, a do mundo a despertar.