É a pergunta de um milhão de dólares: se o PS estivesse associado ao PSD, numa reedição do Bloco Central, teria maior capacidade para reformar a sociedade? Francisco Assis acha que sim.
Há outra pergunta interessante, embora esta de valor bem menor por ter resposta mais previsível: as reformas de um governo do centro seriam as que mais interessam ao País? Sim para Francisco Assis e para os eleitores mais à direita; não para os defensores dos partidos da aliança governativa.
E há ainda uma outra pergunta, esta talvez a melhor de todas e coisa para dois milhões de dólares: se
António Costa tivesse igual possibilidade, reconstruiria o centrão ou insistiria na “geringonça”?
Francisco Assis, o eurodeputado que desde o início se demarcou de António Costa e nunca escondeu divergências perante a solução atual, manteve o recato até agora, vésperas de mais um congresso socialista. Porém, voltou contundente: “Tenho pena que um homem da consistência de António Costa esteja amarrado a esta solução”, disse ao Expresso. E corajoso: perante um governo que tem somado vitórias e fez do novo Simplex uma bandeira, afirmou, ao DN, que “esta solução governativa é atrofiadora da capacidade transformadora e reformista que o PS tenderia a ter se não estivesse dependente desta fórmula”. Ao Observador, concretizou: “Não esperava nada de bom da coligação e ela não trouxe nada de bom ao País.”
Assis pode estar completamente errado. Sabe-se que no PS terá poucos apoios, mas defendeu aquilo em que acredita. Não hesitou em ser o grilo falante. Após tantos meses a discutir se a aliança no poder resiste, se o Bloco e o PCP estão a ser boa influência, se se entendem entre si, é refrescante, do ponto de vista da análise política, retomar a discussão básica: Portugal governa-se com o centrão, com coligações de direita ou com alianças à esquerda? Ou à maneira que Assis defendeu: que PSD e CDS continuassem no Governo e o PS na oposição?
Costa não terá gostado deste recolocar de cenários; Catarina Martins e Jerónimo de Sousa também não. Mas o exercício de pensamento, ao fim de seis meses de governação, faz todo o sentido. E é tão mais provocador quanto ocorre numa época em que pela Europa as forças do centro definham e as mais extremistas sobem votações.
A pergunta que nada vale é sobre a possibilidade de recriar um bloco central com Costa e Passos. Nem que Cristo descesse à terra tal seria possível. Já se viu que, com os atuais líderes partidários, não há apelos a consensos que sejam escutados, quanto mais um acordo de Governo. Se devolver o poder ao partido que ganhou as eleições está fora de causa, resta, até que algo mude nas lideranças partidárias (depois do alerta de Marcelo para o pós-autárquicas, o recém-reeleito Passos disse ao Observador que “se o PSD achar que há outro líder melhor, façam favor, eu não me zango”), resta a atual solução – a que só Assunção Cristas diz abertamente querer pôr fim o mais rápido possível.
As entrevistas de Assis pecam por nada proporem que possa alterar a política nos próximos meses, mas tiveram o mérito de repor a discussão política em termos mais sãos do que aqueles para onde já estava a resvalar sobre o estado de espírito e distanciamento sentimental entre PR e PM.
Fazer pensar é sempre bom.