É a mulher mais poderosa do mercado imobiliário nacional, a liderar o maior grupo do país com cerca de 12 mil colaboradores. Beatriz Rubio, CEO da Remax Portugal, é espanhola, está em Portugal há quase 30 anos, passou pela direção de um dos departamentos do grupo Parfum & Beauté e também no grupo Jerónimo Martins onde dirigiu a divisão de compras da insígnia Recheio. Na liderança dos destinos da Remax Portugal desde 2009, a empresária tem levado o grupo a resultados significativos mesmo em contexto de extrema incerteza como aconteceu com a crise imobiliária de 2008-2013 e durante a pandemia.
Licenciada em Economia e Gestão pela Universidade de Saragoça, a empresária conquistou recentemente o primeiro lugar na 10ª edição do Best Team Leader, uma distinção atribuída com base na avaliação das equipas que lidera na MaxFinance, empresa do universo Remax e que está também sobre a sua alçada. A iniciativa, refira-se, esteve a cargo da Tema Central e da QMetrics, e teve a parceria institucional da APG – Associação Portuguesa de Gestão das Pessoas e do ONRH – Observatório Nacional de Recursos Humanos.
Resiliência foi a qualidade que os seus colaboradores mais enalteceram. Uma virtude que lhe tem permitido saber gerir os momentos mais complicados vividos nesta atividade. Como a autêntica revolução que está a acontecer neste momento no setor, quer por via do aumento das taxas Euribor e do seu impacto no mercado, quer através das medidas estatais contempladas no programa ‘Mais Habitação’.
A montanha russa das taxas Euribor já começa a refletir-se na venda das casas?
Efetivamente, até julho de 2022, costumávamos dizer que o mercado imobiliário era vendedor ou seja, o proprietário da casa marcava o preço que queria e como existiam muitos compradores interessados, tudo se vendia… Mas com o agravar da guerra e do clima inflacionário, o cliente português começou a ressentir-se… E não importa se pertence a uma classe social alta, média ou baixa, a verdade é que se percebe que todos estão a sentir menos dinheiro no final do mês na sua conta bancária. Portanto, menos dinheiro no bolso significa mais dificuldade em aceder ao crédito e tudo isso está a levar a uma natural redução no número de compradores. Tal alterou o mercado que deixou de ser um mercado vendedor para um mercado comprador e nós já começamos a notar isso… Há menos propostas por cada casa em venda e esta demora mais tempo a vender. O prazo médio de venda rondava os 90 dias e agora já começa a levar cerca de 120 dias… E poderá prolongar-se ainda mais…
Isso significa que menos procura poderá fazer baixar os preços como já está a acontecer em vários países da Europa?
Assim seria previsível se não houvesse muito pouco produto em stock… Para se ter uma ideia da desproporção entre a procura e a oferta basta lembrar que em 1998 se venderam 310 mil casas em Portugal. Em 2022 foram pouco mais de 160 mil, ou seja, metade do transacionado em 1998. Procura sempre houve, a oferta é que caiu drasticamente. E porque razão se construía mais em 1998? Porque existia uma orientação junto de todas as câmaras municipais para criarem os respetivos PDMs (Plano Diretor Municipal) e foram estes que vieram definir uma série de zonas novas onde era possível construir. Além disso, o Governo da altura ajudava as famílias que desejavam comprar casa com os empréstimos bonificados. Portanto essas duas circunstâncias deram muita segurança aos promotores e aos construtores. Mas tudo isso mudou…
E até piorou com a questão da morosidade dos prazos de licenciamento…
E não só! Há de facto muitos projetos nas câmaras à espera da licença de construção mas há também muitas casas já terminadas, que não podem ser escrituradas porque lhes faltam simples licenças de utilização! Tudo isto provoca redução de oferta, demora nas transações, etc. Claro que tudo isto vai ter impacto no valor das casas. Imagine um promotor que encontra um terreno para construir, avança com o projeto de arquitetura mas depois espera oito anos pela licença de construção… Claro que os juros da compra deste terreno serão repercutidos na venda das casas e as casas acabam por ficar muito mais caras. Mas depois falam dos estrangeiros… É um argumento falso dizer que a subida dos preços das casas se deve aos estrangeiros. Os estrangeiros compram num segmento muito específico do mercado – o do luxo. Eles não compram em qualquer segmento do mercado, tão pouco em qualquer localização. E porém, a verdade é que vemos que há escassez de casas não só no centro mas em qualquer periferia de Lisboa ou do Porto e tal acontece porque não há produto. E é preciso dizer, de caras, que enquanto não houver produto, o pouco que existe continuará caro.
Caro ou mesmo proibitivo principalmente nos centros…
Não há país algum da Europa em que os residentes nacionais vivam, em número significativo, no centro das cidades… Eu, quando vivia em Madrid, residia nos arredores da capital mas tinha o metro que nos levava em 10 minutos ao centro da cidade e é assim que tem de ser. Cá não existe um transporte público eficiente e por isso é que as pessoas não querem ir para fora da cidade. Essa sim, é a grande realidade. Mas temos mesmo de evoluir como país e perceber, a sério, quais são os reais problemas. Se existirem condições, haverá oferta e o mercado acabará por regular-se a si mesmo…
O programa ‘Mais Habitação’ quer trazer mais casas para o mercado através do arrendamento compulsivo nos centros das duas principais cidades do país.
O principal incentivo para o proprietário arrendar a sua casa será, sem dúvida, o inquilino ser despejado assim que entrar em incumprimento. Socialmente é mau mandar embora alguém, mas a verdade é que se o proprietário não tiver a segurança de poder despejar as pessoas, também não irá colocar os apartamentos a arrendar. É tão simples quanto isso. Enquanto isso não mudar, não haverá mercado de arrendamento.
Há pouco falava do segmento de luxo e dos estrangeiros mas os portugueses representam mais de 80% das transações da Remax Collection, a vossa marca para o segmento de luxo. Qual é o valor médio das transações neste segmento?
O preço médio de venda em 2022 foi de 945 mil euros. Os portugueses representaram 83,2% das transações, os brasileiros 3,7%, os angolanos 1,7% e os americanos 1,3%.
O meu objetivo na Remax Collection são os portugueses porque estamos em Portugal. Um dia os estrangeiros podem vir a fartar-se tal como se fartaram, por exemplo, de Barcelona ou de outras cidades que deixaram de estar na moda. Eu não quero ficar dependente desse mercado estrangeiro por isso apostamos muito nos portugueses.
Os portugueses da classe mais alta pagam a pronto ou também recorrem ao crédito?
Os portugueses deste segmento de luxo também recorrem ao crédito mas apenas para 40 a 50% do valor da casa. Isso significa que também são afetados pelas taxas Euribor. Porém, o tipo de pessoa que recorre a este crédito é alguém que já tem mais de 50 anos e provavelmente já terá comprado a sua casa anterior com taxas Euribor de 14 ou 16%. Isso significa que as atuais taxas Euribor de 3.2 ou 3,3% não os assustam.