Tenho 22 anos e conheci uma pessoa há quatro meses. A primeira com quem ainda não senti tédio ao fim de poucas semanas. Gosto de ser desafiado e ela transpira confiança e não perde uma oportunidade para ser provocadora, às vezes no mau sentido. Costumamos discutir, por exemplo, quando vou ter com amigos e ela me cobra atenção, mas acaba sempre tudo bem e de forma apaixonada. Ultimamente ela anda sempre atrás de mim e até já a apanhei a espreitar mensagens no meu telemóvel. Fiquei irritado porque nunca lhe dei motivos para ela fazer o que fez. Ela diz que é amor, mas eu não estou nada convencido e nem me apetece estar com ela. Como resolvo isto?
Miguel, Aveiro
A sua intuição está certa. O poder mina a liberdade e quando uma relação começa com jogos de medição de forças, por mais erótico que pareça ao início, tal registo (estilo de comunicação íntima) acaba por minar a melhor das paixões, a médio prazo. É certo, também, que por alguma razão, se sente atraído por essa qualidade de funcionamento amoroso, ou já não estaria nela. Como afirma, os encontros com parceiras prévias veio a revelar-se entediante. Porém, a situação presente está a deixá-lo com os cabelos em pé. Uma espécie de “8 ou 80”, em que o resultado é o mesmo: vontade de sair da situação.
Por outro lado, sou levada a questionar: o que entende por “ser desafiado”? O que lhe “falta” a si, que só o outro pode expressar (por si)? Parece que, de uma forma ou de outra, acaba por colocar-se em situações em que não lhe sobra poder de decisão. O facto de não abrir o jogo – limitar-se a ir a ele sem dar o primeiro passo (desafiar, “dar um murro na mesa”) – pode estar a complicar-lhe a vida. Não admira que lhe “falta o ar” e, atrevo-me a dizer, que se sinta aprisionado…
Independentemente do grau de envolvimento ou da duração de uma relação íntima, o sentimento de posse e violação da individualidade do outro são sinais de controlo. A esses deve estar atento e perceber o que está por trás deles. Como? O desconforto de sentir-se vigiado, preso de movimentos, irritado e a forma como lida com a situação (legitimando, por exemplo, situações de manipulação emocional, acabando por fazer as pazes, etc) pode dizer algo de si que ainda desconhece. E que esta relação lhe permite descobrir, mesmo que seja experimentada “no mau sentido”.
Esta “paixão” não é uma oportunidade de ambos explorarem os vossos lados “sombra” (já agora, uma aparência confiante e provocadora pode esconder uma insegurança que se procura testar no outro, de forma inquietante) e darem passos no sentido de um registo de comunicação mais paritário, com uma desejável alternância de papéis. Se não o conseguir nesta situação, ficará mais desperto para o tema na próxima.