O Tribunal da Relação de Guimarães decidiu afastar o juiz Ruben de Jesus do processo em que um homem esteve preso durante quase oito meses pela posse do que a GNR dizia ser cocaína, mas que, afinal, não passava de açúcar em pó – como confirmariam os testes realizados no Laboratório de Polícia Científica (LPC) da Polícia Judiciária.
A decisão surge na sequência do incidente de recusa – como se designam os pedidos que visam assegurar as regras de independência e imparcialidade no julgamento – pedido pelo advogado João Peres, no início do passado mês de fevereiro. O causídico responsabiliza o juiz Ruben de Jesus pelo que considera serem os “erros” neste processo – que permitiram que Manuel Lourenço Gomes permanecesse em preventiva.
No acórdão, a que a VISÃO teve acesso, os desembargadores Pedro Freitas Pinto, Fátima Sanches e Anabela Varizo Martins confirmaram a decisão de “deferir o pedido de recusa formulado pelo arguido”, resultando que o juiz Ruben de Jesus seja “substituído de acordo com as regras de organização judiciária – artigo 46º do Código do Processo Penal”.
Contactado pela VISÃO, o advogado João Peres prefere não comentar a decisão, referindo apenas que esta decisão “é a justiça a funcionar”. Além deste requerimento, a defesa de Manuel Lourenço Gomes também já tinha apresentado uma queixa no Conselho Superior de Magistratura contra a atuação do juiz Ruben de Jesus.
Preso oito meses, libertado após notícias sobre o caso
Manuel Lourenço Gomes, 46 anos, foi detido pela GNR de Torre de Moncorvo, no dia 31 de maio de 2022, junto à localidade de Barracão, Valpaços, pela posse em flagrante de 32,637 gramas de cocaína, que teriam sido encontrados envolvidos em papel de alumínio, no interior do porta-luvas da sua viatura.
O suspeito terá explicado ser “diabético” e que o produto encontrado era “apenas açúcar”, reservado “para alguma emergência”, explicação que não convenceu os militares. Segundo o relatório da operação policial, que a VISÃO consultou, terá sido feito um teste rápido, numa farmácia local, que concluiu que o pó detetado era cocaína. O suspeito ficou em prisão preventiva no Estabelecimento Prisional de Bragança, mas, em novembro, já passados (longos) quatro meses, o LPC da PJ, no Porto, confirmava que, afinal, o produto apreendido não era cocaína nem qualquer outra substância ilícita – mas, de facto, açúcar em pó.
Apesar destes novos desenvolvimentos, o Tribunal de Torre de Moncorvo (da Comarca de Bragança) decidiu manter a prisão preventiva como medida de coação; o MP de Torre de Moncorvo, por sua vez, também prosseguiu na teoria da culpabilidade de Manuel Lourenço Gomes, passando a incluir o seu nome no processo 18/20.7GATMC, com mais oito acusados por posse e tráfico de droga.
Logo no segundo dia útil, após a VISÃO ter divulgado, em primeira mão, esta história – publicada na edição de 19 de janeiro –, o MP propôs a revisão da medida de coação do suspeito, o que seria confirmado pelo juiz 72 horas depois: no dia 27 de janeiro, Manuel Lourenço Gomes saiu, finalmente, em liberdade, passando a cumprir apresentações periódicas às autoridades (duas vezes por semana). Depois de oito meses atrás das grades.