Para que não restem dúvidas, comecemos pelos factos: Greta Thunberg não é uma atriz australiana contratada para este “papel”, não apoia os terroristas do Daesh, não segue cartilhas nazis, nem é financiada pelo milionário de esquerda George Soros (que também não é seu avô). O pai da jovem ativista sueca não fugiu para a Alemanha para viver com um namorado e a sua mãe não é uma lésbica seguidora de rituais satânicos que ensina adolescentes a abortar.
Poderíamos escrever páginas e páginas a desmentir informações lançadas nas redes sociais para denegrir Greta Thunberg, ao longo do último ano. “Fake news” que nada têm de inocente e que esta semana regressaram em força, antecipando a presença da ativista na Cimeira do Clima, que decorre em Madrid, entre 2 e 13 de dezembro. Não faltam teorias da conspiração e teses sobre “quem está por trás” da adolescente. Em várias línguas, com diferentes contextos, mas sempre com o mesmo objetivo.
“Honestamente não percebo por que há adultos que escolhem passar o tempo a gozar e a ameaçar crianças e adolescentes por promoverem a Ciência, quando, em vez disso, poderiam estar a fazer alguma coisa boa pelo mundo”, escreveu na sua página oficial de Facebook há dois meses, respondendo a algumas das falsidades lançadas a seu respeito.
O comentador político conservador Dinesh D’Souza fez furor nos últimos anos, nos EUA, com livros e filmes denegrindo figuras como Barack Obama e Hillary Clinton. Agora insinuou que a imagem de Greta é inspirada na propaganda nazi, seguindo as “velhas cartilhas da esquerda”. Confuso? D’Souza, nascido em Bombaim e naturalizado americano, faz parte da corrente conservadora que não vê o movimento nacionalista alemão como tendo sido de extrema-direita, usando como “prova” o facto da palavra “socialista” estar presente no nome oficial do partido nazi (Partido Nacional-Socialista dos Trabalhadores Alemães).
Outra das críticas frequentes nas redes diz respeito aos sinais exteriores de riqueza da família Thunberg. Terão os pais de Greta enriquecido com a notoriedade da filha? Com ligações ao mundo da música – a mãe, Malena Ernman, é cantora e representou a Suécia na Eurovisão, em 2009 – o casal garante que nada recebe. Até os direitos de autor de “A Nossa Casa está a Arder” (Ed. Presença), escrito por Malena com as filhas Greta e Beata, e o marido, Svante, são integralmente entregues a organizações de defesa do clima.
Talvez exista tanto barulho à volta de Greta Thunberg porque, além dos interesses financeiros que afronta, não é usual uma só pessoa – ainda por cima uma “criança” – conseguir ser ouvida desta forma, e ter a audácia de querer mudar o mundo. Reconhecer esse poder a alguém “como nós” não é pacífico, porque nos faz sentir mais acomodados e cobardes, o que poderá explicar também as teses de que se trata de um ser superior, uma viajante no tempo ou até uma nova encarnação de Cristo.
Analisadas todas as teses, restará em comum um fundo de verdade: esta miúda quer chamar a nossa atenção para a emergência climática, e está a consegui-lo.