Associado ao popular Tino de Rans – o alter-ego de Vitorino Silva, antigo candidato presidencial (em 2016 e 2021) –, o partido RIR – Reagir, Incluir, Reciclar entrou numa nova fase no pós-legislativas de 2022, com a eleição de Márcia Henriques como presidente.
Situado ao centro, o RIR foi o partido com mais votos a ficar fora da Assembleia da República (sem contar com o CDS), com pouco mais de 23 mil votos. Ainda assim, longe dos 35 mil alcançados em 2019. Para inverter esta tendência, Márcia Henriques apresenta-se ao eleitorado como “moderada” e “coerente”. “Seria muito fácil ser populista, mas não somos assim”, sublinha.
Advogada de profissão, a nova presidente continua a apontar para a eleição de Vitorino Silva, que concorre pelo círculo do Porto, “bastião do RIR”, para o Parlamento. Em entrevista à VISÃO, Márcia Henriques quer entrar no Palácio de São Bento e promover “um pacto entre partidos para solucionar os graves problemas” do País.
No debate da RTP, disse que substituiu Vitorino Silva na presidência do RIR, pois, por vezes, o partido era “ridicularizado”. É uma vantagem afastar uma figura tão popular em Portugal como é o “Tino de Rans”?
Não foi bem assim… Eu já fazia parte dos órgãos do RIR. Aliás, estou envolvida no projeto desde a sua fundação. Em 2022, decidimos fazer um Congresso eletivo e, nesse momento, fiquei eu como presidente. E não digo que o RIR fosse “ridicularizado” com o Vitorino Silva – que continua connosco. O que acontecia, muitas vezes, era ele ser incompreendido. É alguém com uma forma muito própria de se expressar, e isso, na verdade, levava órgãos de comunicação social e comentadores a aproveitarem para o ridicularizarem.
Sentiam que, por causa disso, o partido era prejudicado?
Sim, muitas vezes não era levado a sério. Decidimos, então, mudar de presidente. Claro que o Vitorino está sempre presente: é o nosso cabeça de lista pelo Porto. E é alguém com quem falo todos os dias. Portanto, não há nenhuma incompatibilidade, que isso fique claro. A figura do Tino é muito popular e muito importante para o RIR.
O RIR foi o partido, dos que ficaram de fora do Parlamento, e sem contar com o CDS (agora na AD), mais votado em 2022, com 23 mil votos. Mas, em 2019, foram 35 mil. A aposta de Márcia Henriques, presidente, candidata por Lisboa, e Vitorino Silva, pelo Porto, é a solução para o RIR chegar à Assembleia da República?
Acho que sim, que é uma solução que nos vai trazer vantagens. Há aqui uma complementaridade entre os dois candidatos. O Vitorio Silva tem uma maneira muito própria de chegar aos eleitores, as pessoas gostam muito dele, e o seu discurso funciona muito melhor a Norte. A Sul, sempre foi mais difícil, esse discurso não era tão bem compreendido. Decidimos conjugar estas duas formas de ser, comigo em Lisboa, num tom mais formal, mais, digamos, “política”. E temos notado que o feedback das pessoas tem sido positivo.
Eleger para a Assembleia é muito difícil. Em 2022, apesar de tudo, o Vitorino Silva ainda ficou pouco distante desse objetivo. Mantém essa meta?
Naturalmente. O grande objeto é chegar à Assembleia da República. Queremos ultrapassar os números de 2022, não andamos aqui a brincar aos partidos. O objetivo é contribuir ativamente para as decisões futuras do País. Descemos na votação entre 2019 e 2022, é verdade, mas, lá está, as últimas eleições foram atípicas. A Covid-19 ainda estava presente, era difícil fazer campanha. E, depois, houve a questão do voto útil, com muita gente a escolher o PS, com vista à estabilidade, que, ainda por cima, não se verificou. Acho que, desta vez, os eleitores já não vão na “cantiga” do voto útil, o que nos pode dar alento para melhorar o nosso resultado. A meta está estabelecida. E, sinceramente, acho que temos fortes possibilidades de alcançá-la.
Ou seja, chegar à Assembleia da República. Dos dados que têm, estamos a falar de uma eleição em Lisboa ou no Porto?
Aqui temos de ser honestos. Neste momento, o Vitorino Silva tem muito mais possibilidades de ser eleito do que eu. As nossas campanhas sempre foram, aliás, muito focadas na região do Porto. E, desta vez, não tem sido diferente.
E como tem corrido a campanha?
Nestes tempos em que vivemos, era muito fácil ser populista e dizer aquilo que as pessoas querem ouvir, como fazem outros partidos. Esse não é o nosso caminho. O RIR é ao centro, moderado, coerente e te verdadeiras propostas para apresentar. É assim que nos temos vindo a apresentar aos cidadãos.
Essa era a próxima pergunta: o facto de ser um partido ao centro, não pode passar uma ideia de indefinição ideológica?
O Vitorino Silva já o dizia. E a Márcia Henriques continua a dizê-lo. O RIR é um partido que não se reconhece no binómio direita-esquerda. Acho que isso não prejudica o partido em nada, nem as pessoas acham que o RIR é “indefinido”. Sinceramente, acho que essa definição direita-esquerda já deixou de fazer sentido. Isso é algo que ainda está muito instituído na política portuguesa, mas preferimos apresentar medidas equilibradas, defender boas medidas que se dizem de esquerda e boas medidas que se dizem de direita. Claro que nunca vamos agradar a todas as pessoas, isso é impossível. Quando apresentamos uma ideia temos, sobretudo, de pensar no bem-estar geral da população. É essa a nossa maneira de estar na política.
Qual é a principal bandeira do RIR nesta campanha?
O RIR acha, em primeiro lugar, que seria importante que todas as forças partidárias se sentassem para discutir um plano estratégico para Portugal. Temos de pensar onde queremos estar daqui a 20, 30, 40 anos… Isso nunca se faz neste País. O que temos são medidas que servem como “pensos rápidos”. Sem uma estratégia, não é possível fazer melhor. Temos de encarar o País como se fosse uma empresa, que tem de funcionar bem. Não podemos desprezar os serviços públicos que existem, até porque temos uma carga fiscal muito elevada, e os portugueses, neste momento, acabam por pagar mais do que aquilo que recebem. Os cidadãos estão sobrecarregados de impostos e não sabem para onde esse dinheiro está a ir.
E quais são os setores que considera prioritários?
Neste momento, está tudo tão complicado… A Justiça está num estado lastimável, por exemplo. Sou advogada, converso muito com muitos colegas, e chegamos à conclusão que nunca vimos o setor tão mau. Não há funcionários públicos suficientes para tramitar os processos, começa a haver falta de juízes e procuradores… Isto é importante. Não há Justiça quando um cidadão tem de esperar mais de uma década por uma sentença de primeira instância; quando um cidadão recebe uma notificação das finanças para pagar uma coima, contesta a decisão, e arrisca-se a esperar 10 anos ou mais para que o tribunal tributário ou administrativo dê uma resposta.
Esses problemas seriam resolvidos com o “pacto entre partidos” que referiu há pouco…
Sim, claro. Isso seria o ideal. Mas há outros problemas associados à Justiça. Não há nenhuma empresa estrangeira que queira investir em Portugal, sabendo que a Justiça não funciona, por exemplo. Depois, temos o problema da Educação. Julgo que é muito bom termos muitas pessoas qualificadas, exportarmos muitas cabeças pensantes… Mas, a este ritmo, daqui a uns anos já nem disso nos podemos orgulhar, porque a Educação está, de facto, em decadência. Os professores não têm sido apoiados, já ninguém quer ir para a profissão… Portanto, a Educação precisa de ser olhada com muita atenção.
Já que fala de escolas, lembro-me que, no debate da RTP, disse que “as crianças, nas escolas públicas, comem pior que cães”. Não é um retrato algo exagerado?
Ainda bem que me lembrou dessa frase… Parece incrível, mas eu não acredito em coincidências… O que sei é logo na semana a seguir a esse debate, a minha filha enviou-me uma foto do almoço dela e parece, de facto, que ter dito aquilo na televisão resultou, porque a comida da escola já não tinha nada a ver com a que vinha sendo apresentada nos meses anteriores.
Acha que que a sua intervenção teve esse impacto?
Sinceramente, acho que sim. Ou, pelo menos, quero acreditar que sim. Caso contrário, não fazia sentido andar aqui. Isto também é fazer política.