Chama-se Black Sigatoka e é o grande medo dos investigadores porque ataca a espécie de bananas mais consumida, produzida e exportada do mundo – as Cavendish.
O fungo apareceu em 1963, provavelmente a partir de uma mutação de um outro que já existia – o Yellow Sigatoka – e neste momento ameaça regiões tropicais e subtropicais como o Brasil, a Flórida, o Equador, a Indonésia, etc. e pode levar à perda de 50% da produção.
As boas notícias são que, à partida, a produção nacional está a salvo. Somos um paraíso à beira-mar plantado que além do bom tempo, tem um potencial insular incrível que as bananas adoram ter como casa.
Questionado sobre este perigo, Miguel Carvalho, professor e investigador na Universidade da Madeira e Coordenador do Banco de Germoplasma da Madeira (onde existe a única reserva de banana em Portugal), diz que a presença do fungo em Portugal é “possível mas muito pouco provável”.
Para justificar esta teoria, aponta três razões fundamentais: não temos o clima propício para o desenvolvimento do fungo, ele precisa de um período de desenvolvimento de 25 dias e as bananas da Madeira (a produção portuguesa mais relevante) têm por base matéria produzida localmente.
“É evidente que não podemos excluir o perigo de vir a acontecer porque vivemos num mundo globalizado em que até o transporte de frutas em contentores pode ser um perigo. Além disso pode haver uma mutação acidental do próprio fungo e ele se conseguir adaptar e podem alterar-se as condições climatéricas. Com as que temos neste momento, é impossível”, diz.
Seja como for, há um dado que importa considerar: uma parte significativa da banana consumida em Portugal é importada e por isso não podemos excluir a possibilidade de este problema vir a influenciar os nossos preços.
A história do fruto
Mas vamos recuar aos primórdios do fruto, amarelinho e docinho, que é o mais popular do mundo.
A planta da banana é o resultado de um acidente genético e tem um consumo anual de mais de 100 mil milhões de bananas no mundo, e produzido em mais de 130 países. Um peso, nomeadamente económico, à escala global que só a ideia de pensar em perder faz lembrar uma verdadeira “República das Bananas”.
Além de uma excelente fonte de proteínas, a banana é um alimento fácil, rápido e muito nutritivo.
A árvore que lhe dá vida chama-se Genus Musa, vulgarmente conhecida como bananeira em português, e tem origem no sudeste asiático. A Portugal chegou nos séculos XV e XVI, pelas mãos dos nossos colonizadores que começaram por plantá-las de forma sistemática nas ilhas da Madeira e dos Açores, onde ainda hoje temos a nossa maior produção.
A espécie mais consumida de banana teve origem há 186 anos, quando em 1830, o jardineiro inglês Joseph Paxton recebeu um cacho de bananas importadas das Ilhas Maurícias. E assim nasceu, na propriedade de Chatsworth em Derbyshire, aquela que viria a ser a variação da fruta mais consumida no mundo – a banana Cavendish, que em Portugal chamamos vulgarmente de banana-caturra. Foi, e é ainda hoje, a preferida dos produtores mundiais por ter sido a única sobrevivente do fungo que dizimou praticamente todas as bananas do mundo (de origem Gros Michael) nos anos 50 e 60.
Embora com menos sabor do que as Gros Michael, as Cavendish conseguiram resistir e vingar, tornando-se as mais populares – 47% de todas as bananas do mundo são Cavendish e 99% da exportação mundial é de origem Cavendish.
A ameaça atual
O Black Sigatoka é conhecido como doença da folha da bananeira e provoca uma mancha negra no interior do fruto. O fungo aparentemente pode expressar-se quer do ponto de vista assexuado quer sexuado, mas exige temperaturas (acima dos 27 graus) e humidades relativas (acima dos 80%) muito elevadas para que possa se desenvolver.
O Professor e investigador Miguel Carvalho diz compreender o alarme, uma vez que “é uma doença com grande exposição e que ataca sobretudo as regiões das zonas produtoras. O que é, do ponto de vista económico, muito problemático”.
Arlindo Lima, professor e investigador do Instituto Superior de Agronomia, refere-se ao assunto dizendo: “em termos de prejuízos causados à cultura, o Black Sigatoka é, atualmente, a principal doença. Desde os anos 70 que obriga a maiores custos na gestão fitossanitária”.
O professor teme, no entanto, que a doença do Panamá possa voltar a ser uma das doenças-chave da cultura. “A doença do Panamá está presente em quase todas as regiões de produção da banana”, diz relembrando que ela evoluiu e nem todas as Cavendish lhe conseguem resistir.
Em Janeiro deste ano (2016), o jornal Independent mencionou o problema com uma frase do coordenador internacional da organização Banana Link, Alistair Smith: “É mais ou menos possível conter (o fungo) com medidas severas, mas isso não significa que a doença não será transmitida”.
Portugal praticamente livre de perigo
Por cá, a banana mais famosa é a da ilha da Madeira e a sua variedade é a Musa Acuminata Cavendish, uma relíquia da ilha exportada para os sete cantos do mundo. O solo madeirense dá vida a 14 variedades de banana, embora algumas delas com uma representatividade muito residual, e são praticamente todas do grupo Cavendish. De dentre elas, destaca-se a ‘Pequena anã’, cujo fruto é tradicionalmente designado de ‘banana da Madeira’.
Em 2015, foram vendidas 17 693,5 toneladas de banana da Madeira e 85% da produção foi exportada.
Para além da jóia da coroa das bananas portuguesas, o fruto também é produzido em algumas ilhas do arquipélago dos Açores.
Os problemas a nível nacional
Do temido Sigatoka não há registos, mas na Madeira teme-se o problema da podridão aquando da colheita, e alguns insetos que as atacam sem piedade, como o escaravelho. No caso de se verificar a existência de uma epidemia, seja ela qual for, o procedimento é de “imediata eliminação da cultura afetada”
“E temos alguma erosão genética que tentamos minimizar utilizando novo material a partir dos bananais mais antigos”, refere o professor Miguel Cardoso.
O aquecimento global é outra das ameaças à produção porque um clima menos húmido significa bananas menos doces. Para atrasar o problema, têm sido estudadas técnicas de aproveitamento da água para os sistemas de rega.
Seja como for, a boa notícia é que esta tendência propicia ainda menos a reprodução de fungos como este Black Sigatoka.
As soluções
Para o Dr. Miguel Carvalho, não existe uma só solução para este problema e elas não são consensuais.
Os pesticidas são a solução mais utilizada mas, segundo ele, têm de ser usados com cautela. “Há inclusivamente estudos que nos indicam o potencial cancerisna dos pesticidas para quem consome as bananas e para quem as planta”. Por outro lado, as alterações genéticas, embora muito praticadas, são também potencialmente perigosas para a saúde pública e alguns países, como a Rússia, já nem sequer as utilizam.
Há alternativas biológicas, que considera preferíveis como a utilização de produtos naturais, de compostos extraídos de outras plantas, ou de outros organismos nomeadamente bactérias, para tentar controlar estes fungos. Compensam ao nível da qualidade nas não são opções tão usadas porque são economicamente menos competitivas.
Para o professor Arlindo Lima, “a criação de novas cultivares de bananeiras tem sido difícil porque são híbridos naturais e na sua maioria triplóides (células com cromossomas tripartidos)” mas a solução pode passar por essa via para desenvolver novas variedades mais resistentes a este tipo de patogénicos.
O futuro é incerto mas seja qual for o rumo que esta história possa vir a tomar, aqui ficam 12 boas razões para comer bananas todos os dias.