O rapper e produtor musical Sean Combs – também conhecido pelos nomes artísticos “Puff Daddy” e “P. Diddy” – foi detido a 16 de setembro em Nova Iorque, acusado de tráfico sexual, extorsão, subornos e transporte para prostituição. Um dos nomes mais influentes do mundo do Hip Hop americano, admirado por milhões de fãs em todo o mundo, Diddy está agora a ser investigado pela justiça norte-americana num caso que está a chocar os Estados Unidos.
Quem é Sean “Diddy” Combs?
Conhecido por “Puff Daddy”, “P. Diddy” ou só “Diddy”, Sean Combs é um artista e produtor de música norte-americano, muito influente na indústria. Fundador da gravadora Bad Boy Records – criada em 1993 ao lado de Jay-Z – Combs, de 53 anos, está por detrás da carreira de grandes nomes do género musical Hip Hop como Notorious B.I.G., Mary J. Blige, Usher, Lil Kim, Faith Evans e 112. O autodenominado ‘bad boy’ da música expandiu também os seus negócios ao mundo da televisão e moda, acumulando uma fortuna de centenas de milhões de dólares.
Ao longo de três décadas de carreira, “Diddy” teve alguns problemas com a justiça norte-americana. Em 1998 foi detido após agredir o produtor de música Steve Soute com uma garrafa de champanhe e uma cadeira. Mas as acusações foram retiradas depois de emitir um pedido de desculpas público. No ano seguinte, em 1999, o músico foi detido novamente ao lado da cantora Jennifer Lopez, sua companheira na altura, após um confronto com armas num clube noturno de Manhattan que feriu gravemente duas pessoas. Combs, acusado de posse de arma e suborno, foi considerado inocente.
Mas denúncias de violência sexual só surgiriam em 2019 quando Gina Huynh, uma ex-namorada de Combs, alegou ter sido vítima de abusos físicos e emocionais, sem nunca ter, no entanto, apresentado queixa.
As “freak-offs”
Detido a 16 de setembro, nos Estados Unidos, Combs está agora acusado de comandar um império de crimes sexuais e de abusar sexualmente de várias mulheres e alguns homens durante anos. No processo criminal – de 14 páginas –, citado pelo jornal New York Times, o nome do produtor surge associado a uma longa lista de crimes incluindo fogo posto, rapto, tráfico sexual, obstrução à justiça, suborno e transporte de mulheres entre estados com o intuito de prostituição.
A maioria das acusações surgem associadas às festas organizadas pelo rapper – a que chamava de “freak-offs” – e que envolviam uma elevada quantidade de drogas e sexo. Segundo a acusação, Combs drogava mulheres – com cocaína, oxicodona e cetamina -, forçando-as a ter relações sexuais com prostitutos e convidados enquanto o produtor filmava e se masturbava. As gravações – captadas sem o consentimento das vítimas – eram depois utilizadas para chantagear as mulheres, mantendo-as em silêncio. Combs “garantiu a participação das mulheres ao, entre outras coisas, obter e distribuir narcóticos, controlando suas carreiras, oferecendo apoio financeiro e ameaçando cortar o mesmo, e usando intimidação e violência”, refere a acusação.
Os “freak-offs”, descritos como maratonas sexuais no processo judicial, podiam durar vários dias e a acusação refere que os seus participantes chegavam a ter de fazer reposição de fluídos, através de injeções, devido à exaustão que provocavam. “Um verdadeiro espetáculo de horror com atuações sexuais elaboradas e produzidas”, descreve a acusação.
O processo – que não menciona nomes – refere ainda que as vítimas eram “obrigadas a permanecer escondidas – às vezes por vários dias – para se recuperarem das lesões infligidas por Combs”, após os eventos. “As vítimas acreditavam que não podiam recusar as exigências [de Combs] sem pôr em risco a sua segurança financeira ou profissional ou sem repercussões sob a forma de abuso físico ou emocional”, lê-se na acusação.
O Ministério Público norte-americano acusa ainda Combs de liderar, desde 2008, uma empresa criminosa responsável pela coordenação destas festas, incluindo a procura e transporte interestadual de indivíduos para prostituição e encobrimento de danos nos quartos de hotéis ou outros espaços utilizados. A empresa estaria assim envolvida no esquema de tráfico sexual, trabalho forçado, transporte para fins de prostituição bem como delitos relacionados com drogas, rapto, incêndio criminoso, suborno e obstrução à justiça. “Combs não fez isto tudo sozinho”, explicou Damian Williams, procurador encarregue pelo caso. “Ele usou os seus negócios, funcionários e outros associados próximos para conseguir o que queria. Estes indivíduos, supostamente, incluíam supervisores de alto escalão nos negócios, assistentes pessoais, equipa de segurança e empregados domésticos”, acrescentou.
O rapper nega todas as acusações, garantindo que os encontros, apesar da sua natureza, não envolviam agressões sexuais, nem “força, fraude ou coerção”.
A acusação de Cassie: Como tudo começou
O processo contra Diddy surge no seguimento de denúncias de abusos físicos, feitas em novembro do ano passado, pela cantora de R&B Cassandra Ventura, com quem Combs manteve uma longa relação amorosa durante mais de uma década. Segundo o processo, Cassie – nome artístico – refere que a relação entre ambos – que teve início em 2005 quando esta tinha apenas 19 anos – incluía drogas, agressões físicas e mentais e abuso sexual. No processo, Cassie menciona as “freak-offs”, acusando o artista de a forçar a participar nas festas e de a obrigar a manter relações sexuais com prostitutos enquanto filmava. Alegações que Combs “nega veementemente” e considera “ofensivas”.
Um dia depois de Ventura ter apresentado o processo, a 16 de novembro de 2023, as duas partes chegaram a um acordo para resolver o caso, embora não tenham sido revelados pormenores sobre os termos. “Decidi resolver este assunto de forma amigável, em termos que me permitam ter algum controlo”, explicou Ventura através de uma declaração.
Mas as alegações de Cassie levaram outras mulheres e homens, nas semanas e meses seguintes, a acusarem o produtor musical e espoletaram uma investigação policial que levou agora à detenção de Combs. Uma das acusações, em fevereiro deste ano, surgiu pelo produtor e músico Rodney Jones Jr. – mais conhecido como Lil Rod. O artista acusa Combs de contactos sexuais indesejados e de o ter forçado a contratar prostitutas e a participar em atos sexuais enquanto trabalhavam no álbum de Combs“The Love Album: Off the Grid”, em 2023. No processo, Jones afirma que Combs terá agarrado seus órgãos genitais sem o seu consentimento, tentando incentivá-lo ter sexo com outro homem, dizendo-lhe que era “uma prática normal na indústria da música”.
Mais recentemente, já depois de sua detenção, também Thalia Graves acusou o rapper e o guarda-costas deste de agressão sexual. Graves alega ainda que a agressão foi filmada por Combs que partilhou as gravações com outras pessoas. Até ao momento, oito pessoas acusaram formalmente o rapper de abuso e agressão sexual, mas as autoridades acreditam que este número possa vir a aumentar.
As acusações levaram à abertura de um processo federal e a buscas policiais nas casas de Diddy, em Los Angeles e Miami, em março deste ano. Nas suas propriedades foram encontrados narcóticos, vídeos dos “freak-offs” e mais de mil frascos de óleo de bebé e lubrificante. As autoridades apreenderam ainda nove armas de fogo do tipo AR-15 e munições, que a acusação diz terem sido usadas para intimidar testemunhas e vítimas.
Provas que não mentem
O Ministério Público afirma estar a construir um caso sólido contra Combs. Até à sua detenção foram questionadas mais de 50 testemunhas e vítimas – um número que pode vir a aumentar – e obtidos os registos financeiros, de viagens e faturação do produtor.
Uma das principais provas de abuso é um vídeo, de 2016, divulgado em maio pela CNN norte-americana. Nas gravações pode ver-se o momento em que Diddy – com apenas uma toalha em volta da cintura – agride violentamente Cassie num corredor de um hotel nos Estados Unidos. A acusação alega que o episódio se passou após uma tentativa de fuga de Ventura de um “freak-off” e que têm provas que, durante o ataque, pelo menos um prostituto se encontrava dentro do quarto de hotel.
Já a defesa do rapper alega que a discussão foi provocada por Cassie após descobrir que Diddy era infiel, e que a mesma terá agredido o artista e fugido do quarto com as roupas todas do músico – justificando a sua falta de vestuário.
Combs permanece numa prisão federal em Brooklyn, Nova Iorque, depois de lhe ter sido negada fiança. Na audiência, o juiz Andrew L. Carter Jr. mostrou-se preocupado com a possibilidade de obstrução à justiça, através da manipulação de testemunhas. Combs encontra-se ainda sob vigilância por risco de suicídio.