
Era a primeira vez que o açoriano Francisco Helvídio Barcelos provava um dos gelados que tinha começado a fazer ali na Quinta dos Açores, a sua empresa de produção de carne e leite. Na cabeça, tinha uns outros que descobrira nos Estados Unidos. “Se fossem tão bons como aqueles que comi…”, dizia, antes de enterrar a colher num dos seus e de a levar à boca. O sorriso não escondeu a alegria: “São ainda melhores!” Estavam aprovados os gelados da Quinta dos Açores, que, na ilha Terceira, já produzia leite fresco, iogurtes, queijos e carne de vaca certificada.
Esta história já leva dois anos, mas os gelados têm passado discretos, não tanto na Terceira, mas mais pelas prateleiras de alguns supermercados no continente, como o Pão de Açucar e o Jumbo, o Pingo Doce e o El Corte Inglés. Agora, estão dispostos a dar nas vistas. Para isso ajudará o facto de, durante setembro e outubro, serem servidos na ponte aérea Lisboa-Porto da TAP (e de estar a ser estudado o regresso na primavera e a chegada à classe executiva em voos de longo curso da companhia portuguesa). E também a presença em algumas lojas da cadeia Continente, até 3 de outubro.
Cremosos, feitos à base de leite e nata fresca, os gelados não escondem nem no nome nem nos sabores o lugar de onde vêm. Entre os 28 sabores que foram criados, alguns são fruto de parcerias locais, como o de Queijada da Graciosa, Queijada Dona Amélia, Queijada da Vila Franca, o de Chocolate com Queijo de São Jorge ou o de Nata com Ananás dos Açores. A estes juntam-se sabores mais tradicionais como os de morango, chocolate ou baunilha, mas também pistáchio, doce de leite ou amêndoa.
Por enquanto, quem os quiser provar a todos terá que ir à cafetaria/geladaria aberta às portas de Angra do Heroísmo, na Terceira, no primeiro andar do edifício da Quinta dos Açores, onde também funciona parte da unidade industrial de carnes e lácteos da marca, e também uma mercearia e talho – há até uma zona em que se pode espreitar a produção, atrás de um vidro e ver, por exemplo, os gelados a encherem as embalagens. Apesar do Grupo Barcelos, proprietário da Quinta dos Açores, se dedicar sobretudo ao negócio das carnes de vaca, os lácteos vão ganhando terreno. Hoje, a empresa é gerida por Francisco Barcelos, a sua mulher, Maria José, e as três filhas, Telma, Helga e Diana. Diziam que o pai não tinha tido sorte nenhuma por não ter um filho homem, mas as três vão mostrando que, com vacas e negócios, não são só eles que se safam.
A verdade é que os gelados sabem ainda melhor quando se conhece a história daquele homem, que, em 1977, aos 21 anos, recém-casado, resolveu deixar a vida de funcionário público, comprou o gado do sogro e se tornou lavrador. “Ia havendo divórcio logo ali”, conta, divertida, Helga, a filha do meio. Foi ele que, nove anos depois, convenceu outros lavradores da Terceira a irem à Alemanha, comprar vacas da raça Holstein Frísia, fazendo a renovação genética dos animais na ilha. A empresa foi crescendo, em torno do negócio da carne, ganhando prémios e certificações.
Hoje, para os lácteos, são 150 as vacas leiteiras que dão um total de quatro ou cinco mil litros de leite por dia, ali na ilha onde existem duas vacas por cada habitante e onde os animais andam livres pelos cerrados, alimentando-se de milho e erva. É desse leite que nascem os gelados da Quinta dos Açores. Ao continente e aos aviões da TAP chegam apenas alguns dos sabores – mas é certo que os das queijadas, os mais populares, nunca faltam. E sabem mesmo a Açores.