Ana Paula Rodrigues, médica de Saúde Pública do Departamento de Epidemiologia do Instituto Nacional de Saúde Doutor Ricardo Jorge (INSA), apresentou esta manhã, na reunião de peritos do Infarmed, dados provenientes de vários países que sugerem uma “aparente menor gravidade da infeção” provocada pela variante Ómicron.
A variante, detetada inicialmente na África do Sul, deixou o mundo em alerta e fez com que muitos países, entre eles Portugal, acionassem medidas de precaução mais elevadas antes no Natal. Nessa altura, explicou a especialista, havia ainda “um grande desconhecimento” sobre a gravidade desta infeção, o que justifica as medidas tomadas.
Entretanto, a África do Sul observou “um risco de internamento” cerca de um quinto menos provável, comparado com os casos infetados com a variante Delta. Com base nos dados disponíveis, a especialista do INSA referiu ainda que havia “maior risco de hospitalização nas crianças com menos de cinco anos e nos adultos com mais de 60 anos”.
De acordo com um estudo realizado na Escócia, também apresentado por Ana Paula Rodrigues esta manhã, a variante Ómicron revela menos severidade e “uma redução no risco de internamento cerca de um terço inferior ao esperado face à variante Delta”. Quanto às reinfeções, no entanto, o mesmo estudo observou um risco 10 vezes superior àquele existente no caso da variante Delta.
Ana Paula Rodrigues apresentou também um estudo norte-americano que comparou as variantes Delta e Ómicron relativamente ao risco de urgência hospitalar, internamento, necessidade de Unidade de Cuidados Intensivos ou ventilação mecânica. Em todas as situações, “o risco foi inferior nos casos infetados com a variante Ómicron”.
Nos casos internados, o risco de hospitalização foi de 0,44% para a variante Ómicron, “menos de metade do risco existente na variante Delta”. Em todos os grupos etários, dos mais novos aos mais velhos, verificou-se um menor risco “quer de internamento quer de ida à urgência quando comparados com a Delta”, revelou a especialista.
“Isto resulta da conjugação de dois fatores. Se por um lado temos a menor gravidade da infeção devido à menor capacidade de ligação do vírus às nossas células do pulmão, por outro lado temos também o papel da imunidade que já adquirimos, seja por vacinação seja por infeção”, explicou Ana Paula Rodrigues.
Eficácia vacinal reposta com a dose de reforço
Dados recentes, chegados do Reino Unido, mostraram que “a efetividade vacinal contra a variante Ómicron é globalmente, e em todas as situações, mais baixa do que aquela que foi estimada para a Delta”, no entanto, após o reforço da vacina, verifica-se um aumento desta efetividade, mesmo nos casos contra Ómicron.
Após o reforço vacinal, a efetividade das vacinas contra a variante Ómicron, no que respeita infeção sintomática, pode ser classificada “entre moderada e elevada variando de 40% a 70%”, com um decaimento mais rápido da mesma, quando comparando com a variante Delta”.
Quando falamos de efetividade contra hospitalização, porém, Ana Paula Rodrigues revelou que esta, na variante Ómicron, após a dose de reforço “atinge valores elevados, na ordem dos 88%” e, mesmo com apenas duas doses de vacina, “varia dos 52% aos 72%”.
São valores inferiores aos observados para a variante Delta, é certo, mas a especialista sublinhou que, “após o reforço, estes valores aproximam-se e, apesar de não se saber ainda qual o decaimento desta efetividade contra hospitalização, espera-se que seja mais lento do que aquele que se está a observar contra infeção”.
O que esperar no futuro?
De acordo com o terceiro inquérito serológico do INSA, a população portuguesa tem uma seroprevalência muito elevada. “Tínhamos, em outubro, 86% da população com anticorpos contra o coronavirus”, revelou Ana Paula Rodrigues, acrescentando que tais valores eram ainda mais elevados na população com mais de 70 anos.
O INSA percebeu também que o nível de anticorpos era mais elevado nas pessoas que haviam tomado três doses de vacina ou que foram vacinadas após a infeção, sendo um pouco inferior nos indivíduos com duas doses de vacina.
Perante a alta seroprevalência registada em Portugal, as características da Ómicron e o facto de a efetividade vacinal contra infeção ser menor para esta variante, o INSA espera “uma carga de doença elevada, mas com gravidades mais baixas”.
“Isto não quer dizer que vamos passar a ter uma infeção ligeira, mas sim mais benigna relativamente à que existia até agora”, alertou Ana Paula Rodrigues, considerando ainda essenciais a manutenção das medidas de segurança e a vacinação das crianças.