Chamados às urnas, os eleitores decidiram penalizar as lógicas centralistas e interesseiras dos aparelhos partidários e preferiram votar nos candidatos que lhes dessem maior garantia de independência, face ao poder e à lógica dos estados-maiores da partidocracia em que se transformou a política portuguesa. Com essa decisão, anunciaram, sem o saberem, um novo tempo. A partir de hoje, o futuro político do país passa a estar condicionado, inevitavelmente, por duas personalidades: António Costa e Rui Moreira. É essa a principal leitura nacional de umas eleições que alguns desejavam que fossem apenas locais.
Embora ainda não se conheçam os resultados totais das eleições autárquicas, há já uma certeza que sobressai: estas foram, porventura, as eleições mais locais de sempre. Foram as eleições em que os votantes pensaram, primeiro, nos candidatos e só depois nos partidos. Por isso, neste momento, pelo menos, nenhum partido pode reivindicar para si os votos obtidos nos concelhos mais populosos do país: alguém acredita que António José Seguro pode repetir, nas legislativas, os mais de 50% dos votos que António Costa obteve em Lisboa? Por mais que se esforce, alguém leva o CDS-PP a sério quando se cola à vitória de Rui Moreira no Porto?
Ao derrotarem os candidatos impostos por Passos Coelho e António José Seguro, os eleitores do Porto catapultaram Rui Moreira para uma dimensão nacional. Que será preciso acompanhar, com atenção nos próximos tempos. Até porque, ao longo dos últimos meses, o próprio Rui Moreira tem dado sinais de que tem ideias – pretensões, porventura – para o País.
Da mesma maneira, a vitória esmagadora de António Costa em Lisboa não pode ser reivindicada pelo aparelho do PS liderado por António José Seguro – como, de forma subliminar, Helena Roseta fez questão de sublinhar na sua primeira declaração de vitória. António Costa teve um resultado histórico porque, frontalmente, teve a coragem e a sabedoria de se apresentar ao eleitorado com um discurso próprio e livre de compromissos com o partido a que pertence desde os 14 anos. Em certa medida, António Costa foi também um candidato independente. E são os espíritos independentes e livres que os eleitores agora escolhem, pelos vistos, para os governar. Por razões que todos nós, honestamente, sabemos muito bem porquê.