Passada a discussão e aprovação do Orçamento do Estado para 2025, que dominou a agenda mediática, mesmo que tenha sido mais sobre a forma em torno da sua aprovação e não tanto sobre o seu conteúdo, este rapidamente desapareceu da discussão pública num processo de quase apagão em que não se fala mais desse assunto até ao ano seguinte, quando recomeça a época do comentário futebolístico em torno das probabilidades de aprovação da nova proposta para o ano seguinte.
Algo no mínimo estranho visto que muito daquilo que é a governação passa por este instrumento. E isto não é por acaso, trata-se, de facto, de esconder as opções de fundo deste Governo de compromisso com os grandes grupos económicos, e mesmo o pouco que há de positivo, fruto da luta do povo, procura-se que não se dê muita atenção, para ver se ninguém se lembra quando não for cumprido.
Ora o Orçamento do Estado de 2025 é um tratado de política de direita, com o favorecimento daqueles que lucram 32 milhões de euros por dia enquanto se nega à maioria da juventude as condições para construir os seus projetos de vida cá no nosso país.
O Governo AD deveria considerar, a bem da verdade, acrescentar “para o precipício” no lema “Portugal no bom caminho”, e com este orçamento disse claramente que está cá para colocar o Estado a servir e dar borlas aos senhores do dinheiro enquanto rejeita o aumento do salário mínimo nacional e a valorização dos serviços públicos.
O PS, não quis ficar atrás e, no meio de ameaças veladas, de caras de mau e de juras ao povo, absteve-se. Tal como na legislatura anterior, absteve-se no geral e no concreto, mesmo perante a urgência de resolver os problemas da juventude. Por todo o lado lemos em letras garrafais que as pensões vão aumentar por causa do PS. Falta o asterisco. As pensões não vão aumentar mais por causa do PS, tal como será por causa do PS e do seu demissionismo, que se irá manter a especulação e as insuficiências na oferta pública de habitação, a escassez de psicólogos nas escolas e IES, de camas e residência públicas, de obras nas escolas e de pavilhões gimnodesportivos, de internet nas escolas, a concretização de um passe inter-regional e intermodal.
Será também por causa do PS e dos restantes partidos da política de direita que sim, haverá aumentos na refeição social nas cantinas do ensino superior, nos hospitais e centros de saúde, que os jovens trans que no sul do País necessitem de cuidados específicos continuarão a fazer fila em unidades de saúde a centenas de quilómetros da sua casa e que a fila na AIMA ocupará mais um quarteirão.
E o PS não só viabilizou este tratado de política de direita, também permitiu que a IL e o Chega votassem contra um orçamento com o qual estão de acordo.
A IL barafustou porque o orçamento era insuficiente, pois apesar de aprofundar o caminho de um Estado cujo papel é única e exclusivamente o de servir e dar borlas às grandes empresas, ainda não concretizou o sonho de trocar o Governo por um conselho de administração ou os serviços sociais do Estado por negócios, e o povo a pagá-los acima da taxa de usura. O Chega bem que podia ter comprado mais uns metros de pano de faixa para acrescentar o seu voto contra a contribuição extraordinária sobre lucros e à taxa especial sobre transacções financeiras para paraísos fiscais.
Quando o salário acabar ainda mais cedo no mês, quando fizer frio na escola porque não são feitas as obras necessárias, quando os jovens viverem a ansiedade de não ter o suficiente para pagar a propina, a renda e comer, ou a instabilidade de quem só encontra contratos ao mês, à semana, ao dia, como se fosse possível planear a vida nestas condições, quando os jovens não conseguirem sair de casa dos pais e conquistar a sua independência, devem saber que estão também a sentir as consequências do OE aprovado por PSD e CDS e que o PS viabilizou com a sua abstenção.
Ora precisamos é de um caminho diferente, de uma alternativa política que garanta uma distribuição mais justa da riqueza, não por ódio ou cruzada contra os lucros, mas porque sabemos que é preciso e existem recursos para responder a muito de que preocupa diariamente quem estuda e trabalha em Portugal.
Um caminho que se constrói todos os dias com luta dos que aspiram a uma vida melhor, uma luta que se tem intensificado nas escolas secundárias e profissionais, no Ensino Superior e nas fábricas e demais locais de trabalho.
Se no OE de 2025 não consta o aumento das propinas, como era vontade do Governo, foi porque os estudantes do ensino superior a derrotaram. Por seu lado, de norte a sul do País os estudantes do ensino secundário e profissional lutaram nas suas escolas pelas obras que fazem falta, pelo pavilhão ou a cantina que não existe, por uma avaliação justa, pelo direito a participar e a ter tempo para viver. Muitos jovens trabalhadores conseguiram em muitas empresas ser integrados e ficar efetivos, aumentar salários e conquistar direitos.
Da nossa parte não ficamos à espera pela próxima proposta de orçamento para discutir o seu conteúdo, não deixaremos os compromissos assumidos no atual orçamento cair no esquecimento e continuaremos a exigir respostas, mesmo que para lá do que o documento inscreve.
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