Em todas as revoluções tecnológicas, a riqueza cresceu exponencialmente e desapareceram muitos postos de trabalho. Lentamente, à medida que os custo de certos bens e serviços baixaram, o rendimento disponível potenciou a criação de novas necessidades e, com isso, novos trabalhos e o acesso a um maior número de bens, permitindo vidas mais confortáveis (a creative destruction).
Com a Inteligência Artificial, o desafio é mais exigente. Estima-se que 80% das tarefas são passíveis de ser automatizadas. O ritmo desenfreado da automatização implica a eliminação de empregos e pressiona para uma conversão acelerada de competências.
Como assegurar que a comunidade em geral, e não apenas os que disponibilizam soluções informáticas, beneficia dos ganhos de produtividade? E será que a sociedade está preparada para suportar os custos de conversão de milhões de trabalhadores?
A política fiscal tem como principal função assegurar a redistribuição de riqueza. Como podem os Estados financiar as estruturas que garantem o direito de propriedade (como os tribunais), a segurança, defesa, infraestruturas, investimento em inovação, educação e requalificação, se não tributar? [A eficiência de cada Estado na aplicação dos impostos é uma discussão autónoma.]
No entanto, este fim tem vindo a ser comprometido. Estados utilizam o regime fiscal para atrair investimento, criando distorções de concorrência. A tributação mais favorável da tecnologia em relação ao trabalho constitui um subsídio à automatização, mesmo quando esta não cria maior produtividade e, ainda por cima, destrói empregos.
Assim, não obstante beneficiarem da estrutura do Estado, empresas e multibilionários utilizam a liberdade de circulação de capitais para reduzirem ao mínimo a sua contribuição para o bem comum.
Mas tem de ser assim? Não, mas a solução exige um esforço concertado.
Em 2023, os membros da OCDE chegaram a acordo em tributar num mínimo de 15% os dividendos das multinacionais, mas Trump, no primeiro dia do seu mandato, retirou os Estados Unidos da América também deste acordo. Importa por isso que a União Europeia (UE) avance, também aqui, numa maior integração e uniformização fiscal, que se estenda além da tributação concertada de dividendos.
Igualmente, é imprescindível que a UE implemente políticas que promovam o investimento em tecnologias com maior impacto social (como as energias renováveis), em que o mote não é automatizar apenas, mas criar novos postos de trabalho.
Também cada um de nós pode ativamente preparar-se para este mundo novo, através de uma formação continua. Na incerteza sobre o que é o futuro, é já certo que aqueles que melhor utilizam as ferramentas tecnológicas são os que apresentam um nível de literacia elevado e apurado sentido crítico.
No estudo conduzido pela OCDE, em 2023, sobre literacia, numeracia e resolução de problemas em adultos, em 31 países, Portugal ficou em penúltimo lugar. Cerca de 40% da população adulta não compreende uma frase complexa e apenas “4% são capazes de compreender e avaliar textos longos e densos, entender significados complexos ou ocultos e utilizar conhecimentos prévios para compreender textos e realizar tarefas” [site oficial do Programa 2030].
É essencial retomar hábitos de leitura, participar ativamente nos programas de formação da sua empresa (incluindo no desenho dos mesmos), matricular-se em disciplinas específicas da universidade pública (com o custo apenas da propina da disciplina e sem pré-requisitos de admissão). Invista em si, para que no Jogo do Tecnopólio os vencedores não sejam apenas os bilionários da tecnologia.
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