Em plena assistência financeira, no ano de 2012, Portugal aprovou o Regime do Golden Visa Portugal, mais conhecido como o Visto Gold, com o principal objetivo de captar recursos e investidores para o país, tão necessário à data. Esta autorização de residência especial para estrangeiros de fora da União Europeia foi um regime que mereceu forte contestação, não apenas por parte de outros Estados-membros da União como pelos diversos partidos da oposição que consideravam que se tratava de uma entropia aos princípios e valores democráticos europeus, abrindo as portas da Europa para negócios ditos obscuros e ainda para ganhos ilegais. No fundo, para muitos, o Golden Visa representava a entrada na Europa pela porta dos fundos.
O certo é que, não obstante a forte contestação inicial, os vistos gold resistiram e o modelo acabou por ser replicado por outros países.
Volvida uma década sobre a criação deste regime, o conflito militar na Ucrânia voltou a chamar a atenção para os Vistos Gold. Na União Europeia – para além de ordenar o congelamento de contas bancárias de oligarcas russos -, diversos países estão a suspender a apreciação destes vistos a cidadãos russos. E Portugal não é exceção.
As sanções financeiras têm sido utilizadas como formas alternativas ao uso da força armada para alcançar o objetivo último: a paz e a segurança internacionais, através da pressão exercida a determinados sectores influentes do poder político ou de sectores estratégicos que alimentam o poder militar.
Mas com a implosão do conflito armado na Ucrânia, que parece ter erradicado a COVID-19 – pelo menos do espaço mediático -, a Europa enfrenta uma ameaça séria à sua segurança.
Depois de uma pandemia que paralisou o mundo, os virologistas e os infeciologistas dão agora lugar aos militares e aos estrategas. A segurança sanitária cede o seu espaço à segurança do território. Já não estamos na guerra do invisível, estamos na guerra do visível.
E nas guerras do visível, as guerras ditas clássicas ou convencionais, existe algo que não se altera: os movimentos migratórios em busca da segurança mais elementar de todas – a sobrevivência humana.
E os territórios que oferecem mais segurança são, regra geral, aqueles estão mais distantes dos conflitos. Neste caso, Portugal está no diâmetro oposto ao conflito, beneficiando de uma geografia que o coloca numa situação competitiva de segurança nesta guerra da Ucrânia. Coloca-se a questão: será que este conflito armado poderá representar um incremento dos pedidos dos vistos gold em Portugal?
Por exemplo, a criação do regime dos vistos gold em Portugal coincidiu com a implosão de um conflito que ainda está bem presente na nossa memória: a guerra na Síria. Nessa altura, conheci alguns nacionais sírios que aderiram a este regime não com um objetivo de branquear dinheiro ou legalizar negócios: era sobretudo para encontrar um país que lhes oferecesse segurança e uma ideia de futuro. E não são apenas estes casos de nacionais sírios que fugiram de uma guerra que lhes destruiu o seu país. Outras situações existem de pessoas oriundas de países com sistemas políticos frágeis ou instáveis que procuram apenas uma ideia de segurança e de futuro.
Importa por isso realçar que este regime, como tantos outros, não serviu apenas como veículo para acomodar negócios obscuros ou para branquear capitais. Para além das vantagens económicas e reais para o mercado habitacional português, sobretudo num momento de forte crise financeira, serviu também como um país de acolhimento para cidadãos que pretendiam fugir da guerra ou da instabilidade política do seu país.
E com a implosão da guerra na Ucrânia, Portugal está na geografia mais favorável, está na cauda da Europa!
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