Faço terapia há muito tempo, desde o 5º ano de escolaridade, e de forma continuada desde os 14/15 anos. Em julho de 2019, foi-me diagnosticada uma depressão, e também comecei a ir a uma psiquiatra, que me receitou medicamentos.
Embora fosse uma criança saudável, muito brincalhona, extrovertida e com a mania de que tinha piada, aconteceram-me muitas coisas que me causaram sofrimento, alturas em que o meu coração diminuía de uma maneira gigante, e via tudo escuro. Isto apesar de gostar imenso de jogar ténis e do ambiente em que cresci, rodeada de courts.
Tudo começou quando levei este desporto mais a sério e passei a ir a competições. Tive medo de desiludir o meu pai, que também foi jogador e era conhecido no meio. Sentia, desde cedo, que devia deixá-lo orgulhoso, ser a melhor, pois ele também foi, durante algum tempo, meu treinador. Pensava que, se falhasse como atleta, falhava como filha.
Passava a vida em treinos, em ambiente de competição. Tinha mau perder, e foi daí que veio a frustração. Comecei a ficar com muita raiva e a levar aquilo da forma errada. Só queria ganhar, preocupava-me com o que se passava para lá do campo, já não me divertia. Quando acabava o treino, estava muitas vezes triste.
Em 2014, fiz uma lesão grave no tornozelo direito, uma rutura de ligamentos, a um mês de começarem os torneios nacionais e internacionais. Esta lesão, que me fez parar mais ou menos um ano, mudou a minha vida, no sentido em que sabia, não sabendo, que era o princípio do fim. Nessa altura, passei a ficar na escola depois das aulas. Tive um verão dito normal… até ia à praia.
A seguir, sofri outras lesões, porque já não treinava como dantes. Mais tarde, enquanto os meus pais se separavam, também sofri o primeiro desgosto de amor.
Já entrei triste para o secundário. Estava constantemente a querer agradar aos outros, fossem amigos ou familiares. Ligava muito à aparência, ao que vestia, ao Instagram. Era muito insegura e tinha as prioridades um pouco trocadas. E, no ténis, ainda pior, porque já não ganhava tanto.
Terminado o secundário, com 18 anos, fui para os Estados Unidos da América, com uma bolsa de estudo. Lá, chorava muito, tinha várias crises de ansiedade, ataques de pânico, e ainda não estava medicada. De manhã cedo, tínhamos horas de estudo obrigatórias e, depois, treinos, além das aulas e dos trabalhos de casa. Na minha equipa, fizeram-me a vida negra desde o início. Comecei a retrair-me.
A seguir ao verão em Portugal, era suposto regressar para estudar noutra faculdade e fugir ao mau ambiente. Mas, durante essa estada por cá, a minha psicóloga disse-me que íamos precisar de uma ajuda extra. Foi então que passei a ter uma psiquiatra – achava que era uma médica de malucos. Não fazia a mínima ideia do que se tratava, não tinha ninguém no meu meio que tivesse uma depressão. Comecei a medicação, que ainda hoje faço: ansiolíticos, antidepressivos, outro para dormir e um SOS. As dosagens têm vindo a mudar, são adaptadas consoante a evolução da doença.
Lembro-me pouco dessa fase. Tinha 19 anos, acabava de desistir do ténis, da faculdade, e só me recordo de me sentir perdida, de me meter no quarto às escuras e de quase não tomar banho. Nem consigo dizer que a Covid-19 me afetou: estava deprimidíssima, sofria de ansiedade e tinha vários ataques de pânico por dia. Mas, como não queria falhar às minhas amigas, muitas delas nem sabiam o que se passava comigo, lá ia fazendo alguma coisa. Perdi muito peso e, depois, engordei até aos 67 quilos, por causa da medicação.
“O que posso fazer para melhorar o mundo?”
Em setembro de 2020, entrei na universidade, em Portugal. As aulas eram de manhã, e eu estudava durante toda a tarde. Tirava boas notas, embora tivesse imensa ansiedade com os testes. Em abril de 2021, tive uma enorme recaída, com muita frustração e muito choro. Estava com uma tristeza profunda. Cada dia, cavava mais o buraco. Comia, mas só emagrecia. Depois, aproveitei-me da situação para ficar magra, deixando de me alimentar – cheguei aos 43 quilos e achava que ainda podia perder mais. Não me disseram que era anorexia, mas era isso que se passava.
Em setembro de 2021, percebi que precisava de mudar tudo na minha vida, das pessoas que me rodeavam aos sítios do social (hoje, não tenho a mínima paciência para isso). Mas só posso dizer que a minha vida começou realmente a mudar em março [de 2022], ganhando hábitos que me fizeram muito bem – escrever a Jesus e ler muito sobre desenvolvimento pessoal. Mais tarde, decidi que ia para Itália, fazer Erasmus, e foi espetacular. Percebi, com a ajuda de muita terapia (lá, fazia online), como me sentia livre, adolescente até.
Porém, em novembro, comecei com um cansaço estranho, a ficar muito pensativa, preocupada com o que as pessoas pensavam de mim, principalmente os outros estudantes. Passei de uma fase de relativizar, em que me sentia muito feliz, para estar outra vez preocupada e triste. Tentei acabar com a minha vida.
Depois do Natal, já não voltei para Itália. Então, a psiquiatra aumentou-me a dose da medicação. Acho que é por isso que estou tão bem agora, muito mais madura e a lidar melhor com a realidade.
Em meados de janeiro, comecei a sentir-me muito frustrada com o estado da saúde mental em Portugal. Virei-me para uma amiga, a chorar, e perguntei-lhe: “Diz-me, por favor, o que posso fazer para melhorar o mundo?” E foi quando decidi partilhar a minha história no Instagram, para ser uma voz, uma mensagem de esperança que ajude as pessoas.
Hoje, estou muito orgulhosa de mim, por ter vontade de sair disto, bater o pé no chão. Tenho muita sorte por ter sido sempre muito bem acompanhada. Infelizmente, há muita gente a sofrer sem ter acesso a esta relíquia.
Depoimento recolhido por Luísa Oliveira