A pandemia bem pode ter dado algum impulso à vontade de viver em zonas rurais mas a capacidade de atração das cidades continua imparável obrigando as administrações locais a adotar soluções que se coadunem com o respeito pelo Planeta. Um estudo elaborado pela Savills lembra que em 2030, ou seja, em apenas oito anos, aproximadamente 60% da população mundial viverá em cidades, de acordo com o Relatório da ONU “World Cities”, tornando-se vital que os centros urbanos desempenhem um papel de liderança no que respeita ao objetivo de zero emissões.
Muitas cidades já estão a dar o exemplo como é o caso de Nova Iorque, Barcelona, Cidade do Cabo ou Sydney. Também Lisboa, eleita Capital Verde Europeia 2020, comprometeu-se a reduzir nos próximos oito anos 70% das emissões de gases com efeito de estufa comparativamente aos valores de 2002.
Lisboa, assim como as cidades do Porto e Guimarães, integram a lista das 100 cidades da UE que terão acesso a 360 milhões de euros para atingirem a neutralidade carbónica até 2030, integradas no Programa da Comissão Europeia “Missão Cidades”.
Um movimento que já está também a mexer com o mercado imobiliário e a construção de novos edifícios. “Em toda a Europa, a procura de edifícios verdes por parte dos inquilinos levou a um aumento da atividade de desenvolvimento de escritórios, tendo o development pipeline em 2021 aumentado em 24%. A descarbonização de edifícios já está a ser impulsionada por mais proprietários, investidores imobiliários e empresas, não apenas para ajudar a arrefecer um planeta em aquecimento, mas também porque o seu próprio sucesso depende disso”, realçou Nuno Fideles, Associate Architect & Sustainability Consultant BREEAM AP da Savills Portugal. O responsável lembrou que a necessidade de edifícios verdes é também impulsionada por grandes arrendatários empresariais de vários setores. “Grandes empresas como a Microsoft, a Amazon e a Google declararam compromissos significativos de redução de carbono para as décadas futuras, o que significa que irão necessitar de espaço empresarial que cumpra estes pré-requisitos”, sublinhou o responsável da Savills.
Cidades consomem cerca de 80% da energia
As cidades consomem atualmente 78% da energia mundial e produzem mais de 60% das emissões de gases com efeito de estufa. “Desde a conferência climática COP26, em novembro de 2021, que os países ultrapassaram as cidades tendo em conta as metas do compromisso de zero emissões. Contudo, muitas cidades continuam a desenvolver objetivos mais ambiciosos do que os países onde estão localizadas”, destaca-se no estudo, que dá como bons exemplos a cidade de Nova Iorque e Barcelona.
“A cidade de Nova Iorque, por exemplo, continuou empenhada nos princípios do Acordo de Paris quando os Estados Unidos se retiraram em 2017, enquanto o Conselho Municipal de Barcelona aprovou um plano ambicioso para reduzir as emissões de gases com efeito de estufa da cidade em 45% até 2030, quatro anos antes do congresso espanhol ter aprovado o roteiro global do país para a neutralidade de carbono”, exemplifica-se.
Historicamente, as cidades europeias e norte-americanas têm sido as que mais contribuem para alcançar as metas de zero emissões de carbono, aponta o estudo. Os dados indicam que 38% das cidades norte-americanas e europeias têm como objetivo a neutralidade de emissões, em comparação com 18% na América Latina, 17% na África Subsaariana, 14% na Ásia-Pacífico, e apenas 4% no Médio Oriente e Norte de África.
Em mercados imobiliários menos maduros, nomeadamente no Médio Oriente, África e Índia, existe potencial para desenvolver novas ações compatíveis com o ambiente. Pelo contrário, os mercados imobiliários maduros devem concentrar-se na readaptação para atingir a neutralidade carbónica. Este desafio é particularmente urgente na Europa, que apresenta uma taxa de apenas 1-2% de novas construções, resultando na necessidade de atualizar o stock histórico de edifícios.
“Para tal, é vital que os governos locais e nacionais trabalhem em conjunto com organizações comerciais e cidadãos para desenvolver estratégias coesas de redução de emissões que possam ser implementadas em todos os níveis da sociedade”, recomenda a Savills. Barcelona, por exemplo, investiu 1,2 milhões de euros num plano de ação climática centrado na sensibilização do público para as alterações climáticas e na “construção em conjunto” para enfrentar estas questões.
Bons exemplos
Em 2020, todas as propriedades da cidade de Sydney foram exploradas, pela primeira vez, utilizando 100% de energia renovável, enquanto a Cidade do Cabo estabeleceu que todos os seus edifícios municipais funcionem de acordo com os padrões net zero até 2030.
Leuven, na Bélgica, destacou-se pelo seu plano climático, Leuven 2030, que inclui o envolvimento de cidadãos e atores económicos, bem como de autoridades nacionais. Nos EUA, o Green New Deal de Los Angeles, que apela a uma rede elétrica, sistema de transportes e edifícios “carbono zero” até 2050, afirma ter criado 35 mil empregos verdes até à data.
Londres introduziu a primeira Zona de Emissões Ultrabaixas do mundo (ULEZ), e outras cidades britânicas anunciaram planos para as suas próprias zonas de baixas emissões ou de ar limpo, em linha com a estratégia Build Back Greener net zero do país.
Imobiliário produz 40% das emissões de gases
O setor imobiliário é responsável por 40% das emissões globais de gases com efeito de estufa e é, portanto, uma área de atividade importante a considerar pelas cidades ao planearem as suas estratégias de sustentabilidade.
Os imóveis emitem carbono sob duas formas: incorporados e operacionais (sendo este último o que tem maior impacto). Por conseguinte, devem ser tomadas medidas para limitar as emissões de carbono em cada fase dos projetos imobiliários. Proptech (Property Technology ou Real State Technology) e sistemas de construção inteligentes, bem como tecnologias renováveis e de baixa energia, podem ajudar a melhorar as credenciais ecológicas de um projeto.
A construção estará, portanto, na vanguarda desta revolução dos edifícios verdes, com a Oxford Economics a sugerir que o resultado da construção a nível global poderá atingir os 15,2 biliões de dólares até 2030, um aumento de 42% em relação a 2020.
A Cooperação Financeira Internacional estima que os edifícios verdes representam uma oportunidade de investimento de 24,7 biliões de dólares até 2030 nas cidades dos mercados emergentes.