Num passado não muito distante, os cenários pouco claros sobre soluções governativas em alguns países da Europa motivaram uma forte reação de cautela dos investidores. E, regra geral, isso levava a subidas nos custos de financiamento e volatilidade na cotação de ações e obrigações. No entanto, desde 10 de março, os mercados financeiros mostram estar bastante tranquilos em relação a Portugal, apesar de os resultados saídos das legislativas sugerirem um governo minoritário da AD, que corre o risco de ter um prazo de validade curto.
Essa calma dos investidores já se tinha notado no comportamento da bolsa portuguesa no arranque da semana. Mas esta quarta-feira houve mais uma forte prova, quando o IGCP – a agência que gere o crédito público – foi ao mercado para obter financiamento através de Obrigações do Tesouro com prazos de 7 e 19 anos. O Estado conseguiu juros mais baixos e atrair procura de investidores. No total, a operação permitiu obter €1000 milhões.
Nas Obrigações do Tesouro com maturidade em 2031, o Tesouro obteve uma taxa de 2,645%. Foram cerca de menos 0,5 pontos percentuais que na última operação comparável, realizada no passado mês de fevereiro. Já nos títulos que vencem em 2042, o juro foi de 3,262%, menos 0,2 pontos percentuais do que o verificado na última emissão com o mesmo prazo, efetuada no passado mês de janeiro.
A descida nas taxas é um forte indício de que os investidores estão a deixar fora das suas equações um impacto da incerteza no andamento da economia e que continuam a perspetivar a continuação das políticas de contas certas.
Essa tem sido também a posição de algumas das principais agências de notação financeira. A S&P, aliás, não hesitou em melhorar o rating de Portugal para A- poucos dias antes das Legislativas, o que poderá também ter ajudado na operação de financiamento desta quarta-feira. E já com os resultados eleitorais conhecidos, os analistas da agência americana referiram, numa nota, que “apesar dos potenciais atrasos na formação de um Governo de coligação, esperamos que o próximo executivo continuará com a recente política orçamental prudente”. E esperam que o País apresente excedentes orçamentais entre 2025 e 2027.
A S&P afastou também preocupações sobre a capacidade de o País continuar a executar o Programa de Recuperação e Resiliência. “O desembolso de fundos relacionados com a implementação de projetos apoiados pelos fundos Next Generation EU, que são essenciais para as finanças públicas e crescimento de Portugal, deverão continuar no caminho certo”.
Já a DBRS acrescenta uma dose de ceticismo. Sublinhou, num relatório, que o principal risco passa por existirem dificuldades na execução do PRR devido a um parlamento bloqueado e a um governo instável. Ainda assim, realçou que um governo liderado pela AD “continuaria a prosseguir uma política orçamental sólida e a reduzir o rácio da dívida pública durante a próxima legislatura, utilizando o espaço orçamental disponível para reduzir os impostos”.
Além do efeito das subidas recentes do rating e da aposta dos investidores de que as políticas das contas certas são para manter, também o contexto dos mercados financeiros europeus foi favorável para a emissão desta quarta-feira. “O Banco Central Europeu deu nota de que deverá começar a descer taxas em junho deste ano, o que levou a um ajuste dos prémios de risco, beneficiando a dívida nacional”, referiu Filipe Silva, diretor de investimentos do Banco Carregosa.