Costumo dizer que um mal nunca vem só e no meu caso é bem verdade. Primeiro, não tive sorte com a minha herança genética e qualquer coisinha que coma acaba por me fazer engordar. Segundo, sou ‘vítima’ do fenómeno ioiô: mesmo sendo uma ‘pro’ em dietas e depois de passar dos 80 quilos para os 65, o meu corpo tende a voltar ao que era, ao mínimo descuido da minha parte. Terceiro, sinto desconforto por ter peso a mais – mesmo que seja pouco – e isso dificulta-me a maneira de estar com os rapazes.
Sou uma pessoa jovem a caminho dos 30 anos e começo a ficar seriamente preocupada. Se é assim agora, como será depois? Ficarei gorda e sem namorar? Vou continuar sozinha e triste, como quando era miúda, a sentir-me culpada por ter fome em horas indevidas e levar reprimendas de todos?
Cara leitora,
A obesidade tem causas diversas, das genéticas às emocionais, passando pelas que se prendem com certo tipo de doenças metabólicas e as associadas a efeitos secundários de cerros fármacos. Desconheço o tipo de alimentação que pratica, e se foi a alguma consulta de medicina interna ou de nutrição. Toda a gordura em excesso é uma forma de inflamação e há situações em que bastam pequenos ajustes nas rotinas alimentares para esse problema ficar sanado (com base nas pistas das análises e testes de saúde).
As dietas sem acompanhamento clínico especializado podem constituir um problema sério. E porquê? O corpo é a morada onde vai viver toda a sua vida. Se o privar de nutrientes, o seu organismo tende a absorver tudo o que lhe der – mesmo sendo pouco – como o camelo do deserto, que acumula reservas para tempos de escassez. Ou assimila em excesso ou reage em função da inflamação resultante da carência a que foi sujeito (de nutrientes). Daí o efeito ioiô e a sensação de ficar aprisionada ao “pára-retoma” dos regimes alimentares.
Tendo em conta este padrão de comportamento, que parece não ser de agora, importa questionar as eventuais razões que podem estar por trás da necessidade de controlar o que come (ou o que sente), como se tivesse de estar sempre vigilante, seja face ao alimento, seja em relação aos outros (que procura manter à distância, mesmo que não seja um ato consciente, para não correr o risco de ficar deles “dependente”, ou à mercê).
Os sentimentos de culpa e de tristeza que refere, associados à eventual crença limitadora de “não merecer” (alimento, amor, etc), merecem ser analisados. Talvez esteja na hora de, enquanto jovem adulta, aceitar que está na hora de tirar do armário os fantasmas maléficos que parecem castigá-la sem tréguas: “Um mal nunca vem só”… e um bem? Como seria? Uma consulta de psicologia (aconselhamento) pode ser muito útil para identificar em que ponto se encontra e o que é preciso equacionar em conjunto, de forma confidencial e num ambiente seguro.
Mais do que a forma do seu corpo, são os sentimentos que o habitam que parecem pesar-lhe, e bem, na maneira de se conduzir na vida: de forma condicionada e, por isso, com pouca margem de liberdade para ousar e atrever-se a sentir (por exemplo, vulnerabilidade e necessidades emocionais que teme mostrar ou não aceita em si), sem a tentação de reter, deitar fora ou ficar de fora…
Clara Soares, jornalista, psicóloga e autora do blog Psicologia Clara