Vivo com o meu namorado há dois anos e acredito no amor para a vida. Pelo menos enquanto dura. Ele é o homem com quem quero estar e ter filhos.
Ultimamente, penso duas vezes antes de expressar o meu ponto de vista, porque se for diferente ou oposto ao dele, salta-lhe a tampa! Ou seja, ele ferve em pouca água e reage como se eu estivesse a deitar fora tudo o que construímos… Se eu lhe demonstrar o quanto estou do lado dele, a coisa passa.
Quem o conhece há mais tempo diz que foi sempre assim, só que eu não dei por isso por estar apaixonada. Dizem que a paixão dura pouco e ignorar incompatibilidades não é bom. O nosso projeto de vida está em risco?
Cara leitora,
A incompatibilidade de feitios parece ser uma falsa questão. É na complementaridade, na capacidade de transformar-se pela aceitação /reconhecimento das diferenças, que vocês, enquanto casal, podem evoluir.
A constatação do seu papel no relacionamento, “calmante” e apaziguador, é que parece perturbá-la, levá-la a questionar se será capaz de “aguentar” o barco, em tempos de tempestade. Esta questão não é de resposta simples. A intimidade entre adultos assenta na partilha, na reciprocidade, e nem sempre pressupõe que cada uma das partes exerça uma função específica.
Se cada um dos parceiros teve essa função na sua família de origem e continua a desempenhá-la com algum sucesso (no sentido em que traz satisfação ou gratificação pessoal), a dinâmica de funcionamento “transportada” para a relação conjugal pode continuar a dar frutos, desde que seja vivida como algo natural e não incapacitante, do ponto de vista da liberdade individual.
É provável que o seu companheiro procure em si uma espécie de âncora ou suporte emocional que, eventualmente, não sentiu que teve até agora. Ou seja, um desacordo seu pode representar para ele um sinal vermelho, uma ameaça à necessidade de proximidade e aceitação. A tendência a procurar sinais seus, que o certifiquem do seu amor por ele – de que tudo está bem e não prestes a ruir – é a forma de minimizar a ansiedade e voltar ao modo “chill out”.
Se ama o seu companheiro e lhe valoriza as qualidades, sem excluir do “pacote” das vulnerabilidades que o tornam na pessoa que é, tudo parece encaminhar-se para que sejam felizes, enquanto o amor durar. Importa que ele existe, independentemente dos estados de paixão, que vão e vêm. E sim, expresse o seu ponto de vista, lembrando-o, se for caso, de que não é para pô-lo em cheque, a título pessoal.
E já agora, porque não darem mais atenção às vossas expressões faciais, elegendo uma delas como “senha” de aviso para “alarmes de incêndio” da relação? Assim, podem poupar-se à continua encenação da sequencia “socorro”/”falso alarme”…
Clara Soares, jornalista, psicóloga e autora do blog Psicologia Clara