Parece estranho, mas sempre tive dificuldade em dormir acompanhado. Passa-se com a minha actual namorada e já acontecia com a ex mulher.
Apesar de gostar muito de estar próximo da pessoa que amo na hora de cada um partir para o sono, não cosnigo evitar ter noites mal dormidas e já cheguei a ir para o sofá da sala a meio da noite.
Sei que é um sinal de profunda intimidade partilhar esse período nocturno, em que estamos mais vulneráveis e sem quaisquer máscaras, mas não consigo evitar o transtorno que isso me causa, também. Acordo várias vezes com os movimentos dela – por vezes sonha alto – e dificilmente volto a adormecer.
Sei de pessoas que dormem em camas separadas, mas ela não vê isso com bons olhos e pensa até que já não a desejo. Não é verdade, mas fico a pensar: passa-se algo de errado comigo?
A questão que coloca dá aso a uma série de brincadeiras e raramente é levada a sério. Porém, estudos com casais em que um deles tem apneia ou ressona, sugerem que o problema está no ajustamento daquele que não consegue adaptar-se a isso. As razões podem ser várias e, entre elas, os perfis de personalidade (mais sensíveis à presença e gestos do outro, ainda que esteja a dormir, ou estados de hipervigilância, que acontecem ainda em períodos de stresse), rituais de adormecimento “exigentes” e padrões de sono (há quem o tenha mais leve desde a mais tenra idade, por razões biológicas ou outras).
Do mesmo modo que existem dispositivos e tratamentos para quem ressona ou tem outros problemas de sono que interferem no seu estado de saúde – mas também perturbam o parceiro de cama – as soluções terapêuticas para quem se sente afectado passam por treino de relaxamento, dessensibilização ou reprocessamento das respostas automáticas de irritabilidade (e consequente incapacidade de voltar ao sono reparador, pela interrupção causada), geralmente pela via da hipnose ou exercícios de visualização (com sugestões auto-induzidas de sensações agradáveis, como associar a interrupção a uma cena de um filme, a que se segue outra, mais agradável, ou uma viagem em que se navega à bolina, etc).
Para quem tudo isto falha, e admitindo que a melhor solução nem sempre passa pelo comprimido para acalmar, há sempre o plano B. Faz sentido, então, clarificar que não se trata de falta de amor, antes de um teste à capacidade de aceitação das diferenças de cada um, sem ter que resolver o problema à custa da cedência de um dos dois. Não tem de ser um constrangimento ou sinal de falta de amor optarem por dormir em camas separadas. Muitos casais o fazem, incluindo alguns célebres. De resto, há médicos que partilham da ideia, fundamentada em pesquisas em laboratórios do sono, de que dividir a cama favorece os microdespertares (que interrompem a fase REM – rapid eye movement). Ou seja, sendo bom para umas coisas, poderá não o ser para outras, como um sono tranquilo.
Isto para já não falar nas rotinas de cada um (a velha questão da luz acesa, da televisão ligada, dos sonhos em “alta voz”, do cão, dos filhos pequenos, ou da hora a quem cada um se deita e acorda).
Neste caso, não é de intimidade que se trata (ou falta dela, embora nalguns casos também possa sê-lo!), mas de qualidade de vida, no plano individual. Se tiver um quarto extra, fale disso de forma franca e empática, evirando acusações ou queixumes. Se não, pondere terem lençóis ou edredões separados, compre uns tampões para os ouvidos e proceda a pequenos ajustes que ambos possam fazer numa primeira fase. Dias em que se sinta mais cansado ou vulnerável pode negociar uma noite no sofá e, quem sabe, fazerem disso um ritual vosso, para variar e explorar, com o tempo.