Perante aquele que foi o primeiro frente a frente entre Luís Montenegro e Mariana Mortágua, desde que são líderes partidários, um português com problemas graves não poderia seguir o conselho que tanta vez lhe é dado: ouça uma segunda opinião. É que neste embate, transmitido esta noite, na TVI, enquanto que o líder do PSD conseguiu apontar as suas ideias para o País e atacar a herança que os governos de António Costa deixam, a coordenadora do BE optou pela estratégia de condenar as propostas do social-democrata (o que não deixou de ser insólito, tendo em conta que, ao contrário do Bloco, não se conhece o programa eleitoral da coligação de direita AD, a um mês das legislativas) e viu-se obrigada a distanciar-se dos tempos da Gerigonça.
Mariana Mortágua entrou, neste segundo dia de debates, apostada em desmontar as fórmulas que o PSD, CDS e PPM já revelaram (em parte) para os setores da saúde e habitação, mas também sobre os impostos sobre as famílias e empresas. Segundo a bloquista, o “PSD quer entregar a saúde a quem quer burlar a saúde” e conta com “uma política de especulação e a selva no arrendamento”, entre outras acusações que fez a Montenegro.
Só que o líder laranja pareceu ter resgatado o tom de quando era líder parlamentar e não só conseguiu explicar as qualidades das suas medidas-bandeira, como desferiu violentos ataques a Mortágua, que a obrigaram a responder com o mesmo nível de provocação. Aliás, a bloquista deu por si a ter de travar ataques aos anos em que o Bloco apoiou parlamentarmente o Governo PS: “Pode acusar-me do que quiser, mas não pode acusar o BE de não ter defendido o SNS.” E para quem começou a programa a dizer “tenho um programa, coisa que a AD não tem”, Mortágua, não aprofundou o que propõe para o País nos setores que estavam em discussão, ainda que tenha conseguido desmontar algumas medidas de Montenegro – como a descida do IRC, que, segundo a bloquista, tendo em conta o tecido empresarial, disse que só iria beneficiar a banca e as petrolíferas.
No final, ficou claro que, mais do que as enormes clivagens entre as duas forças políticas, Montenegro – que até foi acusado de “copiar o programa extremista da Iniciativa Liberal” – vinha mais bem preparado para este debate do que Mortágua, que, tendo sido apelidada de “candidata a ministra de Saúde de Pedro Nuno Santos”, se mostrou incapaz de disfarçar o incomodo dos ataques do opositor.
Indumentária
Um e outro mantiveram o seu habitual look. Mariana Mortágua apresentou-se de blazer preto, polo cor de mostarda, calças de ganga pretas e sapatilhas All Star. Já Luís Montenegro foi fiel à indumentária que o caracteriza – fato azul escuro, camisa branca e gravata azul royal.
Ideia forte
Mariana Mortágua: Teto ao valor das rendas, baixar taxas de juros à habitação e colocar a CGD a baixar o seu spread, permitindo “poupança de 1 600 euros” anuais no crédito das famílias.
Montenegro: Acabar com as listas de espera no SNS em apenas dois anos e um programa de emergência nos primeiros 60 dias de governação, para responder a problemas no setor da saúde.
Momento
Com um exemplo muito pessoal, Mortágua lembrou os efeitos da que ficou conhecida como “lei Cristas”, que mexeu nas rendas congeladas, durante a gestão PSD/CDS, de Passos Coelho: “Eu vi o sobressalto da minha avó ao receber cartas do senhorio. O PSD esvaziou as cidades”.
Números em confronto
Montenegro disse que proposta do BE para exclusividade de médicos no SNS custaria mais de 500 milhões de euros anuais. Mortágua já tinha contraposto que proposta da AD sobre “vale de cirurgia” surge nos mesmos moldes de voucher cirúrgico, que já existe há 10 anos, e que é rejeitado por 88% dos doentes a quem é oferecido.
Frases
“Não há coisa mais extremista e radical do que uma renda de 1.500 euros para um T1 em Lisboa”, Mariana Mortágua.
“Mariana Mortágua e o Bloco estão obcecados com o Estado. Não se preocupem com o Estado; preocupem-se com as pessoas”, Luís Montenegro.