A alteração ao decreto Decreto-lei 186/2007, que o ministro das Infraestruturas já disse querer alterar para contornar o bloqueio da Câmara Municipal da Moita à solução Portela+1, merece um rotundo silêncio da Associação Nacional de Municípios. O organismo “só se pronunciará sobre esta matéria perante um decreto lei concreto”, garante à VISÃO o presidente, Manuel Machado (PS), autarca da Câmara Municipal de Coimbra. O presidente da Câmara da Moita ataca o “condicionamento” promovido pelo Governo e admite que preferia contar com a posição da ANMP num tema com amplas consequências para o poder local.
Pedro Nuno Santos, ministro das Infraestruturas e da Habitação, vai esta quarta-feira ao Parlamento para um debate de atualidade agendado pelo Partido Ecologista Os Verdes a propósito da intenção de alterar a lei, manifestada na Comissão de Economia. O diploma em causa, aprovado no Governo de José Sócrates, estabelece as condições para a construção, certificação e exploração de infraestruturas aeroportuárias em Portugal. E, no conjunto dessas regras, exige um “parecer favorável de todas as câmaras municipais dos concelhos potencialmente afetados, quer por superfícies de desobstrução quer por razões ambientais”. Ou seja, alterar a lei tem implicações que vão muito além do futuro do aeroporto de Lisboa.
Ainda assim, a Associação Nacional de Municípios Portugueses (ANMP) remete-se ao silêncio. À VISÃO, o presidente da entidade, e autarca de Coimbra eleito pelo PS, diz que a associação “só se pronunciará sobre esta matéria [quando estiver] perante um decreto lei”, ou seja, só quando o Governo tiver definido as linhas da nova legislação haverá uma palavra do representante dos municípios sobre o assunto.
Questionado sobre se manteve alguma conversa com o ministro Pedro Nuno Santos sobre o assunto, Machado é parco nas palavras. “Não é assim que funcionamos”, diz. O autarca reconhece, no entanto, que esta é uma “matéria muito importante e muito sensível e que tem regras próprias de procedimento”.
MOITA CONDENA “PRESSÃO” E “CONDICIONAMENTO”
A Câmara da Moita, já se sabe, tem-se mostrado abertamente contra os trabalhos de transformação da base da Força Aérea em aeroporto civil. Para já, os planos passam por deixar a discussão “no terreno do debate político”. Mas Rui Garcia (PCP) não exclui a hipótese de ponderar outras formas de manifestação.
“O que se está a passar aqui”, diz o autarca, “é uma movimentação e uma pressão muito fortes do Governo sobre o partido que o apoia para fazer vencer esta opção e ultrapassar quaisquer obstáculos para que [o aeroporto do Montijo] se concretize”. Posições como a da ANMP “devem ser entendidas neste contexto”, defende o presidente da Câmara Municipal da Moita, em declarações à VISÃO. “A ANMP não quer entrar em choque” com o Governo, interpreta o autarca.
Rui Garcia diz que ainda não falou sobre Manuel Machado sobre o braço de ferro que a Moita mantém há meses com o Governo. “Não houve iniciativa” de qualquer das partes para que isso acontecesse, mas a ausência de diálogo, defende, não impedia a ANMP de se pronunciar antecipadamente sobre um tema que terá consequências para todos os municípios, caso o Executivo consiga levar avante a sua intenção. “seria mais adequado, mais razoável, que desde o momento em que a alteração à lei foi equacionada, que quem representa os municípios tomasse uma posição sobre este tema”, defende o autarca da Moita.
“O Governo não vai ter um caminho fácil nesta matéria”, avisa Rui Garcia. Apesar de poder alterar a lei em sede de Conselho de Ministros, depois, o mais provável é que os partidos na Assembleia da República suscitem a apreciação parlamentar do diploma. E é aí que as contas se complicam. O PSD mantém-se em silêncio sobre que posição tomará, caso venha a ser confrontado com a necessidade de votar a nova versão da lei – já expurgada da possibilidades de os municípios de oporem a construções aeroportuárias.
De qualquer modo, diz o autarca da Moita, o sinal está dado: “É uma mensagem muito negativa que o Governo transmite aos portugueses e aos municípios, é reprovável que se altere as leis à medida, no sentido de se desconsiderar os municípios”, defende Rui Garcia, lembrando que esta polémica acontece no mesmo momento em que o Executivo tem em curso um programa de descentralização de competências para os órgãos de poder local sob o lema da “proximidade” com as populações. “Na primeira curva, pretende alterar a lei para silenciar” vozes contra.
O palco é dos políticos. Pelo menos para já. Apesar de não equacionar quaisquer formas de protesto nas ruas, Rui Garcia não exclui a possibilidade de promover “quaisquer outras ações” que garantam que o Montijo não serve de plataforma complementar ao Aeroporto Humberto Delgado. “Tudo depende do caminho” que o processo seguir, limita-se a dizer.