Depois de um debate longo, que durou mais de três horas, o desfecho esperado: a moção de censura ao Governo apresentada pelo CDS-PP foi chumbada. O diploma dos centristas contou com o voto favorável do PSD mas não obteve os votos necessários para fazer cair o Executivo de António Costa. Apesar de Bloco de Esquerda, PCP, PEV e PAN terem votado contra a moção de censura, todos os partidos apontaram falhas à atual governação socialista.
Na intervenção inicial, Assunção Cristas disse que esta moção serve para dar voz “à censura popular”, depois dos trágicos incêndios que vitimaram 110 pessoas entre junho e outubro. A líder dos centristas responsabilizou o Governo e o seu chefe, António Costa, por diversas falhas que não permitiram que as consequências fossem reduzidas. “Quando o país precisava de um estadista, constatou que tinha apenas um político habilidoso“, disse arrancando fortes aplausos da bancada centrista. A ex-ministra foi muito crítica para com a atuação do Governo ao longo dos últimos quatro meses, relembrando que o relatório da Comissão Técnica Independente sobre o incêndio de Pedrógão Grande aponta falhas de “coordenação” ao Governo. O CDS-PP “não vai deixar passar em branco esta vergonha nacional”, concluiu.
Durante toda a intervenção de Cristas, o primeiro-ministro não esboçou qualquer reação e aguardou pelo momento em que teve a palavra para responder à líder centrista. “Estamos aqui porque o sofrimento das vítimas e dos seus familiares e o sentimento de insegurança dos portugueses exigem uma resposta”, começou por dizer António Costa. Mas essa resposta, explicou, “não pode ser um mero ritual de expiação institucional.” No entender do primeiro-ministro, “nada pode ficar como antes” e, por isso, a resposta necessária deve traduzir-se num “compromisso firme” para que se faça uma reforma estrutural que olhe “para o médio e para o longo prazo.”
Uma reforma para cuja discussão o PSD já se mostrou disponível, como lembrou Hugo Soares. Mas esse foi o único momento em que o novo líder da bancada parlamentar laranja se aproximou do Governo. Numa intervenção em que acusou o Governo de “incompetência, insensibilidade e soberba” por inúmeras vezes, Hugo Soares defendeu que o anterior governo não pode apenas ser lembrado nas horas difíceis: “nós não temos nada que ver com o sucesso económico do país (…) mas já podemos ser os responsáveis pela tragédia dos incêndios.”
Avisos da esquerda
Os partidos de esquerda e o PAN votaram contra a moção de censura do CDS mas não por isso deixaram de avisar o Governo e admitir que houve falhas da atual governação. Catarina Martins, líder do Bloco de Esquerda, considerou a moção de censura “obscena” mas reconheceu que o “Governo devia ter estado melhor preparado”; o PCP lamentou que o CDS avançasse com esta iniciativa e, pela voz de António Filipe, pediu garantias ao Governo de que a resposta às tragédia não se iria refletir no corte de medidas já acordadas no Orçamento do Estado para 2018; o PEV, através da deputada Heloísa Apolónia, anunciou que o partido não desresponsabiliza “o Governo” mas recusou estar ao lado da “absolvição que o CDS quer fazer” das suas próprias responsabilidades; André Silva, do PAN, apresentou os mesmos argumentos que o PEV para rejeitar a moção e deixou pediu que o Governo esclarecesse qual a atuação que iria assumir em duas frentes: “o despovoamento” e a escolha “da floresta que queremos.”
A todas estas preocupações António Costa respondeu ora lembrando os compromissos já assumidos ora recorrendo às medidas anunciadas este fim-de-semana depois do Conselho Ministros extraordinário dedicado à análise do relatório da Comissão Técnica Independente. O primeiro-ministro garantiu ainda que “nenhuma medida do OE será sacrificada” para reforçar combate aos incêndios.
Ao fim de mais de três horas de debate e apesar de alguns avisos vindos da esquerda o Governo não foi derrubado. Uma atitude que, na ótica de Marcelo Rebelo de Sousa, reforça a confiança que o parlamento deposita no atual Executivo.