Há beleza, elegância, graciosidade… Mas também esforço físico, muitas horas de treino, cansaço. Assim são os bastidores d’O Lago dos Cisnes, uma produção da Companhia Nacional de Bailado, acompanhada pela Orquestra Metropolitana de Lisboa, com cinematografia de Edgar Pêra e figurinos de José António Tenente. Para ver, no Teatro Camões, Lisboa, até 3 de março
Sumidos na penumbra do auditório do Teatro Camões, em Lisboa, os espectadores nem imaginam o rebuliço provocado pelas 18 bailarinas que se transformam em cisnes para o segundo ato. Despe, veste, ajeita, retoca. A agitação dá lugar a uma desarmante serenidade, assim que pisam o palco. A entrada em cena é triunfal, tal e qual como a imaginava Fernando Duarte, 33 anos, responsável pela coreografia, a partir da original, de Marius Petipa e Lev Ivanov.
A primeira vez que viu a revoada de 18 cisnes entrar em palco, no mesmo passo, tinha 10 anos, contavam-se semanas desde que começara a dançar. “Fiquei abismado”, recorda, com o olhar perdido no passado. Agora, a posição é quase inversa. O Lago dos Cisnes representa a sua estreia, enquanto coreógrafo, numa grande produção. A primeira desde que abandonou a carreira de bailarino. O convite “irrecusável” da Companhia Nacional de Bailado (CNB) não o fez tremer, apesar da mítica nuvem negra que ensombrou a estreia deste bailado, em 1877, no Teatro Bolshoi, em Moscovo. “Não dançável” foi uma das apreciações ouvidas à época.
A coreografia do primeiro Lago dos Cisnes da CNB, estreado em 1986, esteve a cargo de um dos seus fundadores, Armando Jorge, e os cenários eram da autoria de Cruzeiro Seixas. Desta vez, são as imagens do realizador Edgar Pêra, 52 anos, que emolduram a narrativa, deixando o palco despido de artifícios. O vilão da história, o barão Rothbart, tornou-se um inimigo virtual, agigantado pela tela e omnipresente através dela. O príncipe Siegfried e a sua amada Odete, vítima do feitiço que a transforma em cisne, são joguetes nas suas mãos. Tal como os homens nas mãos no destino, dirão alguns. Tal como os homens perante forças que não podem controlar.
O realizador recuou ao velho cinema, projetado em feiras, como mais uma atração exótica: “Mais do que uma história, as pessoas iam ver fenómenos.” Cresceu a ouvir Tchaikovsky, um dos compositores favoritos da mãe, mas não pensou que estivesse preparado para trabalhar com uma música “assim”. “Ouvi-a, muitas horas, mas nunca me cansei”, revela, sorridente. Afinal, talvez seja esse o segredo dos clássicos: a eterna juventude.