Geoscope – Observatório Astronómico de Fajão: Ver as estrelas numa Aldeia do Xisto

Geoscope – Observatório Astronómico de Fajão: Ver as estrelas numa Aldeia do Xisto

A pequena Alice, três meses de vida, a mais nova dos 59 habitantes de Fajão, dificilmente se recordará do dia em que a sua terra se tornou o centro do astroturismo das 27 Aldeias do Xisto. Indiferente ao movimento atípico no dia 27 de junho, na inauguração do Geoscope – Observatório Astronómico de Fajão, a bebé segue tranquila num carrinho guiado pelos pais através do empedrado da aldeia onde, apesar da interioridade deste lugar encaixado na serra do Açor, Beatriz Simão e Jorge Fernandes, 28 e 32 anos respetivamente, decidiram viver. “Aqui, a vida saboreia-se mais devagar. Aproveita-se melhor o tempo”, justifica o pai de Alice, que trabalha nas Minas da Panasqueira, a uns bons quilómetros daqui, já no concelho do Fundão. Jorge confessa ter experimentado viver em Coimbra durante o tempo da universidade, mas decidiu trocar “a confusão da cidade” pelos penedos de quartzito e a proximidade com o rio Ceira. E não foi o único, haveremos de perceber adiante. 

Do novo observatório podem ver-se as estrelas e a Via Láctea. Foto: Bernardo Conde / ADXTUR

Mas o que tem, afinal, esta aldeia situada a 15 quilómetros (20 minutos de carro) de Pampilhosa da Serra, onde, a partir de agora, se promete ficar mais perto das estrelas? “Como este é um lugar escuro, conseguimos observar um céu que não é acessível na cidade”, garante José Augusto Matos, coordenador científico deste projeto que pretende colocar Fajão no centro do destino turístico Starlight Aldeias do Xisto, certificação atribuída em 2019 pela Fundação Starlight. Em noites de céu limpo, diz o astrónomo, daquele ponto de observação da aldeia, onde foi instalada uma dome (cúpula) semiesférica, consegue-se observar a Via Láctea em campo aberto. “A Lua e os planetas também se veem na cidade, mas se quisermos explorar todo o céu noturno e as suas constelações, daqui conseguiremos ver muito bem”, afiança. 

“Este céu sempre cá esteve”  

Fajão não foi escolhida ao acaso para ser um ponto estratégico no astroturismo. Assim que se entra na aldeia, em pleno dia, só a tal dome semiesférica, erguida lá no alto – feita em aço, com 7,5 metros de altura e 15 metros de diâmetro, concebida pelo designer João Nunes e o ateliê portuense Nunes e Pã –, denuncia o novo Observatório Astronómico. Desde 2011 que esta região do Pinhal Interior foi a escolhida para acolher o Pampilhosa da Serra Space Observatory (PASO), do qual faz parte a Estação Radioastronómica do Porto da Balsa, uma das principais infraestruturas do País dedicadas ao Espaço que fornece dados a mais de 177 entidades académicas.  

O astrónomo José Augusto Matos, coordenador científico do Geoscope de Fajão

Por se tratar de um território de baixa densidade, a somar à sua própria geografia, aqui consegue-se ter um céu escuro e limpo, sem poluição luminosa. “Este céu sempre cá esteve”, ironiza Jorge Custódio, presidente da autarquia de Pampilhosa da Serra, que, com a Agência para o Desenvolvimento Turístico das Aldeias do Xisto – ADXTUR, desenvolveu este projeto orçado em cerca de 180 mil euros. “Agora, queremos convidar as pessoas que andam na cidade e estão sempre a olhar para o chão a virem à serra e a olharem para cima.” Sobretudo, durante a noite. O designer João Nunes reforça a ideia: “O importante é fazer com que olhem para o nosso lugar na Terra, sentir e perceber o Cosmo. Este sítio de observação astronómica é também um projeto regenerador da paisagem, da consciência planetária e da ecologia, um lugar de aprendizagem.” 

Para usufruir da visita guiada intitulada Viagem à Luz das Estrelas (€30, mínimo duas pessoas) é necessário inscrever-se previamente no site bookinxisto.com ou no quiosque/loja montado na aldeia, onde se poderão requisitar cadeiras, mantas, binóculos e material científico. Para este verão, estão previstas algumas atividades para aguçar a curiosidade do público: fotografia noturna com o astrofotógrafo Miguel Marques (10 e 11 ago, €80) e observação das Perseidas (agosto), mas o calendário deverá aumentar.  

Terra de chanfana e tigelada 

Por ora, ao longo do dia, Fajão move-se com a mesma pacatez que fez com que Carlos Moreira, 72 anos, trocasse Queluz pela aldeia que o viu nascer para gozar a reforma: “Aqui, o maior problema é quando falha a internet [risos]. De resto, é um descanso.” Os dias dos fajanenses são passados entre jogos de cartas ou de dominó no café Juiz de Fajão, mergulhos na piscina sobranceira à aldeia ou na praia fluvial da barragem de Santa Luzia, onde, além da belíssima paisagem, se pode praticar canoagem e andar em bicicletas todo-o-terreno por mais de 122 quilómetros de trilhos sinalizados.  

As ruelas da aldeia de Fajão

De volta à aldeia, retemperam-se energias à mesa d’O Pascoal que, desde 2010, é sinónimo de bem comer na região. Carlos e Lucília Simão, 57 e 55 anos respetivamente, são os anfitriões deste restaurante onde cabem 90 pessoas para saborear chanfana e cabrito assado no forno a lenha, trutas do rio Ceira ou a típica tigelada à sobremesa. Aqui, que ninguém nos ouve, prove um cálice de aguardente de mel. Dos favos da serra, pois.  

A expetativa de Carlos Simão é de que o Observatório Astronómico “traga mais gente à aldeia, especialmente durante a semana”, já que aos fins de semana costuma ter o restaurante bem composto, altura em que Fajão recebe mais visitantes, que se passeiam pelas suas ruas com casas revestidas a xisto e xilogravuras nas paredes com lendas de outrora – os Contos de Fajão, escritos pelo padre Monsenhor Nunes Pereira, que ali tem direito a um museu.  

Regresso ao passado 

O dia amanhece cinzento e chuvoso, após uma noite de inverno em pleno verão que nos impossibilitou de ter observado o céu e as estrelas a partir do novo Geoscope. Mas não esmorecemos e, após a pernoita nas Casas do Rio, na aldeia de Cavaleiros de Baixo, a poucos quilómetros de Fajão, seguimos viagem entre curvas e contracurvas rodeadas pelas encostas verdes da serra do Açor que encantaram Miguel Torga quando o médico-escritor esteve ao serviço da saúde em Arganil. “Com o protesto do corpo doente pelos safanões tormentosos da longa caminhada, vim aqui despedir-me do Portugal primevo. Já o fiz das outras imagens da sua configuração adulta. Faltava-me esta do ovo embrionário”, escreveu em 1991, pouco antes de morrer, num testemunho que se pode ler no Memorial a Miguel Torga antes de chegarmos a Piódão.  

Foz d’Égua, a poucos minutos de Piódão

A Aldeia Histórica, conhecida como aldeia-presépio, com as suas casas encavalitadas de xisto onde moram pouco mais de 40 pessoas, continua a ser o postal turístico da serra do Açor. Há dias, a recente requalificação da praça central e do posto de turismo valeu-lhe o prémio de arquitetura ibérica FAD, na categoria Cidade e Paisagem, apesar do queixume dos seus habitantes de que a obra lhes terá tirado o estacionamento.  

Maravilhados com a aldeia estão os norte-americanos Jim e Natacha, que aqui dormiram uma noite, depois de terem aterrado em Madrid, alugado um carro e passado dois dias no Porto. “Aqui, sentimos que voltámos atrás no tempo. Estamos a adorar a arquitetura das casas, estas pedras, a simpatia das pessoas”, contam-nos junto a uma levada, antes de meterem pés ao caminho até Foz d’Égua (outro postal turístico, com duas pontes e casas de xisto), num percurso circular inferior a três quilómetros que demorará cerca de 45 minutos. Para o casal, a passagem por Piódão, no concelho de Arganil, que viveu durante décadas da agricultura de subsistência, está a ser “as férias das férias” [risos]. 

Paulo Lopes criou a empresa de passeios de jipe, Piódão NaTour

Foi para “contar histórias e dar a conhecer esta aldeia e toda a serra do Açor”, onde nasceram os seus pais e avós, que Paulo Lopes, 29 anos, criou a empresa de passeios de jipe, Piódão NaTour. A ideia germinou durante o confinamento e desde 2021 que tem andado a mostrar as paisagens naturais desta região, vizinha da serra da Estrela. “Na altura da primavera, ando pelos cumes da montanha para observar a paisagem, no verão, pelas praias fluviais como Loriga e Foz d’Égua, Mata da Margaraça e Fraga da Pena, que tem a maior cascata da serra do Açor”, exemplifica, enquanto nos conduz numa subida aos 1242 metros de altitude do monte do Colcurinho. Se tivéssemos tido um dia de céu limpo avistaríamos, aponta, as serras da Estrela, Caramulo e até mesmo o oceano Atlântico, lá ao longe.  

Regressamos a Piódão, ao restaurante O Fontinha, onde a família de Paulo Lopes serve pratos regionais como o bucho recheado de Arganil, iguaria com direito a confraria gastronómica, ou a tigelada feita num grande caçoilo de barro, tal e qual como antigamente. 

Dina Brito, uma das responsáveis pelos licores e compotas Donanna, feitos com produtos da serra do Açor

De Piódão a Coja são apenas 27 quilómetros, mas a viagem demora cerca de 45 minutos. Dina Brito, 41 anos, espera-nos à porta do seu ateliê/loja de licores Donanna, criado pela mãe, Ana Maria, em 2006, a partir das receitas de licorosos que tinha aprendido com a avó.

Começou pelo medronho, o pequeno fruto que cresce em abundância em toda a serra do Açor, e hoje a marca já soma 14 referências, entre castanha, mel, figo, ginja e mirtilo, tudo de pequenos produtores desta região. Em 2018, lançaram um gin “para colocar os sabores da serra do Açor [zimbro, carqueja, medronho e castanha] numa garrafa”, conta Dina. E tem sido um sucesso. Entretanto, surgiram as compotas (18 referências) e a marmelada. Tudo feito de forma artesanal. “O segredo é ter amor, carinho e paciência”, diz-nos na cozinha. E tempo, acrescentaríamos, que, aqui, já nos havia dito o pai de Alice em Fajão, se aproveita melhor.

VER 

Geoscope– Observatório Astronómico de Fajão  R. César Vicente da Silva, Fajão > T. 275 037 393 > Quiosque: qua–qui 16h-22h, sex-sáb 16h-24h, dom 14h-18h > A partir €30 

Museu Monsenhor Nunes Pereira Fajão > T. 235 751 317 > grátis, sob marcação 

Epic Land – Turismo de Aventura R. Rangel de Lima, 23, Pampilhosa da Serra > T. 91 488 9928, 91 356 2661 > epicland.pt 

Piódão NaTour  Piódão > T. 91 880 2851 > Passeios de jipe a partir €45/pessoa (3h30) > piodaonatour@gmail.com 

COMER 

O Pascoal  Fajão > T. 235 751 219, 96 301 2659 > ter-dom 12h-14h30, 19h-21h30 

O Fontinha Piódão > T. 235 731 151 > seg-dom 10h-22h  

COMPRAR 

Licores Donanna  R. Francisco de Almeida Filipe, Coja > T. 235 729 429, 96 354 5045 > seg-sex 9h-17h  

DORMIR 

Casas do Rio  Cavaleiro de Baixo, Fajão > T. 235 751 270 > T1 e T2 a partir €55 

Story Studio Piódão R. Eugénio Correia, 4, Piódão > T.  92 688 5754 > a partir €215 

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