Em Porto Covo, onde antes funcionava a cafetaria de apoio ao parque de campismo da Costa do Vizir, está a nascer um projeto bastante ambicioso que deverá culminar na atribuição de uma Estrela Michelin. Esta é, pelo menos, a vontade do casal de donos, José Costa e Ivone Machado, que não para de investir para chegar a esse fim. Desde logo, a contratação do chefe Ricardo Leite, que trabalhava no Loco, em Lisboa, ao lado de Alexandre Silva, não foi alheia a essa intenção de passar a fazer parte incontornável da rota gastronómica nacional.
A seguir a uma volta pelo restaurante totalmente renovado, e com espaço para exposições e obras de artistas locais com base em desperdícios, vamos então almoçar neste que pode ser considerado o primeiro passo para a Estrela. Fica a nota de que, se gostar muito de uma peça da sala, pode sempre perguntar se está para venda – quase tudo dá para levar para casa.
A refeição começa bem, com um couvert em grande estilo (€6,50), composto por fatias de pão de fermentação lenta, amassado nesta cozinha, e por duas saborosas manteigas caseiras: de cabra fumada e de ovelha, com sementes de papoila.
Ficamos a saber, entretanto, que estiveram fechados durante nove meses, por causa da Covid-19, e que aproveitaram bem o tempo para afinar a carta. José Costa avisa, a esse propósito: “Houve um incremento qualitativo e técnico nesta nova ementa. Aqui cozinha-se com muito amor.” Percebe-se do que fala quando, logo para abrir, comemos um pedaço de cavala curada com maionese de miso, óleo de lúcia-lima, crocante negro de tapioca, feito com tinta de choco verdadeira, e pistácio, tudo ao lado de uma pequena taça com molho dashi avinagrado (€11). De seguida, a lógica mantém-se ao provarmos um pastel de massa tenra de leitão fumado, em cama de molho de pezinhos de coentrada (€12).
Os vinhos que acompanham o almoço não integram os grandes circuitos comerciais, pois são de pequenos produtores situados a um raio o mais curto possível. “Também estamos a desenvolver o nosso gin, com base numa erva que cresce junto ao mar, assim como uma marca própria de gelados”, vai revelando Ivone Machado.
A estrela da casa é um prato de bacalhau, claro, que demora vários dias a preparar. A posta de cura prolongada vem, então, para a mesa com leite de amêndoa caseiro, pil-pil, caviar, crocante de batata, ervas do mar e ar de aneto (€25). No capítulo das carnes, a que não nos dedicámos, há feijoada de leitão fumado, peças maturadas para grelhar, por exemplo, ou hambúrgueres de qualidade, e também duas ofertas vegetarianas (ravioli de beterraba ou couve-flor na brasa).
Na carta, existem cinco sobremesas, mas nós desviámo-nos para a mais fresca, pois o calor lá fora não parece ter amainado desde que aqui entrámos. Vamos lá provar um original creme de cardamomo verde e baunilha de São Tomé, granizado de pera e camomila, sorbet de pera fumada com bolacha miso (€8). Não saímos defraudados.

A Praia Grande, de Porto Covo, fica a uma simpática distância de uma caminhada de cinco minutos. É lá que o casal está prestes a abrir o Amar, num sítio privilegiado, com espaço para bar e restaurante e uma ementa que assentará em peixe fresco grelhado, supervisionada também pelo chefe Ricardo Leite. Com o Amar, a que foi dispensado todo um cuidado na decoração e na qualidade do que é servido, dá-se mais um passo na grande caminhada de pôr Porto Covo na rota gastronómica nacional. Como diz o livrinho vermelho, sempre que um restaurante ganha uma Estrela Michelin é porque se trata de uma “cozinha de grande nível”, em que “compensa parar”. Por nós, mesmo sem Estrela, já compensou a paragem.
Alma Nómada > Costa do Vizir Monte Branco, Porto Covo > T. 96 575 4882 > seg-dom 12h-15h 19h-23h
Outros chefes a sul
São vários os nomes firmados em cozinhas do mundo que trocaram a cidade pela beira-mar alentejana
1. Lamelas, Porto Covo
Esta é uma homenagem da chefe Ana Lamelas Moura à família materna e um elogio à cozinha alentejana que faz parte da sua infância. A chefe que passou pelo restaurante Arzak, no País Basco, em Espanha, pelo Eleven, pelo Cave 23 e pela Bacalhoaria Moderna, todos em Lisboa, prepara agora pratos recuperados do receituário popular da terra dos avós. Com vista para a baía de Porto Covo, provem-se o ensopado de borrego, o arroz cremoso de coelho, o salmonete com molho de fígados, a abrótea com amêijoas em molho verde ou o gaspacho com figos e peixe curado. R. Cândido da Silva, 55A, Porto Covo > T. 92 406 0426 > ter-dom 12h30-15h, 19h30-23h30
2. Assador Altinho, Odeceixe
Depois de ter, há três anos, deixado a asa de Vítor Sobral e aberto o Naperon, em nome próprio, nas Casas do Altinho, em Odeceixe, neste verão o chefe Hugo Nascimento surpreendeu com a inauguração de mais um restaurante, na mesma zona mas com uma oferta totalmente distinta. Neste assador, que funciona numa antiga tasca, comem-se essencialmente carnes maturadas, grelhadas em carvão ecológico. Também há algum peixe e vegetais, mas tudo têm o mesmo destino. R. 25 de Abril, 151B, Odeceixe > T. 91 952 0220 > seg-qua, sex-dom 12h-15h, 19h-23h
3. Statera, Vila Nova de Milfontes
Ana Leão já trabalhou em muitos restaurantes, em Portugal e em Espanha, passando pelas cozinhas de Martín Berasategui, em Tenerife, e pela Dos Palillos, em Barcelona, com uma Estrela Michelin. Ainda esteve no elBulli, de Ferran Adrià, nas vésperas de fechar. Nos últimos anos, explorou a Austrália de lés a lés. Agora, aterrou em Vila Nova de Milfontes, no hotel Selina, para mostrar as suas propostas com inspiração no Médio Oriente e na Ásia. R. dos Carris, 9, Vila Nova de Milfontes > T. 91 009 0998 > seg-dom 9h30-22h30