O estudo, publicado na revista Nature, sugere que uma molécula cerebral pode ser responsável pela associação de sentimentos positivos ou negativos às memórias.
A investigação, levada a cabo por investigadores do Salk Institute for Biological Studies e da Universidade de Harvard, pode ser a chave para uma melhor compreensão da razão pela qual algumas pessoas são mais propensas a reter emoções negativas do que emoções positivas, abrindo caminho a novos tratamentos para o transtorno de stress pós-traumático, ansiedade e vícios.
“Basicamente conseguimos controlar o processo biológico fundamental de como se pode recordar se algo é bom ou mau”, refere Kay Tye, autora do estudo, no comunicado publicado na Salk News. “Isto é algo fundamental para a nossa experiência de vida e a noção de que se pode resumir a uma única molécula é incrivelmente excitante”, acrescenta.
Para saber se devemos evitar procurar uma experiência que ficou no passado, o nosso cérebro deve associar um sentimento positivo ou negativo a esse estímulo. Esta capacidade é chamada de “atribuição de valência”.
Em 2016, Kay Tye treinou um grupo de ratos-domésticos para testar a atribuição de valência. A investigadora descobriu que alguns neurónios localizados na amígdala basolateral do cérebro (BLA) ajudaram nessa tarefa de atribuir valência na aprendizagem dos ratos.
Um dos conjuntos de neurónios foi ativado com uma valência positiva, para os animais aprenderem a associar um sinal a um sabor doce. O outro conjunto foi ativado com uma valência negativa e os animais aprenderam a associar um sinal diferente a um sabor amargo.
“Encontrámos estas duas vias – semelhante às vias-férreas – que estavam a conduzir a valências positivas e negativas, mas ainda não sabíamos que sinal estava a agir como interruptor para direcionar que via deveria ser utilizada em determinado momento”, refere Tye.
Desta vez, então, os investigadores concentraram-se na importância de um neurotransmissor de sinalização chamada neurotensina. Já sabiam que este neuropetptídeo é produzido pelas células associadas com o processo de atribuição de valência, mas como outros neurotransmissores também o são, usaram a técnica de edição genética CRISPR para remover o gene da neurotensina das células. Sem esta, os ratos-domésticos não conseguiam atribuir nenhuma valência positiva.
Curiosamente, a ausência de neurotensina não bloqueou a valência negativa, o que quer dizer que as descobertas sugerem que o estado padrão do cérebro é ter uma tendência para o medo, ou seja, os neurónios associados à valência negativa são ativados até à libertação da neurotensina, que liga os neurónios à valência emocional positiva.
“De uma perspetiva evolutiva, isto faz sentido porque ajuda as pessoas a evitar situações potencialmente perigosas – e provavelmente repercute-se nas pessoas que tendem a encontrar o pior numa situação”, explica a investigadora no estudo.
Outras experiências foram realizadas e a equipa de investigação constatou que os altos níveis da molécula de sinalização neurotensina promoveram a aprendizagem e suavizaram a valência negativa, concluindo que a é esta a molécula responsável pela valência positiva.
“Se conseguirmos manipular a neurotensina e tentar alterar este equilíbrio, poderemos ser capazes de ajudar as pessoas”, conclui Li, investigador envolvido no estudo.