
Amanhã, quinta-feira, 11, no penúltimo dia da COP26, vários países vão assinar um compromisso para que a energia nuclear não consiga aceder a subsídios associados à transição energética. O documento, que conta com subscritores como Portugal, Espanha, Alemanha, Áustria, Bélgica, Luxemburgo e Dinamarca, “inibe o nuclear de ser considerado um investimento sustentável”, disse hoje o ministro do Ambiente, em declarações aos jornalistas presentes na cimeira do clima, em Glasgow.
É garantido que o acordo vai deixar o governo francês furioso. França tem sido um aliado nas políticas de descarbonização, mas a maior parte da sua eletricidade é produzida em centrais nucleares, que considera sustentável por não emitir gases com efeito de estufa. Muitos cientistas também consideram que a transição energética rápida necessária só é possível com a ajuda da energia nuclear.
João Pedro Matos Fernandes, que lidera a delegação portuguesa nas negociações da COP26, acrescentou que será igualmente assinado um compromisso para obrigar os países signatários a deixarem de investir em projetos de combustíveis fósseis fora do seu território. A semana passada, foi conseguido um acordo semelhante, entre vários países, mas apenas para o carvão.
O ministro faz um balanço positivo da cimeira até agora, realçando os acordos sobre redução do metano, a eliminação do carvão (apesar da ausência dos EUA) e o fim da desflorestação até 2030. Quanto a estes últimos dias de negociações – historicamente os mais difíceis e conflituosos das cimeiras do clima –, mostra-se otimista. “Há boas condições para podermos encerrar todos os dossiês. Não existe nenhuma parte estática. Todas as Partes estão a mover-se. O artigo 6º [sobre o mercado de carbono, tema que tem sido apontado como o mais complexo] tem progressos significativos. É possível chegar a um acordo equilibrado durante estes três dias que faltam.”
O fim do carvão “não vai passar sem luta”
O ministro do Ambiente e da Ação Climática falou ainda das pontas soltas no tema do financiamento, garantindo que tudo se encaminha para que os países atinjam o consenso e sublinhando os 27 mil milhões de dólares que a União Europeia prometeu para o fundo de apoio aos países mais pobres. Mas frisou: “Insisto que metade vá para a adaptação. Os países a quem o dinheiro vai ser doado são países em desenvolvimento, onde a questão da redução de emissões não é a mais relevante. O mais relevante é a adaptação, para terem condições para sofrer menos com as condições das alterações climáticas, problema para o qual pouco contribuíram.”
Matos Fernandes comentou também o rascunho da decisão da COP26, tornado público esta manhã, destacando o facto de, pela primeira vez, ser referido o fim progressivo do carvão e dos subsídios aos combustíveis fósseis. Admite, contudo, que este ponto não está escrito na pedra e que vai contar com oposição cerrada. “Não vai passar sem luta, estou seguro disso, e não estou sequer seguro de que vai passar. Mas nunca tinha sequer aparecido num momento destes tal conjunto de objetivos. Tudo faremos para que tudo se mantenha. Vai dar discussão? Avanços e recuos? Não tenho dúvidas. A Arábia Saudita é a parte que menos se tem movimentado e não deixará de se pronunciar aqui.”
A rua não dá propostas concretas
João Pedro Matos Fernandes deixou para o fim um aviso aos movimentos de ativistas que têm estado na rua a exigir uma revolução que garanta um corte drástico e imediato das emissões. “É importante que a liderança não esteja na rua, mas sim dentro destas salas. Só com Estados democráticos e instituições fortes podemos assegurar a liderança, e só dessa forma vai haver justiça nesta transição.”
O ministro diz compreender “aqueles que querem que andemos mais depressa, nomeadamente os jovens”, acrescentando, porém, que não esses movimentos não propõem alternativas realistas. “Não lhes negamos a razão e não temos dúvidas de quão genuíno é o seu desejo, mas para podermos ter uma transição justa, este processo tem de ser liderado pelos governos, pelos Estados, para não se esboroar e criar injustiças.”
Estes movimentos, continua, Matos Fernandes, “são importantes para a consciencialização das pessoas para as alterações climáticas”. “Mas não me conformo com uma liderança que esteja na rua. Têm de ser as democracias liberais a construir um novo modelo que crie riqueza, bem-estar e empregos, mas que acabe ao mesmo tempo com os combustíveis fósseis. Não conheço nenhuma outra proposta com objetivos concretos e que garanta que todo o mundo se empenha e não deixa ninguém para trás.”