Apesar das evidências científicas do aumento das temperaturas extremas, com recordes a sucederem-se em catadupa, ainda há quem negue a realidade da crise climática, questionando a forma como as temperaturas estão a ser medidas para pôr a ciência em causa.
Para medir a temperatura do ar, os meteorologistas utilizam o abrigo de radiação meteorológico de Stevenson, uma caixa especialmente construída para proteger os instrumentos meteorológicos da precipitação e da radiação solar. Normalmente, está posicionada a uma altura entre 1,25 e 2 metros, de acordo com as regras da Organização Meteorológica Mundial (OMM), para minimizar os efeitos de aquecimento do solo e possui um termómetro de reserva para confirmar a precisão do instrumento principal.
Robin Monotti, arquiteto e produtor de cinema italiano, conhecido por ser um negacionista das alterações climáticas, fez alarde em julho ao acusar os meios de comunicação de divulgarem um relatório da Agência Espacial Europeia (ESA) que confundia a temperatura do ar com a temperatura do solo, que geralmente é mais elevada.
“A histeria começou quando os meios de comunicação sensacionalistas climáticos na Alemanha e noutros lugares, como o Relotius Spiegel [jornalista alemão], citaram acriticamente um relatório de 13 de julho formulado de forma descuidada e manipuladora pela ESA”, escreveu numa publicação no agora X, vista milhões de vezes.
Também o apresentador do GB News Neil Oliver alegou que as temperaturas do ar na Europa não eram tão altas quanto as declaradas pela BBC e os outros meios de comunicação, garantindo que as temperaturas não tinham chegado a valores superiores a 30 graus.
Mas a Reuters já o veio desmentir: “O apresentador Neil Oliver afirmou num segmento de 24 de julho ( aqui e aqui ) que as temperaturas do ar, registadas a mais de um metro acima do solo e medidas por meteorologistas de acordo com os padrões internacionais, não ultrapassaram os 30º C na onda de calor, que afetou a Grécia, Itália, Espanha e outros. Este sugeriu que os órgãos de comunicação, como a BBC, que relataram e previram temperaturas acima de 40 graus Celsius citaram desonestamente as temperaturas do solo, que geralmente são significativamente mais altas que as do ar, para ‘gerar medo’ e exagerar o clima quente”, lê-se no artigo da agência de notícias.
A agência considera que as afirmações de Oliver são “enganadoras”. “A temperatura do ar ultrapassou os 40º C em vários locais do sul da Europa em Julho. Os meteorologistas não mudaram a forma como preveem o tempo”, concluem.
A importância das cores
É verdade que alguns meios de comunicação partilharam os mapas da ESA com a temperatura do solo, em vez da temperatura do ar, mas não a BBC: os boletins meteorológicos mostrados referem-se às temperaturas do ar medidas por meteorologistas de acordo com os padrões internacionais.
Mas as reclamações não cessaram, incluindo com insinuações de que alguns instrumentos de medição não seguem as regras da OMM ou estão a funcionar mal.
Muitos dos críticos afirmam também que os mapas meteorológicos são alterados para criar o medo, nomeadamente as alterações das cores para torná-las mais alarmistas. Robin Monotti considera as alterações “psicopatas psicadélicas coloridas”.
O serviço meteorológico do Reino Unido (Met Office), por exemplo, afirma que mudou o esquema de cores dos seus mapas de temperatura nos últimos anos para facilitar a sua leitura pelos daltónicos.
Bob Ward, do Grantham Institute – Climate Change and Environment, um dos cinco institutos do College London, afirma que este negacionismo tem aumentado. “Esta forma de negação tornou-se muito visível durante a crise de calor do verão na Europa no início deste verão”, disse ao Guardian. “Esta forma é particularmente perniciosa porque engana as pessoas sobre os perigos claros que o calor extremo representa para as pessoas, diretamente e através do maior risco de incêndios florestais”.
“No dia 13 de julho, a Agência Espacial Europeia divulgou dados de satélite sobre as temperaturas da superfície terrestre na Europa. Estas foram um acréscimo às medições de temperatura padrão registadas pelas agências meteorológicas que são feitas dois metros acima da superfície terrestre”, reforça. “As temperaturas da superfície terrestre são normalmente muito mais altas do que as temperaturas do ar. Quando a Agência percebeu que se espalhava confusão sobre os dois conjuntos diferentes de medições, emitiu uma declaração esclarecedora em 18 de julho”.